1.6.12

Crise gerou "uma mistura explosiva", alerta ex-presidente Jorge Sampaio

in Jornal de Notícias

O alto representante do secretário-geral das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações, Jorge Sampaio, disse que o "medo, desconfiança e ressentimentos" provocados pela crise são uma "mistura explosiva" que é preciso resolver.

"Costumo dizer que esta crise não é só uma questão de números, de orçamento e de financiamentos. No centro da crise estão pessoas - pessoas que temem pelos seus empregos, que receiam pelo seu futuro; no centro da crise estão cidadãos que começam a ficar dominados pelo medo, pela desconfiança e pelo ressentimento, uma mistura explosiva a que há que saber dar resposta", afirmou o ex-Presidente da República português.

A resposta deve ser política no plano nacional e europeu, "para além das respostas cívicas que os cidadãos possam organizar", disse Jorge Sampaio, que coordena, em Istambul, na Turquia, desde quinta-feira, a conferência de doadores da Aliança das Civilizações.

"A crise atual que as sociedades europeias enfrentam não é só financeira, nem económica, nem política, mas é também uma crise de valores, de cultura e de civilização. E deste ponto de vista, há sinais preocupantes de que a situação na Europa se está degradar", afirma Jorge Sampaio.

Ressalvando que "em bom rigor, a Aliança das Civilizações não tem uma posição acerca do rumo da construção europeia, pois tal questão extravasa o seu campo de responsabilidades e atuação", Sampaio refere que a organização "visa promover a boa governação da diversidade cultural, através designadamente a construção de sociedades abertas, inclusivas e tolerantes, e há pontos de intersecção entre o domínio de competências da Aliança e a construção europeia".

Mas Jorge Sampaio alerta para aquilo que considera a deterioração do projeto europeu.

"As bases e os laços de confiança em que assenta o contrato social parecem estar a deteriorar-se -- não só no plano da construção da nossa casa europeia comum, mas também a nível nacional no seio dos nossos Estados", afirmou.

"A questão da conciliação da diversidade e da coesão é um debate que se tornou imperativo. O combate à intolerância, à discriminação e aos preconceitos tem de ser levado a cabo com políticas adequadas de integração política, económica e social, reforçadas com estratégias sustentadas de diálogo intercultural", disse também Jorge Sampaio, admitindo a possibilidade de conflitos provocados pela crise.

"A coexistência na diversidade não é imediata nem óbvia, pode mesmo tornar-se numa fonte adicional de conflitos; mas quando é devidamente enquadrada e apoiada é portadora de um enorme potencial de inovação e de criação de bem-estar e prosperidade", afirmou.

"Na Europa tem-se feito muito, mas os altos patamares de exigência alcançados e o seu apreciável acervo em matéria de realização de direitos têm agora de ser reforçados, sob pena de a crise e as rápidas transformações a que assistimos a nível global porem em causa este património", disse ainda Jorge Sampaio sobre a crise económica e financeira que está a afetar a Europa.

Jorge Sampaio que pretende triplicar o orçamento da Aliança das Civilizações, organiza pela primeira vez, a partir de quinta-feira em Istambul, uma conferência de doadores que se prolonga até segunda-feira e que vai reunir mais de uma centena de delegações de governos que compõem a Aliança, incluindo Portugal, representantes das organizações internacionais, membros da Aliança, do setor privado, de fundações e filantropos.