7.7.20

“Temos que repensar as relações de trabalho”

Fátima Ferrão, in Expresso

Projetos Expresso. A crise de 2010 não mudou estruturalmente a relação entre empresários e colaboradores pelo que, acreditam os especialistas, este é o momento. Sem esta mudança, os modelos de trabalho continuarão a ter falhas que não permitem aumentar a produtividade e, consequentemente, os salários. Estas foram algumas das conclusões de mais um debate do ciclo “Parar para Pensar”, desta vez sobre a temática do "Novo Trabalho", que decorreu esta tarde em direto através do Facebook do Expresso

“Temos que encarar a maneira como trabalhamos de uma forma diferente”, afirma Nuno Cavaco, professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa e Partner da Lisbon Consulting Group. Esta é uma das mensagens chave que podemos retirar do debate que juntou, esta tarde, um conjunto de especialistas para discutir o tema do "Novo Trabalho". Que lições trouxe a pandemia? O teletrabalho veio para ficar? Qual o papel das tecnologias neste contexto? Foram algumas das outras questões abordadas nesta conversa, moderada por Marta Atalaya, jornalista da SIC Notícias. Entre os convidados, além de Nuno Cavaco, estiveram António Garcia Pereira, advogado e professor auxiliar no ISEG, Teresa Carla Oliveira, professora na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Pedro Paiva, diretor de Mobilidade Empresarial da Samsung Portugal, e Nadim Habib, professor na Nova SBE. Conheça as outras conclusões: 

Teletrabalho não é para adotar a 100%
“Foi inevitável [a adoção generalizada do teletrabalho] mas exige reflexões profundas”, acredita Teresa Oliveira. A professora salienta a importância de construir relações de trabalho com base na confiança, seja em formato remoto ou presencial, para funcionar. Já na opinião de Pedro Paiva é preciso perceber as diferenças entre a realidade vivida durante estes meses e a realidade conceptual do teletrabalho. “Estar em casa com crianças e ter que acompanhá-las no seu trabalho escolar enquanto se trabalha, não é o modelo habitual de teletrabalho”. António Garcia Pereira acrescenta ainda que há atividades que não podem ser feitas em teletrabalho, e que outras não devem pelas especificidades do negócio. “Temos que avaliar caso a caso”. 

Fomentar momentos de convívio entre trabalhadores para garantir valores como a camaradagem e o envolvimento com o projeto, e para manter a identidade é, na opinião de Nuno Cavaco, essencial mesmo com as equipas em teletrabalho. “Webinares sobre temas que não sejam de negócio, organizar uma happy hour ao final do dia são alguns exemplos de como é possível motivar e fomentar a sensação de pertença, mesmo que online”. 

Patrões têm que criar condições de trabalho
Quase metade dos trabalhadores que ficaram em teletrabalho durante a pandemia não tiveram acesso a equipamentos fornecidos pelos empregadores, segundo um estudo citado por Pedro Paiva. Um outro estudo da Regus, referido por António Garcia Pereira, concluiu que 71% dos trabalhadores inquiridos suportaram todos os custos com o teletrabalho durante o confinamento. Uma realidade que, acreditam ambos, tem que ser amplamente debatida e revertida. “É preciso que os colaboradores sintam que o teletrabalho é um benefício com justiça”, acrescenta Nadim Habib que, reforça: “Temos que reimaginar o trabalho”. 

Adquirir tecnologia tem que ser visto como um investimento e não um custo. “É preciso garantir a segurança e privacidade do trabalhador e da informação de negócio”, afirma Pedro Paiva. O representante da Samsung destaca, a este propósito, três vetores que não podem ser esquecidos pelas empresas ao colocar as equipas em trabalho remoto. Fornecer equipamentos com capacidade produtiva, assegurar a sua segurança e gestão, e formar todos os colaboradores para que tirem partido das ferramentas de trabalho. 

Direitos dos trabalhadores têm que ser salvaguardados
Para Garcia Pereira, os empresários estão, em geral, satisfeitos com os resultados deste período de teletrabalho imposto pela covid-19. As principais razões passam pela redução de custos e pela extensão do horário de trabalho (colaboradores sempre ligados e disponíveis). “É fundamental introduzir o direito à desconexão”, salienta. Teresa Oliveira acrescenta que a contratualização neste regime pode ser pensada com horário ou por objetivos, mas as regras têm que ser definidas desde o início. “O trabalho, seja em que moldes for, tem que garantir qualidade de vida ao trabalhador”. Já Nadim Habib defende que a covid-19 veio obrigar a repensar toda a relação de trabalho.