23.5.08

Novo relatório mostra que Portugal continua a ser o país com mais desigualdades entre a União Europeia a 25

Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

Quase um milhão de pessoas vive com menos de dez euros por dia, 230 mil
com menos de cinco euros


Há oito anos, o índice de desigualdade social português rondava os 37, numa escala de 0 a 100 (em que 0 implica uma igualdade perfeita e 100 a concentração máxima do rendimento; quanto mais alto o coeficiente, maior a desigualdade). Em 2004, agravou-se para 41, nota o relatório A Situação Social da União Europeia 2007, ontem divulgado pela Comissão Europeia. Tanto em 2000 como 2004, o valor português era o mais alto entre a União Europeia a 25.

O documento afiança que o rendimento é distribuído de forma mais equitativa na UE que nos Estados Unidos. Recorre a dados de 2000 para estimar um coeficiente de Gini de 32,7 na Europa a 25 e de 35,7 nos EUA. E aponta Portugal como "o único" Estado-membro que supera os EUA, a Polónia, a Lituânia e a Letónia como países com níveis de desigualdade equivalentes.

Os números têm de ser vistos com cautela. Há diversos modos de os aferir. Se atendermos ao dados mais recentes da CIA, a agência de informação norte-americana, por exemplo, encontramos dados relativos a 2007 que atribuem um índice de Gini de 45 aos EUA e de 38 a Portugal.

Os números de 2004 foram corrigidos "em baixa" pelo Eurostat, explicou à agência Lusa Pedro Marques, secretário de Estado da Segurança Social. A realidade nacional estará mais próxima do que revela a CIA do aquela que é apresentada pelo relatório da Comissão Europeia.

Mesmo revisto em baixa, o coeficiente de Gini em Portugal continua a ser o mais elevado da UE a 25. Dentro da União, a maior igualdade pode ser encontrada nos países nórdicos, com destaque para a Suécia e a Dinamarca Poderá não haver correlação entre a igualdade de rendimentos e o nível de resultados económicos. Se forem, porém, comparados os coeficientes de igualdade de rendimentos dos Estados-membros com o respectivo PIB (Produto Interno Bruto) por habitante constata-se que os países com um PIB mais elevado são, na sua generalidade, os mais igualitários.
Reduzir a igualdade "não significa, automaticamente, aumentar a performance económica", avisa o relatório. Se pessoas tiverem "mais acesso a oportunidades e puderem desenvolver o seu potencial produtivo total", todavia, reduzir-se-á a desigualdade social e, ao mesmo tempo, possibilitar-se-á um desempenho económico mais forte.

O documento lembra, por exemplo, que filhos de pessoas com elevada escolaridade têm quatro vezes mais probabilidades de alcançar uma educação elevada do que os filhos de pessoas com baixa escolaridade. E "elevados níveis de educação estão, claro, associados a altos níveis de rendimentos e menor risco de desemprego".

Em 2004, cem milhões de europeus tinham menos de 60 por cento do rendimento médio da UE, que era oito mil euros por ano ou 22 euros por dia por pessoa. Em Portugal, havia 957 mil pessoas a viver com dez euros por dia, das quais 230,8 mil com menos de cinco euros.

O risco de pobreza afecta de forma particular as crianças com um contexto migratório. Filhos de pessoas nascidas fora da União Europeia têm duas vezes mais hipóteses de crescer na pobreza.

Isto limita as suas oportunidades. "As crianças de contextos migratórios ou de minorias étnicas somam desvantagens: grande parte cresce em lares com baixos níveis de escolaridade e baixos rendimentos. A língua e as diferenças culturais constituem barreiras acrescidas para aceder às oportunidades nos países de acolhimento, refere o relatório ontem divulgado pela Comissão Europeia. "Ultrapassar estes obstáculos está a tornar-se um dos maiores desafios à medida que a diversidade cresce no seio dos Estados-membros."

Estima-se que 5,5 por cento dos menores de 16 anos residentes na União encaixem naquele perfil. Isto representa mais de quatro milhões de pessoas: 40 por cento correm risco de pobreza (pertencem a famílias com um rendimento inferior a 60 por cento da média europeia).