1.9.20

Segurança Social e Saúde mandam médicos para os lares de idosos

Alexandra Campos, in Público on-line

Médicos do centro de saúde do Barreiro foram escalados para ir todos os dias ao lar da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro. Ana Mendes Godinho decidiu avançar com equipas de intervenção rápida geridas pela Cruz Vermelha

Na mesma semana em que a ministra da Saúde mandou médicos de família ir todos os dias prestar assistência aos idosos infectados com o novo coronavírus no lar da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, suspendendo consultas de vigilância se necessário, a ministra da Segurança Social anunciou a criação de 18 brigadas de emergência para apoiar lares das misericórdias, das instituições particulares de solidariedade social e até de privados afectados com surtos graves de covid-19 . Segundo o último balanço, há em todo o país surtos de covid-19 em 60 lares de idosos, onde estão infectados 523 residentes e 224 funcionários.​

As brigadas de intervenção rápida da Segurança Social vão ser compostas não só por médicos, mas também enfermeiros e auxiliares e serão geridas pela Cruz Vermelha, revelou Ana Mendes Godinho ao jornal Eco. Estas equipas vão ser destacadas consoante as necessidades pontuais das instituições que se encontrem “numa situação de fragilidade na resposta a surtos covid-19”, especificou. São 18 brigadas, uma por distrito, e o Instituto da Segurança Social vai assinar já na próxima semana um protocolo com a Cruz Vermelha, adiantou ao PÚBLICO o gabinete da ministra.

Estas equipas serão destacadas não só para lares com falta de recursos humanos “para a manutenção das actividades decorrente de baixas ou ausências por doença covid-19, quarentena e ou isolamento profiláctico”, mas também para instituições onde ocorram surtos de covid-19 que impliquem separar os utentes dos que não estão infectados. Os lares nessas condições devem remeter o pedido para os centros distritais, que avaliarão os requerimentos e definirão o número de profissionais necessários. Caberá, de seguida, à Cruz Vermelha constituir e accionar uma brigada em resposta.
Consultas de vigilância em risco

Noutra frente, mais discreta, a ministra da Saúde deu esta semana orientações para que médicos de família do agrupamento de centros de saúde do Barreiro fossem escalados para prestar apoio diário no lar São José, da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, onde um surto de covid-19 infectou mais de meia centena de pessoas e causou quatro mortes.

O presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, disse na segunda-feira que “médicos do centro de saúde” do Barreiro se teriam “recusado a dar apoio” à instituição, à saída de uma reunião com o bastonário da Ordem dos Médicos convocada na sequência da polémica gerada pela auditoria no lar de idosos de Reguengos de Monsaraz. Mas a Administração regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo desmentiu esta acusação, garantindo que os idosos foram acompanhados presencialmente por um médico e uma enfermeira do Agrupamento dos Centros de Saúde (ACES) Arco Ribeirinho “nos dias solicitados” pela provedora da instituição.

Desde quarta-feira, médicos de família de unidades de saúde familiar do Barreiro têm estado a ser escalados para prestar apoio clínico aos idosos infectados. As escalas foram marcadas até à próxima segunda-feira e os médicos, que vão da parte da tarde para o lar no seu horário normal, foram avisados de que, caso seja necessário e por falta de recursos, serão canceladas consultas de vigilância — que incluem atendimentos a grávidas, crianças, diabéticos ou hipertensos.

Foi a ministra da Saúde, que, na terça-feira – no mesmo dia em que, com o primeiro-ministro, se reuniu com o bastonário da Ordem dos Médicos –, pediu à responsável clínica pelo Agrupamento de Centros de Saúde que inclui o do Barreiro que esclarecesse se estava ser cumprido o seu despacho de Abril, lê-se num email a que o PÚBLICO acesso. Neste despacho, Marta Temido determinou que os médicos de família têm que acompanhar diariamente os residentes em lares de idosos infectados com covid-19 que não necessitam de internamento hospitalar. Os lares de idosos não são obrigados, por lei, a ter médicos, apenas têm que ter enfermeiros – um por cada 40 residentes e um por cada 20, no caso de estes serem dependentes. O PÚBLICO pediu esclarecimentos ao gabinete da ministra da Saúde que confirmou apenas que “tem mantido o acompanhamento do cumprimento” do despacho, “face a dificuldades pontuais suscitadas quanto à sua observância”.

Os dirigentes do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) e a Federação Nacional dos Médicos já contestaram este “desvio” dos médicos dos centros de saúde para os lares de idosos da Santa Casa da Misericórdia. O presidente da FNAM, Noel Carrilho, diz que uma unidade de saúde familiar foi mesmo obrigada a deixar de atender utentes durante a tarde porque os dois médicos disponíveis tiveram que ir para o lar de idosos do Barreiro. Lamentando que os clínicos do SNS estejam a ser “obrigados a substituir os médicos do lar que foram de férias”, o secretário-geral do SIM, Roque da Cunha, defende que o despacho da ministra não se sobrepõe juridicamente ao que está definido no acordo colectivo de trabalho. A Ordem dos Médicos também está a estudar esta questão. O conflito ainda está longe de acabar.