Por Catarina Gomes, in Público on-line
Um pouco por toda a Europa, os governos estão a cortar nas despesas com a saúde e em 2010, ao contrário do que era tendência desde 2000, o crescimento dos gastos no sector foi nulo ou muito baixo.
Portugal não foi excepção, tendo-se passado de um ritmo de crescimento de 2,3% para 0,6%. Mas em plena crise, os portugueses continuam a ser dos que mais pagam directamente do seu bolso despesas com saúde: 26% face aos 20,1% da média dos 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que divulgou esta quinta-feira o seu relatório sobre saúde de 2012.
Apesar dos cortes, Portugal continua a ser dos países que maior percentagem gasta do seu Produto Interno Bruto (PIB) em saúde, 10,7% em 2010, face a 9,5% da média da OCDE (no ano anterior tinha sido de 9,6%). Mas se os números forem vistos à lupa, ou seja, quanto é alocado neste sector por habitante, a média é bastante inferior à dos países da OCDE: os gastos em saúde per capita são de 2196 euros, enquanto na média dos países chega aos 2631 euros. Nos EUA, por exemplo, é de 6629 euros.
Os EUA são, de longe, o país que mais gasta em saúde, alocando-lhe 17,6% do seu PIB, seguido de vários países europeus, como é o caso da Holanda (12%), França e Alemanha (11,6%).
Abrandamento
Os gastos com saúde em Portugal aumentaram uma média de 2,3% entre 2000 e 2009, mas este crescimento desacelerou para 0,6% em 2010. Outros países da OCDE também sentiram este abrandamento, na sequência da recessão e da necessidade de consolidação fiscal. Mas o sector público continua a ser a principal fonte de financiamentos dos países da OCDE, a excepção são os EUA, Chile e México. Em Portugal, 65,8% dos gastos com saúde vêm de financiamento público em 2010, ainda assim um valor abaixo da média da OCDE que é de 72,2%.
O relatório da OCDE dá conta dos efeitos da crise nos investimentos com saúde, notando que, em vários países da OCDE, muito particularmente na Europa, houve cortes no sector, contrariando a tendência de aumento rápido dos gastos nesta área. Se de 2000 a 2009 o ritmo de crescimento foi de cerca de 5%, em 2010 foi nulo ou muito baixo. Os cortes dos últimos tempos começaram verdadeiramente a sentir-se em 2010, principalmente nos países europeus mais afectados pela recessão: na Irlanda os cortes levaram a um crescimento da despesa anual de 7,6%, comparado com os 8,4% de 2000 a 2009; na Grécia, as estimativas apontam para cortes de gastos com saúde de 6,5% em 2010, depois de um crescimento anual de 6% desde o início do novo milénio.
As reduções foram obtidas através de uma série de medidas. Na Irlanda cortaram-se salários e honorários pagos a profissionais e empresas farmacêuticas, e actualmente está-se a fazer redução de profissionais de saúde. A Estónia fez cortes em custos administrativos no Ministério da Saúde e também reduziu os preços de serviços de saúde reembolsados pelo Estado. O uso de medicamentos genéricos foi outra das apostas em vários países.
Outras medidas tiveram como consequência um maior contributo dos pagamentos directos feitos pelos cidadãos em saúde, foi o caso da Irlanda, com o aumento dos custos com medicamentos e dispositivos medidos, enquanto na República Checa os cidadãos passaram a ter de pagar mais para ir ao hospital, à semelhança do que aconteceu em Portugal com a subida das taxas moderadoras.
Tal como já vinha sendo assinalado em relatórios semelhantes, de anos anteriores, os portugueses estão entre os que mais pagam pela sua saúde com dinheiro do seu bolso: 26% das despesas são arcadas pelos próprios, face à média de 20,1% da OCDE. Piores do que os portugueses só mesmo os húngaros (26,2%), os israelitas (27,1%), os chilenos (33,3%) e, no topo da escala, os gregos, com 38,4% das despesas custeadas pelos próprios.
Muitos médicos, poucos enfermeiros
Em comparação com a média da OCDE, Portugal continua a surgir com uma média superior de número de médicos por mil habitantes: 3,8, face aos 3,1 do universo dos países analisados. Mas o relatório refere que este número poderá estar sobre-representado porque se incluem na contabilidade médicos que poderão não estar a exercer.No que diz respeito ao ratio de enfermeiros, o relatório faz um balanço positivo da evolução no sector: assinala-se que o país conseguiu duplicar o número de enfermeiros per capita nas duas últimas décadas, de 2,8 profissionais por 1000 habitantes em 1990 para 5,7 em 2010, mas ressalva-se que o país continua a estar abaixo da média da OCDE (8,7 por mil habitantes).
Em linha com que o tem acontecido com vários países, o número de camas hospitalares tem decrescido, Portugal tinha 2,8 camas por mil habitantes em 2010, abaixo das 3,4 da OCDE. Esta é uma tendência que é consequência da tendência de redução dos dias de internamento e do aumento das cirurgias em ambulatório (sem necessidade de internamento).
No campo das tecnologias médicas, o balanço é ambivalente: se por um lado o país tem menos aparelhos de ressonância magnética do que a média (9,2 por milhão de habitantes em 2008, face 12,5 da média geral), tem mais aparelhos de TAC (27,4 por milhão de habitantes, excedendo a média de 22,6 da OCDE).
Menos percentagem de fumadores
E como se saem os portugueses em relação ao seu estado de saúde? Em Portugal quando se nasce pode contar-se viver em média 79,8 anos, à semelhança do que acontece na média da OCDE, mas abaixo dos 83 anos no Japão, seguido de perto pela Suíça, Espanha e Itália.
Ainda antes da legislação de proibição do tabaco em restaurantes ter entrado em vigor já os números mostravam que Portugal é dos países onde há menos percentagem de fumadores (18,6% em 2006), abaixo da média de 21% da OCDE. A Suécia, a Islândia, os EUA e a Austrália foram dos países que mais conseguiram reduzir o tabagismo, com taxas de actuais de fumadores em torno dos 15%.
Além do tabagismo, outro dos factores de risco de doenças como o cancro ou a diabetes foi a obesidade. Em comparação com os países do Sul da Europa, estamos quase iguais a Espanha (15,4% em 2006, face a 16% no país vizinho em 2009) no que diz respeito às taxas de obesidade (feitas com base em peso e altura auto-reportados), mas acima dos 10% da Itália e dos 13% da França.