1.9.20

E, de repente, o desemprego jovem escalou para os níveis de há três anos

Pedro Crisóstomo, in Público on-line

Em três meses, a taxa de desemprego dos jovens regressou ao patamar dos 25%. Com pouco investimento e baixas expectativas, a recuperação ainda é uma incógnita.

Bastaram três meses para a pandemia esbater a dinâmica do mercado de trabalho e colocar o desemprego dos jovens acima de 25%. O efeito disruptivo do confinamento fez escalar esta taxa para os níveis de há três anos. Uma subida que é como um recuo no tempo.

Um em cada quatro jovens da população activa dos 15 aos 24 está sem trabalho (25,6%). Em Junho, estimou o Instituto Nacional de Estatística (INE), havia 81,2 mil jovens fora do mercado de trabalho — sem trabalho, activamente à procura, disponíveis para trabalhar. A estes juntam-se outros enquadrados no subemprego.

Não é um regresso aos anos da troika, mas é um agravamento para níveis idênticos aos de alguns meses de 2009 e 2017, dois anos distintos na economia, mas parecidos num indicador: a taxa de desemprego dos jovens andava na ordem dos 23-24-25%.

No entanto, se em 2017 o crescimento da economia embalava a descida do desemprego, hoje, como em 2009, o momento é de retracção económica. Com as empresas em layoff, as horas trabalhadas em queda e o indicador de investimento empresarial em baixa, é difícil esperar uma melhoria do mercado de trabalho pelo menos até à Primavera do próximo ano, considera o economista Francisco Madelino, antigo presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP).

Por um lado, não havendo investimento das empresas, há menos ofertas de trabalho; por outro, poderá haver menos jovens à procura activa de emprego nos próximos meses, “quer pela [falta de] expectativas, quer pela situação sanitária”, admite o economista, lembrando que o próprio INE tem chamado a atenção para o facto de o encerramento parcial ou total das empresas e a situação sanitária estarem a interromper os canais de informação normais das ofertas de trabalho.

O agravamento vê-se também no número dos que acorrem aos centros de emprego: em Julho havia 45 mil jovens até aos 24 anos inscritos no IEFP, um aumento de 58% face a Julho do ano passado (28,5 mil).

A faixa etária abaixo dos 25 anos é aquela que estatisticamente se usa a nível internacional para fazer o retrato do desemprego jovem (15-24 anos). Os dados mensais evidenciam uma subida significativa a partir de Abril: de 18,3% em Março, a taxa passou para 20,6% no mês seguinte, para 21,4% em Maio e para 25,6% em Junho (valor provisório ainda sujeito a revisão nos dados que o INE deverá divulgar nesta segunda-feira).

Ao mesmo tempo, a população empregada dessa faixa etária está a diminuir: de 295,1 mil jovens em Março para 271,6 mil em Abril, de 243,7 mil em Maio para 235,8 mil em Junho.

Um indicador importante neste momento é o da taxa de subutilização do trabalho, porque inclui não apenas a população desempregada, mas também o subemprego (trabalhadores involuntariamente a tempo parcial) e ainda os inactivos à procura de emprego mas não disponíveis para trabalhar, bem como os inactivos disponíveis para trabalhar mas que não procuraram emprego. Só que este indicador mensal não permite saber o número exacto da população jovem.

Ao mesmo tempo, para se perceber como é que o mercado laboral tem evoluído na pandemia entre a população da faixa etária imediatamente a seguir (dos 25 aos 34 anos) é possível olhar para dados do segundo trimestre (de Abril a Junho). Como as estatísticas trimestrais permitem ver mais patamares de idade, neste caso é possível verificar que a taxa de desemprego entre as pessoas dos 25 aos 34 anos era de 7,7% nesse trimestre (73,2 mil pessoas).

Já a taxa dos jovens (com idade entre os 15 e os 34 anos) que não estão nem empregados nem a estudar, os chamados “nem-nem”, está nos 12,8% (segundo trimestre), um valor superior àquele em que se encontrava há três anos (segundo trimestre de 2017) e semelhante à dimensão de há quatro anos (segundo trimestre de 2016). Essa taxa é um pouco mais alta quando se desdobra o indicador em dois e se concentra a atenção nos jovens dos 25 aos 34 anos. Aí, a taxa está nos 16,2%.

Francisco Madelino admite a possibilidade de surgirem ofertas de emprego ancoradas no teletrabalho e, com isso, haver jovens que possam trabalhar para empresas internacionais a partir de Portugal. Esse, diz, é um factor que pode ajudar, mas não compensar totalmente o aumento do desemprego, nem substituir outros empregos que exigem a presença no local de trabalho, mesmo que pontualmente.

O teletrabalho, avisa, cria “novas dimensões” a que é preciso estar atento, também pelo impacto nas relações de trabalho da população jovem e com vínculos precários. “O teletrabalho pode levar a uma desregulação da organização do tempo de trabalho” e, sublinha o professor do ISCTE-IUL​, implica uma maior complexidade quando estão em causa empresas que têm sede noutros países (seja no que toca ao cumprimento de horários e das horas de trabalho, seja se for preciso dirimir matérias laborais ou mesmo determinar as sedes judiciais para a resolução de litígios).