Ao contrário daquilo que é referido frequentemente pela “opinião publicada”, o sistema de segurança social não dificulta a participação dos pensionistas no mercado de trabalho.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o “envelhecimento constitui uma vitória do desenvolvimento socioeconómico e da saúde pública que, em simultâneo, gera o desafio de adaptação da sociedade”.
A resposta a este enorme desafio assenta na promoção de um envelhecimento ativo e saudável ao longo do ciclo de vida, sendo que o termo “ativo” ultrapassa em muito os critérios tradicionais (i.e., ser física e profissionalmente ativo), referindo-se, de igual forma, à participação contínua na vida social, económica, cultural, espiritual e cívica de uma comunidade.
Neste contexto, e reconhecendo-se que envelhecimento ativo é muito mais do que envelhecer a trabalhar, o certo é que a componente de participação no mercado de trabalho é um dos elementos centrais na gestão desta problemática, cabendo ao sistema de segurança social um papel essencial no que respeita, nomeadamente, à promoção da participação dos pensionistas no supramencionado mercado.
O que nos diz o Código Contributivo
O Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (i.e., Código Contributivo) prevê que os pensionistas em atividade possam estar abrangidos pelo regime geral de proteção social.
Com efeito, de acordo com o artigo 89.º, “são abrangidos pelo regime geral, com as especificidades previstas na presente subsecção, os pensionistas de invalidez e velhice de qualquer regime de protecção social que cumulativamente exerçam actividade profissional”.
Ainda de acordo com o Código Contributivo, o direito à proteção (artigo 90.º) e a taxa contributiva global (artigo 91.º) são função do tipo de pensão recebido (invalidez versus reforma), bem como da natureza do exercício da atividade (funções privadas versus funções públicas).
Importa referir que as contribuições efetuadas pelas empresas e as quotizações realizadas pelos trabalhadores têm como contrapartida um acréscimo na pensão de velhice ou de invalidez nos termos do previsto no artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio.
Com efeito, de acordo com o número 1 no referido artigo (acréscimos por exercício de actividade), “nas situações de exercício de actividade em acumulação com pensões de invalidez relativa e de velhice, o montante mensal da pensão regulamentar é acrescido de 1/14 de 2% do total das remunerações registadas”, sendo que o “acréscimo (…) produz efeitos no dia 1 de janeiro de cada ano, com referência às remunerações registadas no ano anterior” (número 2 no artigo 43.º).
Valerá a pena continuar a trabalhar?
Tendo por base o anterior, considere-se um determinado individuo, beneficiário de uma pensão de velhice, que mantem uma relação laboral (i.e., trabalhador por conta de outrem) com uma entidade privada auferindo uma remuneração mensal de €1000 por mês (€14.000 por ano).
Considerando a legislação em vigor, a taxa contributiva global será de 23,9%, o que significa que o valor entregue anualmente à segurança social ascende a €3346 (contribuições das empresas e quotizações dos trabalhadores). Como contrapartida por estas contribuições, o pensionista verá a sua pensão acrescida em €280 por ano (Hipótese A).
Chegados a este ponto, é legitimo que o leitor se interrogue sobre a “bondade” do sistema de segurança social face às contribuições realizadas.
Para responder a esta inquietação, proponho que se compare este acréscimo com os obtidos se uma contribuição de dimensão semelhante fosse entregue a uma seguradora como contrapartida da atribuição de uma renda vitalícia.
Assim, para um pensionista/trabalhador com 65 anos de idade, uma entrega única de €3346 a uma seguradora, assumindo uma tábua de mortalidade TV 99/01 e uma taxa de desconto de 1%, teria como contrapartida uma pensão anual vitalícia de €182,5 (Hipótese B), valor que compara como os €280 (+53,4%) obtidos através do sistema público.
O diferencial anterior acentua-se se tivermos apenas em consideração as quotizações dos trabalhadores. Na realidade, dos €3346 entregues à segurança social, apenas €1050 correspondem a quotizações a cargo do trabalhador.
Daqui resulta que se os €1050 de quotizações fossem entregues a uma seguradora, a contrapartida traduzir-se-ia numa pensão anual vitalícia de €57,29 (Hipótese C), valor que compara como os €280 (+388,7%) obtidos através do sistema público.
Epílogo
Ao contrário daquilo que é referido frequentemente pela “opinião publicada”, o sistema de segurança social não dificulta a participação dos pensionistas no mercado de trabalho.
Na realidade, o Código Contributivo prevê que os pensionistas de invalidez e velhice possam continuar a trabalhar por conta de outrem, sem prejuízo da manutenção do direito ao recebimento da pensão, garantindo-se, simultaneamente, uma valorização anual das referidas pensões em função das contribuições anualmente realizadas.
De igual forma, constata-se que os acréscimos na pensão de velhice proporcionados pelo atual sistema público de pensões para os pensionistas em atividade são bastante mais generosos do que os obtidos através da realização de contribuições equivalentes para um sistema privado (i.e., aquisição de uma renda vitalícia).
Neste contexto, podemos concluir que a atual legislação é “amiga” do envelhecimento ativo, ainda que, em face dos acréscimos “generosos” de pensão proporcionados, não fica garantido que seja igualmente “amiga” do equilíbrio intertemporal do sistema de segurança social.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
Professor auxiliar na Universidade Lusíada