Alexandra Marques, in Jornal de Notícias
Cabaz de compras representa quase metade das despesas fixas das misericórdias, uma parcela impossível de ser reduzida, tendo em conta o apoio social que presta
A inflação real para a Santa Casa da Misericórdia foi, em 2007, de 5,6%, mais do dobro dos 2,5% da taxa de inflação definida pelo Estado, com base na qual as comparticipações públicas foram estabelecidas. A "agroflação (a subida de preço dos bens alimentares) é a grande responsável pela subida de preços", assinala o mais recente estudo da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), a que o JN teve acesso.
No relatório, concluído a 28 de Abril, a UMP diz que a actualização anual das comparticipações do Estado segundo a taxa de inflação calculada pelo Estado para o ano seguinte "não atende às especificidades do trabalho das instituições". Pelo que reclama um novo sistema de financiamento deste sector da acção social, que permita a subida das comparticipações para valores que permitam compensar os aumentos de preços dos bens de primeira necessidade.
Constituindo 46% das despesas mensais das instituições que são tuteladas pela UMP, "a classe da alimentação e bebidas não- -alcoólicas foi a que mais inflacionou". Principalmente, na Região Norte e no Alentejo.
"Os bens e serviços mais críticos foram o pão, com uma variação média nacional de 5,5%, e os lacticínios com um aumento anual de 6%", assinala o documento da Comissão de Análise da Taxa de Inflação Social da UMP.
O sinal de alarme tem justificação é que se trata de produtos que não podem ser substituídos por outros na alimentação dos utentes dos lares, centros de dia, unidades de cuidados continuados e creches. Um cenário preocupante, sobretudo quando a crise alimentar deste ano ainda não está reflectida no relatório - o que faz prever um problema maior ainda este ano.
Neste cabaz dos maiores gastos domésticos dominado pela alimentação, figuram igualmente os custos energéticos - água, gás, electricidade - com os transportes ,"que assumem um valor preponderante", revelou ainda, ao JN, Carlos Andrade, da União de Misericórdias Portuguesas.
UMP exige respeito
Nessa classe, a maior inflação ocorreu com o gasóleo, "com um aumento de 2,52%, e a gasolina com uma variação média de 4%". Um acréscimo superado contudo pelo preço da "resma de papel - que teve um aumento na ordem dos 9%". A inflação mais elevada registou-se no Norte, Alentejo e Algarve.
"O objectivo foi calcular a inflação no sector da acção social, com base no conjunto de produtos que é analisado anualmente segundo regras de cálculo estandardizadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)", explicou, ao JN, Carlos Andrade. Com esse propósito, foram escolhidas 25 das 382 misericórdias existentes no país.
Nas conclusões do relatório, a UMP exige ao Governo ser tratada como "parceiro credível, que deve ser respeitado e considerado" e pede "que se ajustem medidas e conceitos" devido às "necessidades específicas" das santas casas "que não devem ser ignoradas nem sequer subestimadas pelo Estado".
Urgente é, segundo refere o texto, que se configure um novo regime de financiamento, dando um estatuto especial a estas instituições "enquanto prestadores (tantas vezes únicos) das respostas aos diversos problemas sociais existentes".