7.7.20

Onde estão os quartos mais baratos? Preço do alojamento universitário desceu em Lisboa, Porto e Braga

Nuno Rafael Gomes, in Público on-line

Plataforma lançada este sábado resulta de uma parceria entre o Ministério do Ensino Superior, a DGES e uma startup portuguesa. Apesar de “importante”, dirigentes académicos alertam: o Observatório do Alojamento Estudantil “não vem responder às necessidades” dos estudantes.
Entre Outubro de 2019 e o início de Julho de 2020, o preço médio do alojamento universitário nos concelhos de Braga, Porto e Lisboa desceu. Arrendar um quarto para estudar na capital ficou mais barato 32 euros; no Porto, o decréscimo foi de 29 euros. E mais visível foi a redução em Braga, com uma queda no valor médio de 73 euros. Por outro lado, na Covilhã, o valor é o mesmo num e noutro mês (apesar de algumas variações ao longo dos últimos meses): 145 euros. Mais abaixo, em Évora, os preços só começaram a cair a partir de Janeiro. Estas são algumas das conclusões que, a partir deste sábado, 4 de Julho, poderão ser retiradas do Observatório do Alojamento Estudantil. A plataforma, aberta a todos, resulta da parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES) e a Alfredo Real Estate Analytics, uma startup portuguesa que, através da inteligência artificial e big data, se debruça sobre o mercado imobiliário.

Com o Observatório do Alojamento Estudantil, o primeiro do género a nível europeu, procura-se “ajudar os alunos na escolha do quarto”, diz Gonçalo Abreu, da startup. Não é um site com anúncios, antes “uma congregação de dados de oferta pública e privada para potenciar o máximo de informação”. “E, assim, os alunos podem tomar uma decisão factual e informada”, acrescenta. Há uma série de dados que pode ajudar nessa escolha: para além dos preços mínimo, médio e máximo por concelho e freguesia, também é possível observar a evolução do corpo estudantil do sítio onde se escolhe estudar. E caso a curiosidade aguce, também se pode perceber como tem evoluído a população residente. O site conta com “todos os quartos disponíveis online”, sendo que há um “tratamento estatístico em todas as freguesias e concelhos”, refere João Januário, da mesma empresa, que tem vindo a desenvolver a plataforma “ao longo do último ano e meio”.

Para a recolha diária de dados da oferta privada entram nas contas 22 plataformas (como portais imobiliários) de acesso público. Destas, foram analisados, até agora, 13.541 quartos, espalhados “por 163 concelhos e 452 freguesias”, confirma Gonçalo Abreu. Àquele número de quartos juntam-se outros 15 mil, mas desta vez das residências estudantis públicas. E o que acontece quando o mesmo quarto está anunciado em duas plataformas diferentes? “Não contabilizamos duas vezes. Temos um processo que consegue percebê-lo, através da análise de preço e imagem”, responde. “Valores atípicos” — quando o preço anunciado “é muito alto ou baixo” ou quando “a oferta é mal introduzida” — também são automaticamente eliminados.
“Tapar o sol com a peneira”

Interpretar a descida observada nestes preços com uma eventual influência da pandemia de covid-19 é algo que a startup prefere deixar “para os utilizadores”. Para Ricardo Nora, presidente da Associação de Estudantes da Universidade da Beira Interior (UBI), “ainda é cedo” para se desenharem conclusões desse impacto. Ainda assim, concorda que o preço médio observado corresponda ao apontado pela plataforma.

Mas, em Guimarães e em Braga, os preços não estão, “de todo, a baixar”, afirma o presidente da Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM). Os dados do observatório indicam que no concelho bracarense, com um total de 267 quartos disponíveis, o preço médio é de 222 euros, mas o valor máximo pode chegar aos 350 euros. Rui Oliveira diz mesmo que os preços estão “um pouco mais altos para a altura do ano”, quando as actividades estudantis cessam. Por sua vez, a Federação Académica do Porto (FAP) salienta que o Observatório do Alojamento Estudantil “tira alguns dados, mas não todos”, frisando ainda “a preocupação com o mercado informal”, que não entra nas contas e que, por isso, poderá esconder o panorama real da habitação estudantil. Marcos Alves Teixeira, presidente da FAP, esperava “um arrefecimento do mercado” devido à pandemia, que diz não observar: “Seria uma falsa esperança dizer que as coisas estão a melhorar”. No Porto, em 1788 quartos, a média é de 272 euros; o valor máximo é de 426 euros e o mínimo, de 161 euros.

Para os três dirigentes académicos, a plataforma cumpre a sua função, ainda que haja problemas maiores por resolver. “Tem um âmbito estatístico interessante, mas não vem responder à necessidade”, diz Rui Oliveira. Para além disso, como refere Ricardo Nora, “as próprias universidades já faziam esse levantamento”. “É curioso estarmos a falar de alojamento e de como os estudantes podem escolher. Mas é tapar o sol com a peneira. A plataforma ajuda na escolha, mas esquecemo-nos do número de camas anunciadas prometidas”, comenta.


Marcos Alves Teixeira partilha da opinião: “Isto não pode ser uma resposta ao problema. É importante e positivo, mas é preciso construir camas. E o Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior [PNAES] tem falhado redondamente, pelo menos para o Porto.” E, perspectiva o presidente da FAP, “prevê-se que diminua o número de camas nos próximos tempos”: outro dos impactos da pandemia, já que quartos partilhados nas residências poderão deixar de o ser, por questões sanitárias.

Essa questão também preocupa José Pinheiro, presidente da Associação Académica da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (AAUTAD): “O alojamento público já era baixo. Agora, e mais do que nunca, é importante haver uma indicação por parte da tutela face ao problema da pandemia”, começa por explicar. Em Vila Real, onde se situa a UTAD, há “530 camas para 5 mil estudantes deslocados”. “Se houver restrições” devido ao vírus, a oferta pública (e, em princípio, mais em conta) diminuirá; logo, “com a crise financeira e a fragilidade económica das famílias”, este passa a ser outro problema a somar à crise no alojamento estudantil. Por isso, o presidente da AAUTAD opina que “o esforço dado [pelo ministério] continua a não ser para o objectivo principal, que é criar mais alojamento”.