27.2.12

O papel das IPSS num novo quadro social

António Figueiredo, in Setúbal na Rede

Com a falência do Estado Social há que criar um novo modelo de intervenção social com menos Estado e maior solidariedade das comunidades. Ao Estado de intervenção centralizadora deve responder um Estado mais próximo das comunidades, com maior transparência e sem clientelismo social. Falo dum Estado em que o princípio da subsidiariedade seja o orgulho das suas políticas sociais. E em Portugal temos 5.000 IPSS abertas ao desafio…

Temos que tomar consciência de que a escassez dos recursos financeiros exige mudar toda a filosofia de intervenção social do Estado. Na última década, viveu-se um processo de ditadura do Estado em todas as matérias sociais, numa verdadeira política de estatização da pessoa humana. A estatização do ensino, da nascença à adolescência, sem reconhecer às famílias o direito de escolha, a rede pública de ensino e da saúde, o afastamento das instituições particulares de solidariedade social, marcaram o perfil do Estado Social que estava já a definhar.

Com políticas de faz de conta para o combate ao desemprego e políticas de apoios à família para compor o ramalhete das estatísticas, em que o fracasso do PARES foi exemplo, teremos de reclamar uma nova relação entre as políticas e os agentes sociais. De costas voltadas para o potencial humano do voluntariado, assistimos à agonia de quem não pode combater a pobreza por falta de intervenção do Estado. Um Estado que paradoxalmente engordava o setor público e queimava recursos em institutos e empresas mal geridas, mas apadrinhadas pelo poder político no poder. Recordo aqui, porque as greves da CP e Metropolitano ainda estão na mente de todos, como os governos passados permitiram gestões ruinosas garantindo benefícios sociais dourados e ainda não se teve a capacidade para corrigir tais distorções entre elites de classes trabalhadoras e os trabalhadores que lutam para sobreviver.

Com o novo governo, esperava-se uma revolução na intervenção social do Estado, mesmo com os condicionamentos financeiros da crise e pressões da troika. Há seis meses subscrevi um memorando para o Secretário de Estado da Segurança Social, em que era clara a vontade das IPSS em participarem com uma bolsa de ideias para garantir maior intervenção social. Porque muitos dos leitores podem ser influenciados pelos que atiram pedras às IPSS, divulgo nesta crónica o que foi proposto:

· Consignar uma percentagem mínima (p.e. 10%) das mais-valias, lançadas pelas autarquias nas novas construções, verba destinada à construção de habitação social;

· Consignar uma percentagem mínima dos espaços de domínio público autárquico (p.e. 10%), verba destinada para construção de equipamentos sociais;

· Consignar uma percentagem mínima das receitas directas (p.e. 5%) das autarquias, verba destinada a aplicação no apoio às IPSS;

· Rever a actual legislação do Mecenato Social;

· Reavaliar a aplicação social de bens alimentares ( PCAAC e Banco Alimentar );

· Alargar a tabela de IRS (p.e. até 80%), pois não faz sentido que remunerações generosas não sejam tributadas com equidade;

· Lançar um imposto solidário sobre pensões douradas (superiores a 12 vezes o RMG);

· Suspender todas as comparticipações atípicas, exemplo CDLS, até avaliação dos resultados obtidos, pois há indícios de fracos resultados e grande favorecimento;

· Reavaliar as equipes de RSI, sobredimensionadas e com custos exagerados;

· Acabar com o espírito de subsidio dependência em projectos que não se enquadrem em políticas de intervenção social prioritárias, mas que sejam sustentáveis pela participação da Segurança Social, das Autarquias e das Instituições;

· Acabar com as comparticipações a título gratuito para investimento, criando-se uma linha de crédito a longo prazo (25 a 50 anos) a taxa de juro EUROLIBOR, salvaguardando a componente que seja atribuída por fundos comunitários;

· Criar uma linha de crédito a longo prazo (10 a 25) a taxa de juro EUROLIBOR, para salvar as Instituições que estão em grave crise financeira;

· Criar a figura de dívida social a ser contabilizada nos beneficiários de apoios sociais e/ou familiares, de forma a que os apoios possam ser recuperados nas prestações futuras e nas transmissões de bens, sendo exemplo de inclusão o subsidio de desemprego, o RSI e a fuga da família à sua responsabilidade de participação em algumas valências sociais.

· Alterar o actual modelo de cálculo da comparticipação familiar, pela prova de rendimentos globais e redução na dedução da habitação.

Há que encontrar um novo modelo de intervenção social em que as IPSS reclamam um papel de intervenção que permita mais com menos, no papel de ajudar os que mais precisam e que são vozes silenciosas num país que já começou a esquecê-los. As IPSS têm um papel relevante pela sua proximidade das comunidades, mas estão a viver a agonia da falta de meios para ajudar os 30% de população em pobreza. Queira o governo acreditar no papel das IPSS e introduza-as no palco da discussão da aplicação social dos recursos públicos e veremos que é possível fazer mais com menos.