10.9.20

Economia dá sinais de que regresso à normalidade será lento

Sérgio Aníbal, in Público on-line

Os indicadores económicos conhecidos a partir de Julho revelam, em Portugal e no resto da Europa, que a retoma está a perder velocidade, confirmando regresso lento da economia aos níveis pré-crise. E constituem um desafio para os governos, Bruxelas e banco central

Depois da esperança trazida por uma retoma relativamente rápida da actividade económica em Junho, acumulam-se os sinais, tanto em Portugal como no resto da Europa, de que a velocidade da recuperação diminuiu de forma acentuada em Julho e Agosto, confirmando a ideia de que um regresso das economias aos níveis anteriores à pandemia ainda vai ser demorado.

Um atrás do outro, os indicadores que têm vindo a ser publicados para os meses de Julho e Agosto deste ano – e que são os primeiros a dar uma ideia sobre a forma como a economia se está a comportar no terceiro trimestre do ano – apontam todos no mesmo sentido: depois da queda abrupta da actividade em Abril e Maio e de um recuperação significativa em Junho, a tendência de melhoria manteve-se, mas a um ritmo bem mais lento.

Os indicadores avançados publicados esta semana pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) – que tentam antecipar qual o nível de actividade económica registado nos meses para os quais ainda não há dados oficiais do PIB – mostram exactamente este fenómeno.

Na zona euro, o indicador, que tinha caído de 99,25 pontos em Fevereiro para 91,7 pontos em Abril, recuperou fortemente em Junho para 97 pontos. Mas, desde aí, quase não subiu, passando apenas para 97,6 pontos em Julho e para 97,7 pontos em Agosto.

Aumentar

A OCDE diz, numa análise a estes números, que “o ritmo da retoma abrandou” e que “essa moderação se verifica em todas as principais economias da OCDE, especialmente em França, onde o indicador apenas melhorou marginalmente durante os últimos dois meses”.

Para Portugal, a OCDE ainda não publicou números para o mês de Agosto, mas logo em Julho registou-se uma quase estagnação do indicador avançado de actividade económica, que permanece ainda distante dos níveis pré-pandemia.

Estes resultados estão em linha com aquilo que está também a acontecer ao indicador de clima económico calculado pelo INE, e que se baseia nas expectativas dos consumidores e das empresas para avaliar as condições que atravessa a economia portuguesa. Também aqui se verificou uma recuperação forte em Junho, o mês em que se procedeu a um retomar da actividade parada no início da pandemia, mas em Julho e Agosto, apesar do indicador de clima económico ter continuado a subir, a melhoria foi bem mais lenta.

Os dados do comércio internacional apontam no mesmo sentido. As exportações portuguesas de bens, um dos motores da economia antes da pandemia, tinham registado em Abril e Maio o seu resultado mais negativo, com quebras face ao período homólogo próximas de 40%. Em Junho, assistiu-se a uma recuperação, com a variação negativa a passar a ser de 10%. Em Julho, contudo, a recuperação foi feita de forma mais lenta, mantendo-se uma variação negativa de 7,3%.
Retoma em “V” afastada

Este abrandamento no ritmo de retoma da actividade económica não constitui uma surpresa. Em Junho, a forte subida registada em diversos indicadores poderia apontar, caso se mantivesse nos meses seguintes, para a concretização de uma recuperação em “V”, o que significaria que toda a actividade perdida durante os meses de confinamento total seria retomada com a mesma rapidez. Este seria o cenário ideal, mas, tal como se previa, não será o que se irá registar.

O que parece estar a confirmar-se, com os dados conhecidos em Julho e Abril, é que depois de uma fase de recuperação inicial da actividade assim que se procedeu ao desconfinamento, a retoma total da produção industrial, do consumo, do emprego ou das exportações será bem mais difícil e lenta.

A explicação mais óbvia para isto está no facto de não se poder assistir ainda em alguns sectores a um regresso completo à actividade. Os restaurantes, por exemplo, recuperaram clientes assim que puderam reabrir, mas a lotação que lhes é permitida é inferior à que tinham antes da crise.

Mas há ainda outros fenómenos – comuns a outras crises – que não permitem que a retoma seja muito rápida, como a maior precaução das empresas e dos consumidores na hora de investirem e de consumirem ou o efeito de quebra do consumo que é provocado pelo facto de o desemprego ter aumentado nos últimos meses.

Combinados estes factores, um regresso da actividade económica aos níveis registados antes da crise demorará ainda a chegar. Nas previsões feitas pelas instituições internacionais, tanto para a zona euro como para Portugal, apesar de se apontar para um crescimento forte em 2021, o PIB desse ano continuará a ser inferior ao de 2019. E em termos trimestrais, aquilo que se projecta é que deverá ser preciso esperar até ao arranque de 2022 para que aquilo que se perdeu de forma repentina com a pandemia seja recuperado.

Ainda assim, mesmo esta projecção depende daquilo que irá acontecer à própria pandemia, sendo claro para todos que a ocorrência de uma segunda vaga de grandes dimensões poderá adiar ainda por mais tempo a concretização completa da retoma.

Seja como for, os indicadores económicos conhecidos para Julho e Agosto constituem um sinal de alerta para governos, instituições europeias e bancos centrais.

Na hora de decidirem se devem prolongar as medidas de apoio à economia, se devem acelerar a implementação prática dos investimento do fundo de recuperação ou se devem lançar novos estímulos monetários, os decisores políticos devem ter em conta que o nível de actividade económica ainda vai estar no final de 2020 e ao longo de 2021 vário pontos percentuais abaixo do nível pré-crise, algo que se arrisca a criar ainda mais desemprego.