Estudo da Coimbra Business School comparou 31 regiões de 16 países da União Europeia e demonstra que Portugal não sai bem da fotografia na execução das PME. O país que melhor soube executar os fundos foi o que assinou a saída: o Reino Unido
As pequenas e médias empresas (PME) portuguesas são pouco eficientes na aplicação dos fundos estruturais da União Europeia (UE) que apoiam o seu desenvolvimento e competitividade. Num estudo da Coimbra Business School que analisou 31 regiões de 16 países da União Europeia, os resultados obtidos não colocam Portugal no fim da lista, mas a verdade é que o país também não sai propriamente bem na fotografia.
“Estamos quase no fim do programa [comunitário 2014-2020] e não aplicámos metade. Por muito que nos esforcemos agora não vamos cumprir os objectivos iniciais todos. Houve falhas no objectivo de aumentar o emprego e de ter uma economia mais forte. E agora que se acrescem mais fundos teremos de ser necessariamente mais bem organizados. É necessário redireccionarmos o investimento e o foco em todas as áreas do quadro que este fundo de emergência vai apoiar”, apelou Pedro Costa, presidente da Coimbra Business School e um dos autores do estudo científico publicado na revista Omega [“Evaluating the efficiency of structural funds: An application in the competitiveness of SMEs across different EU beneficiary region”]. Pedro Costa lamenta que os problemas se mantenham.
O estudo tem co-autoria das investigadoras Maria do Castelo Gouveia e Carla Henriques e usou os valores acumulados até 12 de Dezembro de 2017 — os dados mais recentes para os indicadores de desempenho que foram avaliados. O actual programa comunitário de apoio arrancou em 2014, e em 2017 ia a meio da sua vigência. Mas foi já em Fevereiro deste ano que o Governo assumiu que até àquela data ainda só tinham sido executadas 45% das verbas disponibilizadas pela UE.
Os investigadores da Coimbra Business School (Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra) fizeram uma análise comparativa entre os programas de 16 países da UE e concluíram que apenas seis países são eficientes a executar os fundos estruturais em PME. No caso português, o estudo diz que o país precisa de investir as verbas mais cedo, de aumentar o número de startups apoiadas e de gerar mais postos de trabalhos.
O Reino Unido — que no período analisado ainda integrava a União Europeia — lidera a lista deste estudo na utilização de apoios europeus em programas nacionais e regionais. “Com o ‘Brexit’, a UE deixou de ter como referência o Estado-membro que melhor fazia a gestão dos fundos”, afirma Maria do Castelo Gouveia, matemática, co-autora do estudo.
Áustria, Espanha, Finlândia e Estónia são os países que se seguem no ranking. Portugal fica a meio da tabela, em 7.º lugar. A Letónia, República Checa, Eslovénia, Itália e Polónia ocupam, por esta ordem descendente, as últimas posições.
O estudo por países e regiões analisou cinco indicadores: a percentagem de co-financiamento da UE no financiamento total; o número de startups apoiadas; o número de PME financiadas; o aumento directo do emprego nas empresas apoiadas e a relação entre gasto/custo elegível de cada projecto.
Escassa criação de emprego
Os fundos nacionais mais eficientes são pertencentes, por ordem decrescente de eficiência, à Inglaterra (apoio às empresas inovadoras), Áustria (menor dependência dos fundos estruturais) e Espanha (taxas de execução). Em Portugal o número de empregos criado pelas PME que obtiveram financiamento europeu é inferior a um terço da média europeia, concluíram ainda os académicos.
Entre as empresas das regiões portuguesas analisadas, as dos Açores foram as únicas a conseguirem atingir a classificação “eficiente” — devido ao emprego gerado e à taxa de execução dos projectos. No sentido oposto, as PME das restantes regiões nacionais analisadas — centro, Norte, Alentejo, Algarve e Madeira — tiveram um parecer negativo e foram declaradas “ineficientes”.
“Portugal, à semelhança de outros países europeus, precisa de melhorar em dois planos: desde logo, ao nível das empresas, que não são expeditas nos processos de candidatura, nem ágeis na execução de investimentos financiados a 50%, a 70% ou a 85% a fundo perdido; por outro lado, a carga burocrática e os encargos administrativos impostos pelas autoridades gestoras emperram, em vez estimular, o investimento para tornar os bens e os serviços produzidos em Portugal mais competitivos no mercado global”, sintetiza Pedro Costa.
As conclusões confirmam o chamado “paradoxo europeu”, explicam os estudiosos: são as empresas das regiões mais desenvolvidas que mais cedo, e de forma mais eficiente, aplicam as verbas europeias, invertendo o objectivo das políticas de coesão — a convergência das regiões mais pobres para o nível de riqueza das regiões mais desenvolvidas.
Para a implementação do actual quadro comunitário – o Portugal 2020 – foi concebida uma Estratégia Nacional de Especialização Inteligente, logo em 2014, com os conceitos que deviam nortear a aplicação de fundos comunitários para o desenvolvimento da economia, apoiando a investigação e a inovação das empresas. Mas um relatório de avaliação à implementação dessa estratégia demonstrou que ela tem vindo a ser praticamente ignorada não só pelas empresas, mas também pelas autoridades de gestão.
Os líderes europeus aprovaram esta terça-feira o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) para 2021-2027 de 1,074 biliões de euros e um fundo de recuperação económica de 750 mil milhões. Deste fundo, 390 mil milhões de euros serão atribuídos em subvenções (transferências a fundo perdido) e os restantes 360 mil milhões em forma de empréstimo.
Ao todo, Portugal vai ter verbas para executar de quase 6000 milhões de euros por ano: se se juntar ao novo quadro financeiro e ao fundo de recuperação os últimos quatro anos de execução do quadro financeiro 2014-2020 (que termina em 2023), Portugal poderá receber, durante os próximos dez anos, 57,9 mil milhões de euros em políticas de coesão, PAC e apoio ao sector das pescas.
Esta quarta-feira, num debate no Parlamento Europeu – que esta quinta-feira irá votar a proposta do novo Quadro Financeiro Plurianual, QFP –, a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa apelou a que a sociedade se envolva mais neste processo e a uma simplificação das regras, para acelerar a execução. “Temos lições do passado que não podemos repetir”, disse. E destacou: “No período de um ano poderemos fazer pagamentos a 100%.”