22.7.21

Mais velhas, mais gordas e com mais partos-prematuros. Eis o possível retrato das grávidas em Portugal

Natália Faria, in Público on-line

Em 21.324 nascimentos, 31% foram com cesariana. Este e outros indicadores obstétricos estão disponíveis no recém-inaugurado portal do Consórcio Português de Dados Obstétricos, que reúne indicadores de 13 hospitais públicos e maternidades. A amostra representa apenas um quarto dos total de partos no país, mas a ideia é chegar aos 50%.
 
Hospital de São João é um dos parceiros do consórcio que decidiu reunir os indicadores obstétricos que permitem perceber melhor o que se passa nas salas de parto do país Manuel Roberto (arquivo)

No último ano, realizaram-se 1968 partos de mulheres fumadoras, num total de 13 hospitais e maternidades do sector público. Houve também 7444 partos induzidos e 30 no domicílio (cujas mães e bebés acabaram por ir parar a uma sala de partos), além de 15 bebés que não chegaram a tempo ao hospital e que acabaram por nascer no transporte. Estes são apenas alguns dos dados disponíveis no portal do recém-criado Consórcio Português de Dados Obstétricos (CPDO) que, a partir desta quinta-feira, disponibiliza ao público vários indicadores obstétricos, que incluem ainda, e em tempo quase real, informações sobre idade da mãe, peso das grávidas e recurso a episiotomias e a cesarianas, entre outros.

Por enquanto, os dados abrangem apenas 13 hospitais e públicos e maternidades que utilizam o programa de registos clínicos Obscare (do Hospital de São João, no Porto, ao Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, passando pelos centros hospitalares universitários de Lisboa Norte e Lisboa Central, onde se inclui a Maternidade Alfredo da Costa, entre outros). “A amostra corresponde actualmente a cerca de um quarto do total de partos”, precisa Diogo Ayres Campos, director do serviço de obstetrícia do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Mas o objectivo é chegar “dentro de muito pouco tempo” aos 50% do total de partos realizados nas maternidades e hospitais públicos do país.

Se quisermos tomar os indicadores disponibilizados como amostra do que se passa nas salas de partos do serviço público de saúde, conclui-se, por exemplo, que a taxa de cesarianas subiu no último ano para os 31% - acima, portanto dos 27% a 28% dos últimos anos. E que a indução do parto abrangeu 34% das gravidezes, sendo que dos 14.428 partos vaginais do último ano (correspondentes a uma taxa de 67%), 3859 foram auxiliados por ventosa.

Por outro lado, como acrescenta a directora do serviço de obstetrícia do Hospital de São João, Marina Moucho, as episiotomias (pequena incisão no períneo) não foram tantas quanto por vezes se aponta. “Fala-se muito na questão do recurso excessivo às episiotomias, a propósito da violência obstétrica, e os dados mostram, por exemplo, que no mês actual a taxa no total de partos vaginais anda na casa dos 34%”, enfatiza aquela responsável.

Os dados deste retrato a la minuta também permitem perceber que o Índice de Massa Corporal (IMC) médio das grávidas está fixado nos 25.33 desde o início do ano e que, nos últimos 12 meses, foram feitos 2921 partos em grávidas com um IMC superior a 30, isto é, obesas. “Consegue-se facilmente perceber que há um problema de obesidade entre as grávidas”, aponta Marina Mouch

Sendo verdade que o excesso de peso e a obesidade são um problema da população em geral, e não exclusivamente das grávidas, a ideia é que a sistematização destes dados possa ajudar os parceiros deste projecto (a Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal e a Direcção-Geral da Saúde), a desenvolverem e a adaptarem as suas “campanhas de prevenção, respondendo mais eficazmente aos problemas que se vão evidenciando”. No caso, apostando nas consultas de nutrição para grávidas e “alertando as mulheres para a necessidade de controlar o peso antes de engravidar, mas também durante a gravidez, de forma a evitar os problemas associados e que são a hipertensão e a diabetes, entre outros”, completa Marina Moucho.

Do mesmo modo, os 99 partos realizados desde o início do ano em grávidas com problemas de alcoolismo recente ou os 890 partos referentes a grávidas fumadoras, podem ajudar os hospitais a adaptar as suas respostas. “Até pode haver situações que sejam específicas de determinados hospitais e este registo pode ajudar as instituições a criarem, por exemplo, consultas de cessação tabágica para acompanhar especificamente as grávidas”, exemplifica a obstetra Maria José Alves, da Maternidade Alfredo da Costa, para quem estes indicadores, que resultam de um “acordo de cavalheiros" entre os hospitais envolvidos, podem igualmente orientar os profissionais “para a necessidade de explicar de forma mais recorrente que se vai sempre a tempo de deixar de fumar, mesmo que se tenha fumado no início da gravidez, e que os benefícios daqui resultantes são superiores à ansiedade que a cessação tabágica pode provocar”.

A tomar como amostra os 21.824 nascimentos registados no último ano nestes 13 hospitais, os dados mostram que em mais de metade dos casos (11.788) a amamentação foi promovida na primeira hora após o parto e que o contacto a pele a pele imediato entre a mãe e o recém-nascido foi feito em 12.544 dos casos.

Os dados apontam ainda para um aumento dos nascimentos pré-termo (1887, no último ano) e gemelares (827). Esta subida acompanha as tendências que já se conhecem: as mulheres engravidam mais tarde e recorrem mais a técnicas de procriação medicamente assistida. Aliás, desde o início do ano, houve 104 partos pós-fertilização in vitro e 24 pós-injecção intracitoplasmática. “Há cada vez mais mulheres a engravidarem depois dos 35 e depois dos 40 anos de idade”, confirma Maria José Alves. Os números do portal mostram que, nos últimos 12 meses, passaram por aqueles 13 hospitais 6426 grávidas com mais de 35 anos, 1419 grávidas acima dos 40 anos e 107 com mais de 45 anos.