4.9.20

Na casa Os Miúdos, há quem não vá visitar a família desde Março

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

“Havia crianças que passavam o fim-de-semana com a família, porque o projecto de vida delas é a reintegração familiar. Se vão um fim-de-semana, têm de ficar em confinamento 14 dias. Achamos que isso é descabido”, explicou a directora técnica

Na casa de acolhimento Os Miúdos, da Instituição Particular de Solidariedade Social Casa da Primeira Infância, em Loulé, há crianças que não vão visitar a família desde Março, apesar do seu projecto de vida ser o retorno. A equipa quis poupá-las a um período de isolamento de 14 dias.

Não se pense que as nove crianças, dos zero aos 12 anos, nunca mais viram a mãe, o pai ou outro adulto de referência. Nos primeiros meses de pandemia, com o país inteiro fechado dentro de casa, seguindo as orientações da Direcção-Geral de Saúde (DGS), os contactos fizeram-se através do telefone e da Net. Na segunda metade de Maio, as visitas voltaram, mas limitadas a uma pessoa, uma vez por semana. Sem beijos, com alguma distância.

O que nunca mais aconteceu foram as saídas para convívio familiar. “Havia crianças que passavam o fim-de-semana com a família, porque o projecto de vida delas é a reintegração familiar. Se vão um fim-de-semana, têm de ficar em confinamento 14 dias. Achamos que isso é descabido”, explicou a directora técnica, Paula Marinho. Houve famílias que contestaram. A equipa explicou à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens ou ao Tribunal de Família e Menores a razão pela qual as visitas tinham sido suspensas: a orientação técnica da DGS que manda sujeitar a isolamento de 14 dias quem se ausenta da casa. As entidades anuíram. E os pais, “tirando um ou outro, acabaram por compreender”.

Desde o início da pandemia, entraram duas novas crianças, o que quer dizer que por duas vezes houve crianças a cumprir o isolamento de 14 dias. Um bebé de quatro meses e uma menina de dois anos e meio. “O bebé foi mais fácil. Não sai do espaço em que é colocado. A menina, através de brincadeiras, jogos, brinquedos, tentámos que passasse os 14 dias de forma lúdica, mas foi mais desgastante para as equipas. Tinha de estar sempre um elemento com ela.”

Tudo isso obriga a maior esforço. Havendo uma criança em isolamento, a equipa técnica tem apoiar mais a equipa educativa nos banhos, na alimentação, na higienização dos espaços. “A distância connosco é impensável. Esta é a casa deles”, diz a directora técnica. “Não impedimos os meninos de circular no espaço deles. E temos a sorte de ter um jardim que é só nosso. E que tem uma pequena piscina e espaço para brincadeiras ao ar livre.”

Apesar de tudo, não deixaram de acontecer os regressos definitivos a casa. “Não houve período de adaptação de ir a casa e voltar. Teve de ser por vídeo-chamadas e visitas das equipas.” Agora, a grande dúvida é o início do ano lectivo. As crianças em idade escolar estão matriculadas. Os livros estão comprados. “Temos receio porque havendo um contágio estão sempre em risco todos os outros meninos acolhidos e os funcionários também. Apesar desta faixa etária não ser a mais atingida, há sempre receio. Mas também digo que a telescola, nos moldes em que estava, também não garante grande sucesso. Principalmente para crianças com dificuldades de aprendizagem.”