por José Pedro Frazão, no Rio de Janeiro, in RR
É uma encosta com grandes marcas. A maior favela do Brasil, e talvez da América Latina, quer cicatrizar as feridas deixadas pela "troika" composta por pobreza, tráfico e violência. A Rocinha recentra-se no activismo cultural e ambiental, escondendo divisões naturais numa mini-cidade de 150 mil pessoas.
É facil perceber onde estavam em Novembro as bancas de venda de droga ao ar livre na Rocinha. Agora, em cada esquina dessas está uma patrulha da polícia. É cedo ainda para perceber o que muda.
"Mudou muita coisa, melhorou muito"; "mudou muito pouco. Os investimentos que pensávamos que viriam, não vieram". Itamar vê o copo mais cheio que Marco António. A verdade deve andar pela metade, a julgar pelas divisões que não se detectam a olho nu na favela. Os traficantes ainda dominam alguns negócios e mantêm influência nas associações. Entre a polícia - que se olha com desconfiança - e os senhores que dominaram a encosta até Novembro de 2011, fica um povo ainda com medo.
"Ainda existe algum medo. Mas o pessoal, aos poucos, vai perdendo. Estamos confiantes de que, se Deus quiser, vai melhorar", disse o esperançado Itama.
O que faz falta nunca muda
O que está à vista na Rocinha são ruas lavadas e canais de esgoto a céu aberto. Há sacos cuidadosamente colocados à espera da recolha de lixo, não muito longe de uma mini-lixeira num dos largos da favela. O maior problema parece ser ambiental e dos mais básicos. Itamar e Marco Aurélio não se dividem no que falta.
"O saneamento não está nada bom. Os esgotos estão todos rebentados e é tudo lançado na mata. Foram feitas várias reclamações a vários organismos e até agora, nada", descreve um. "Falta muita coisa. Os esgotos estão a ceu aberto. Falta asfalto, iluminação pública. E coisas básicas como apoio de saúde e vacinação", acrescenta o outro.
Marco Aurélio quer mais para a Rocinha. Dá para ver que tudo isso existe apenas em parte da favela. É a tal verdade pela metade que obriga a contar que a comunidade está preocupada com possíel retirada compulsiva de dezenas de famíias por alegado perigo de deslizamentos. A outra face da moeda encontra-se na fraca mobilização dos moradores para acções de pressão sobre a Prefeitura do Rio. O que falta, isso nunca parece mudar.
Activismo anti-balelas
Por isso, Gabriel não esmorece quando comparecem apenas 20 crianças para a caminhada ecológica que marca o início do Movimento Preserva Laboriaux. Ele é um dos líderes de um projecto de educação ambiental que pretende chamar a atenção da própria comunidade para a riqueza da Mata daquela parte alta da Rocinha.
O nome francês do bairro vem de uma companhia que ali se instalou no início do século passado. Desde então, a situação vem degradando-se e agora o bairro vive com os dias contados, sob ameaça de demolição. O activismo ambiental pode ser uma nova arma da Rocinha, agora que as outras - as do tráfico - estão mais escondidas.
"Isto é diferente da Rio+20. A Rio+20 é uma grande 'balela' como foram outros grandes encontros ambientais. Não estão a ser discutidas as necessidades do Brasil e do mundo. É um evento só para chamar a atenção, para dizer que está acontecendo. Nós aqui estamos desprovidos de financiamento, de patrocínios e de qualquer tipo de dinheiro. A gente quer distância de qualquer tipo de apoio político. Queremos mostrar que a intervenção depende de uma vontade que é pública", afirmou Gabriel.
Faltam poucas horas para a Rocinha abrir as portas por um dia às delegações da Rio+20. E talvez seja o momento de dizer tudo isso aos poderes do Rio e do mundo.