Por João Ramos de Almeida, in Público on-line
Para que os contribuintes beneficiem do máximo de incentivo ao combate à evasão fiscal, com uma dedução em IRS de 250 euros, o agregado familiar terá de gastar, em 2013, mais de 26 mil euros em reparação automóvel, alojamento, em restauração e cabeleireiros, algo como 2228 euros por mês. E a dedução só será sentida no reembolso de IRS enviado em 2014.
A criação do incentivo estava prevista no OE de 2012 (pedido de autorização legislativa) e foi ontem anunciada no âmbito das medidas para combater a economia informal.
Os contribuintes poderão, a partir de 1 de Janeiro de 2013, deduzir à colecta de IRS 5% do IVA suportado (23%) na aquisição dos serviços até um limite de 250 euros de dedução - ou seja, ter-se-á de efectuar uma despesa anual de 26.738 euros.
Face à dificuldade que a generalidade dos contribuintes sentirá em chegar aos 250 euros, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, admitiu ao PÚBLICO que tanto a taxa de 5% como o limite de 250 euros poderão ser ajustados, à medida que for sendo avaliada a sua eficácia. Tal como a administração fiscal espera, o contribuinte poderá segui-la a partir de 2013, através da Internet (ver caixa).
Inicialmente, e além do limite de 250 euros, o Governo previra um limite de dedução de 10 euros por cada compra. Para o conseguir, o contribuinte teria de realizar 25 aquisições de serviços, gastando, em cada uma delas, pelo menos 1069,56 euros. Mas esse limite, segundo explicou Paulo Núncio ao PÚBLICO, foi para tornar mais fácil ao contribuinte atingir o limite máximo de dedução. Mas ainda assim vão ser poucos contribuintes a beneficiar.
Pelas estatísticas de IRS de 2010, a despesa exigida é muito superior ao próprio rendimento médio dos contribuintes, de 16 mil euros anuais.
De acordo com o Inquérito às Despesas das Famílias 2010/11, recentemente divulgado pelo INE, a despesa média das famílias situou-se em 20 mil euros. Nas compras em cafés e restauração, o nível reduz-se para 2111 euros. Mesmo as famílias com um rendimento mais elevado - superior a 37.800 euros anuais - tinham uma despesa em hotelaria e restauração de apenas de 5169 euros.
Haveria outro aspecto que poderia fazer pôr em causa a eficácia do incentivo: o fim imposto pela troika às deduções dos dois escalões de maior rendimento. Mas o secretário de Estado garante que esta dedução está fora desses limites impostos.
Construção fica de fora
De fora do incentivo estão os serviços prestados pelo sector da construção civil, apontado como um cancro da evasão fiscal. Paulo Núncio explicou que se deveu ao facto de ser "uma medida inovadora" e que será aplicada à generalidade das actividades "de forma gradual". Uma fonte oficial adiantou que a principal dificuldade é prática: criar um incentivo de 5% sobre o IVA de serviços sem preços tabelados é ineficaz, porque é inferior ao "incentivo" que é não aplicar a taxa de 23% de IVA.
A ideia de criar um incentivo como este não é, porém, nova. Na década de 1990, falou-se dessa possibilidade. O Governo Durão Barroso anunciou-a. Na altura, deduzia-se ao IRS até 50 euros, relativos a 25% do IVA suportado. Em vão. Quase dez anos depois, volta-se à carga.
O incentivo foi anunciado no âmbito de um conjunto de medidas de combate à economia informal que, segundo Paulo Núncio, deverá tornar-se visível a partir de 1 de Janeiro de 2013. Passa pela obrigatoriedade da facturação na generalidade das actividades (independentemente de ser pedido pelo contribuinte) e pelo envio electrónico dos elementos das facturas pelas empresas à administração fiscal. Algo que se espera simplifique declarações das empresas e torne possível o pré-preenchimento pelo fisco das declarações de IVA, o fim dos anexos recapitulativos dos seus clientes. Tudo com a promessa de acelerar os reembolsos de IVA.
O Governo garante que no quarto trimestre de 2012 estarão operacionais os programas informáticos para as medidas anunciadas. Paulo Núncio espera que a informação recolhida dê um retrato mais completo das transacções realizadas na economia e que gerarão centenas de milhões de euros em IVA, até agora não entregue ao Estado.