Jorge Heitor, in Jornal Público
Violência alastrou já a sete das nove províncias sul-africanas e causou pelo menos 42 mortes e 25 mil desalojados
A situação era ontem mais calma em Joanesburgo mas a decisão de destacar forças do Exército para os subúrbios foi materializada, pela primeira vez desde o apartheid, e os ataques contra estrangeiros alastraram à zona da Cidade do Cabo, segunda maior cidade e centro turístico do país.
O chefe dos serviços secretos sul-africanos, Manala Manzini, declarou ontem à Reuters que pessoas ligadas às antigas forças de segurança do apartheid estão por trás da violência que nos últimos 13 dias já matou pelo menos 42 estrangeiros e levou o Exército a intervir, depois de a polícia se ter mostrado incapaz de controlar a situação. "Existe um esforço deliberado, orquestrado, bem planeado. Temos informações de que elementos envolvidos na violência anterior às eleições de 1994 são os mesmos que reataram contactos com pessoas que usaram no passado", disse Manzini, segundo o qual parte da violência iniciada na área de Joanesburgo emanou de albergues para trabalhadores que servem de residência a zulus.
Grande parte da violência dos últimos anos do apartheid, agora comparada à que nas duas últimas semanas já levou mais de 25 mil pessoas a deixar as suas casas, abrangeu confrontos entre partidários do Inkatha, do chefe tradicional Gatsha Buthelezi, e do Congresso Nacional Africano (ANC), maioritário, sucessivamente dirigido desde então por Mandela, Thabo Mbeki e Jacob Zuma.
"Algumas pessoas do Partido Inkatha da Liberdade (IFP) poderão estar a ser utilizadas", afirmou o chefe dos serviços secretos, numa altura em que os ataques xenófobos alastravam a um total de sete das nove províncias do país e em que os chefes de Estado africanos reunidos na Tanzânia se diziam verdadeiramente chocados com uma situação que está a afectar imigrantes moçambicanos, zimbabweanos, nigerianos, somalis e de outras nacionalidades. Duas centenas de pessoas foram detidas nas últimas 24 horas por terem procedido a saques e estarem na posse de mercadorias roubadas, nesta aparente vaga de culpabilização dos estrangeiros pelos quase 40 por cento de desemprego no país.
Minas afectadas
Os sindicatos e empresas mineiras anunciaram que as minas de ouro da região de Joanesburgo, coração económico do país, foram afectadas por esta violência, depois de vários trabalhadores não terem aparecido ao serviço, com receio de serem atacados. O caos e o terror chegaram na quinta-feira à noite ao Cabo, com centenas de estrangeiros em pânico a procurar ficar em segurança, enquanto uma série de lojas de somalis eram atacadas e por vezes incendiadas.
"O Governo deve reconhecer que falhou", comentou a líder da Aliança Democrática (DA), na oposição, Helen Zille, segundo a qual, se não forem tomadas medidas muito enérgicas, o panorama destes últimos dias poderá ser apenas uma amostra de coisas muito piores que estarão no horizonte.