3.2.12

Passos Coelho: "Já estamos pobres. Alguns é que não deram conta disso"

Por Victor Ferreira, in Público on-line

O primeiro-ministro português considera que é obrigatório rever as condições de financiamento do sector privado em Portugal. Por isso defende que, em Fevereiro, quando a troika voltar a avaliar o cumprimento do acordo de assistência financeira, o Governo terá de demonstrar para lá de qualquer dúvida de que é preciso "analisar o cenário macroeconómico com mais realismo" para "evitar uma quebra de financiamento para as empresas privadas".

Numa extensa entrevista publicada nesta sexta-feira no semanário Sol, Pedro Passos Coelho admite que é preciso "alguma flexibilidade para descobrir soluções" que evitem a asfixia da economia. "Há muitas empresas viáveis, nomeadamente na área da exportação, que têm vindo a enfrentar uma restrição de crédito muito activa, o que pode comprometer uma parte do programa" de recuperação das finanças públicas e, sobretudo, da economia. "Espero que neste terceiro exame [ao cumprimento do acordo com a troika, cuja avaliação será feita em Fevereiro] seja mais fácil documentar em concreto essas dificuldades – e encontrar, da parte da troika, alguma flexibilidade para descobrir soluções", refere Passos Coelho.

Este problema, afirma o governante, já tinha sido identificado e posto em cima da mesa na segunda avaliação intercalar. Porém, "não houve capacidade na altura de evidenciar aquilo que é um sentimento generalizado", refere o líder do Executivo, salientando que o problema reside no facto de num fecho demasiado rápido do crédito, conjugado com a necessidade de refinanciar a dívida do sector público sem disponibilidade da banca internacional. "Nós temos uma economia demasiado viciada em crédito (...) e isso não é bom. (...) Se o ritmo dessa desalavancagem do sistema financeiro for muito intenso, numa altura em que estamos (...) a retrair a despesa pública, isso pode tornar-se contraproducente no médio prazo", salienta.

Este problema tornou-se ainda mais sensível porque o pressuposto do programa de saneamento das contas públicas era que o sector empresarial do Estado encontraria na banca internacional apoio para refinanciar a sua dívida. Ora esse mercado está fechado", vinca o primeiro-ministro português, que reitera a ideia que não pretende pedir nem mais tempo nem mais dinheiro para sanear as contas portuguesas, mantendo como objectivo o regresso do país aos mercados financeiros em Setembro de 2013.

Sem crédito internacional, resta às empresas públicas refinanciarem os seus passivos com a banca nacional, refere Passos Coelho. Conclusão: esse crédito "não estará disponível para as empresas privadas", um problema que exige como solução uma maior flexibilidade na aplicação do programa delineado a partir do memorando de entendimento assinado por Portugal, Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional.

Depois de explicar o episódio do "desvio colossal" – expressão usada numa reunião interna do PSD para justificar medidas draconianas como a sobretaxa de IRS equivalente ao corte de 50% do subsídio de Natal dos trabalhadores em 2011 – Passos Coelho elege a correcção da dívida como o objectivo fundamental porque "não há nenhum país que consiga crescer com excesso de dívida". "Não há mais dinheiro para gastar – e portanto temos de adequar as nossas necessidades de financiamento àquilo que somos capazes de produzir. E isso envolve políticas de austeridade e de habituar a sociedade a consumir menos recursos do que aqueles que tem consumido..."

Esta é uma tónica da entrevista porque "pobres já nos estamos", conclui Passos Coelho. "Há é pessoas que ainda não se deram conta disso e continuaram a viver como se não fossem pobres, Viveram não daquilo que tinham mas daquilo que lhes emprestavam". Portanto, "falar de políticas de crescimento em Portugal é, em primeiro lugar, falar da sustentabilidade da própria dívida do Estado, E isso implica um programa de austeridade."