9.9.20

Governo, BE e PCP querem nova prestação social. O que estará em cima da mesa?

Liliana Valente, in Expresso

Uma nova prestação social temporária parecida ao Rendimento Social de Inserção ou uma prestação mais ampla? Alargar as existentes? E de quanto estamos a falar?

Há muito a dividir Governo, BE e PCP, mas há alguns pontos em que se tocam. Um deles será a criação de uma nova prestação social. Uns de uma forma, outros de outra, mas já foram apresentando propostas para aumentar a protecção social de quem cai nos buracos da malha e não tem direito a nenhuma. As reuniões técnicas entre os partidos estão a acontecer por estas semanas até à apresentação do Orçamento do Estado. Até lá, vão afinar-se pormenores, que são, na verdade, o esqueleto da medida: será mais uma espécie de Rendimento Social de Inserção (RSI) temporário ou uma prestação que abranja outras? Qual o valor? Tudo está em cima da mesa.

No campo das prestações sociais, várias têm sido as propostas e durante a pandemia foram aprovados algumas mudanças nos apoios sociais na tentativa de abranger mais pessoas. Contudo, há uma nova realidade à espreita: com as dificuldades das empresas neste outono chegarão mais falências, mais desemprego a acrescentar a quem já perdeu rendimentos. Uma crise que se perspetiva profunda e a deixar muita gente sem rendimentos.

Tendo em conta esta previsão, o primeiro-ministro, em entrevista ao Expresso, admitiu a criação de uma nova prestação social "para aquelas situações excecionais que passámos a ter, que a covid introduziu e que não têm resposta em nenhuma das prestações sociais tradicionais", disse. No caso, para pessoas "que tinham rendimentos ‘relativamente elevados’ para serem elegíveis para essas prestações sociais", mas que vivem situações dramáticas.

A prestação anunciada por António Costa não tinha universo definido ainda nem montante - o primeiro-ministro remeteu o tema para as negociações com os antigos parceiros -, mas tem já algumas características definidas: não será um alargamento do RSI, nem a sua alteração substancial, será temporária e adaptada. Nas explicações do primeiro-ministro "não faz sentido alterar estruturalmente uma medida para uma situação excecional. Faz mais sentido criar uma medida temporária que alargue neste período a elegibilidade".

Os antigos parceiros apoiam a necessidade de um apoio social alargado - é uma das suas condições à negociação - e os próprios até apresentaram propostas nesse sentido no Parlamento. O PCP foi dos primeiros a apresentar no Parlamento uma proposta que alargue as condições de acesso ao subsídio social de desemprego e ao subsídio de desemprego por exemplo. Para os comunistas, a protecção no desemprego é insuficiente e por isso, ainda para mais numa situação excepcional como a atualmente vivida, é preciso uma "revisão global do regime de protecção social de desemprego", mas para começar, propuseram (e foi aprovado na Assembleia da República) "um regime excepcional e temporário dirigido ao subsídio social de desemprego", eliminando o prazo de garantia para que houvesse um pedido de apoio. Isto porque para ter acesso a prestações de desemprego era preciso um prazo mínimo de 180 (ou 120 dependendo dos casos) dias de trabalho nos últimos 12 meses. O Governo, em maio, reduziu estes prazos para metade, mas o PCP propôs eliminá-los.

Já o BE, que já teve mais reuniões de negociação com o Governo, também tinha apresentado medidas no âmbito dos dois subsídios de desemprego, prorrogando as medidas excecionais de 2020 para 2021 e 2022, mas acrescentou-lhe, este fim de semana uma proposta de um novo apoio social que abranja quem está fora de qualquer apoio e chamou-lhe "Rendimento Social de Cidadania".

RENDIMENTO SOCIAL DE CIDADANIA

No conteúdo, vai de encontro do que foi definido por António Costa, mas na forma nem por isso. O BE quer uma prestação "definitiva" que apoie os que estão a ficar para trás. O primeiro-ministro falou numa prestação de caráter "temporário" a acrescentar às já existentes.

No valor, o BE propõe que esta prestação seja um diferencial até ao limiar de pobreza. Ou seja, cada pessoa que seja elegível para este apoio recebe "a diferença entre os rendimentos que tenha e o limiar de pobreza (502€)". O primeiro-ministro não definiu um teto na entrevista ao Expresso, mas admitiu que não poderia ser semelhante ao Rendimento Social de Inserção.

Já quanto ao universo, os bloquistas querem que esta seja uma prestação de largo espectro e que abranja cerca de cem mil pessoas em 2021. Quem?
"Trabalhadores independentes com descontos em pelo menos três dos últimos 48 meses e que perderam toda ou grande parte da sua atividade/rendimentos";
"Trabalhadores do serviço doméstico, incluindo os do regime convencionado";
"Trabalhadores por conta de outrem não abrangidos por outras prestações de desemprego (que perderam o subsídio de desemprego e foram excluídos do subsídio social pela condição de recursos)";
"Trabalhadores, incluindo informais, que perderam o emprego desde março de 2020 e sem acesso a proteção social"

Nas contas do BE, uma medida desta natureza custaria aos cofres do Estado 420 milhões de euros. Para já, não se sabe quanto está disposto o Governo a colocar numa medida desta natureza. Tudo vai depender das negociações.