Por Andrea Cunha Freitas, in Público on-line
Desde 2007 que não havia tão poucos beneficiários a receber esta prestação. A explicação está nas novas regras em vigor desde Julho, que tornaram mais difícil o acesso ao Rendimento Social de Inserção.
Em Agosto de 2012, o número de beneficiários de Rendimento Social de Inserção (RSI) era de 295 mil, menos 43 mil que em Junho. Nesse mesmo período, este apoio foi retirado a dez mil famílias. Porém, os dados agora revelados pelo Instituto de Segurança Social (ISS) mostram também uma redução significativa do número de pedidos para acesso à prestação.
"Que milagre é este?", ironiza Sérgio Aires, presidente da Rede Europeia Antipobreza, que dá a "garantia absoluta que a pobreza não está a diminuir" e defende que as novas regras - mais apertadas - para a atribuição do RSI, que entraram em vigor a 1 de Julho, são a única explicação para estes dados.
Em Junho de 2012, existiam mais de 338 mil beneficiários de RSI e o número de famílias abrangidas por este apoio era superior a 127 mil. Dois meses depois, em Agosto, estes valores caíram para 295 mil e 116 mil, respectivamente. É preciso recuar até Novembro de 2007 para encontrar um número tão baixo de pessoas a beneficiar de RSI. Quanto às famílias, desde Março de 2008 que não havia tão poucos agregados a receber esta prestação social.
O ponto de viragem dos valores é óbvio: o mês de Julho, data da entrada em vigor das novas regras do RSI. Entre outras alterações, o novo regime para aceder a esta prestação excluiu todas as pessoas com mais de 25 mil euros em depósitos bancários. As regras em vigor prevêem ainda a assinatura de um contrato anual, com uma duração de 12 meses e obrigações que envolvem o beneficiário e os membros do agregado familiar. Tudo, diz o ISS, para "que esta prestação social seja um apoio efectivo às classes mais desfavorecidas", "constituindo assim um instrumento de inserção e coesão social".
"Não é preciso ser um grande especialista nesta matéria para perceber que estes dados não resultam da redução da pobreza e das dificuldades, mas das novas medidas - mais apertadas, com maior rigor e maior controlo", decretadas pelo actual Governo, nota Sérgio Aires, considerando que este efeito não é surpreendente.
Eugénio Fonseca, presidente da Caritas, concorda: "As novas regras impediram muita gente que precisa do RSI de aceder a este apoio e atingiram sobretudo muitos dos que mais precisavam e que agora, sem qualquer tipo de protecção social, estão a regressar às instituições". "As carências estão a aumentar de dia para dia de forma muitíssimo significativa", acrescenta Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS).
Olhando para o tipo de prestações de RSI, ressalta sobretudo a queda drástica nos valores acima dos 400 euros de prestação. As famílias que recebiam acima deste valor caíram de 20.459 em Maio para 6390 em Agosto. Quem mais necessitava, passou a receber menos.
Instituições em ruptura
Paralelamente, o número de requerimentos e diferimentos também caiu de forma significativa: em Agosto houve pouco mais de dois mil pedidos para acesso à prestação, quando em Maio tinham dado entrada nos serviços do ISS mais de 12 mil. No caso dos diferimentos, em Maio houve 4906 e, em Agosto, apenas 987.
Para o presidente da Rede Europeia Antipobreza, a diminuição dos pedidos é precisamente um reflexo da cada vez maior dificuldade em aceder ao RSI. Não só pela burocracia exigida para o processo, mas também pelo facto de as organizações sociais - que geralmente intermediavam este processo - estarem actualmente sobrecarregadas com respostas de "emergência social".
"Muita gente que precisa e tem direito ao RSI nem chega a apresentar o pedido. Tenho recebido queixas de muitas pessoas que afirmam ter sido informadas, erradamente, que não vale a pena pedir o RSI porque não vão ter direito", diz Aires.
"As pessoas começam a ver que o RSI é um apoio em vias de extinção e, nesta altura, perderam qualquer expectativa em relação a um apoio do Estado", acrescenta Lino Maia, que sublinha também a crescente procura de apoios junto das instituições de solidariedade social. "Espero que este corte nos apoios não seja um prenúncio do colapso. As instituições de proximidade que estas pessoas procuram já ultrapassaram o seu limite de resposta", desabafa.