Helena Norte, in Jornal de Notícias
Fome atinge cerca de 800 milhões de pessoas a cada 3,6 segundos há uma morte por desnutrição
Portugal é dos países da Europa menos solidários. Entre os 15 membros mais antigos da União Europeia, apenas a Grécia contribuiu menos do que Portugal para acabar com a pobreza no Mundo. Pelo segundo ano consecutivo, Portugal diminuiu a ajuda financeira aos países em desenvolvimento - 0.19% do Produto Interno Bruto (PIB), muito abaixo da meta assumida pela UE de 0.33%.
O relatório de avaliação da Ajuda Pública ao Desenvolvimento, da responsabilidade da Concord - Confederação Europeia das Plataformas Nacionais de ONGD (organizações não governamentais de desenvolvimento), é demolidor. A Europa está a falhar no compromisso de minorar a pobreza. E pior do que isso ainda faz uma camuflagem da ajuda real, ao integrar, nesse capítulo, outros itens, como o perdão de dívidas ou a assistência a refugiados, que não constituem apoios directos às populações desfavorecidas.
O objectivo traçado pela UE - dedicar, até 2010, 0,51% do PIB à ajuda ao desenvolvimento - não vai ser atingido, a não ser que haja uma rápida e expressiva inversão das prioridades dos governos. No ano passado, a Europa fechou, ainda mais, os cordões à bolsa e consagrou apenas 0.38% do PIB (tinham sido 0,41% em 2006) ao desenvolvimento. O que se traduz, em valores absolutos, em menos 1,5 mil milhões de euros. Ou, numa leitura que vai além da frieza dos números, em milhares vidas que não foram salvas, alerta a Concord no relatório "AidWatch", que hoje vai ser apresentado em Bruxelas.
Analisando, país a país, os valores atribuídos à ajuda ao desenvolvimento, verifica-se que apenas nove aumentaram a sua contribuição. Suécia, Luxemburgo, Dinamarca e Holanda são os únicos Estados-membros cujas contribuições já se situam acima da meta de 2015 (0,7% do PIB), sendo que a Irlanda também já ultrapassou o limiar dos 0,51%.
Olhando para a Europa dos Quinze, os países que apresentam índices mais baixos de solidariedade são a Grécia, Portugal, Itália, o Reino Unido e a Alemanha , de acordo com as contas feitas pela confederação que integra as plataformas nacionais representantes de cerca de 1600 organizações não-governamentais de desenvolvimento da Europa .
Portugal está entre as 18 nações que mantiveram ou diminuíram a ajuda às regiões países mais pobres do planeta. Mesmo tendo como referência o já modesto desempenho de 2006, o apoio concedido no ano passado é inferior e representa a contribuição mais baixa desde que Portugal é membro da OCDE.
Com base neste cenário, a Concord considera ser pouco provável que Portugal honre os compromissos que assumiu.
O relatório alerta também para a a hipocrisia dos governos, que manipulam os números para camuflar a ajuda real à pobreza, integrando itens que não constituem apoio directo às populações mais desfavorecidas, como o perdão de dívidas, a educação de estudantes refugiados e a assistência a refugiados. Somando estas verbas, representam quase 20% do total da ajuda financeira declarada.
E para quem ainda pensa que o auxílio aos países em desenvolvimento é "apenas" um dever moral, basta recordar os recentes protestos por comida, em vários pontos do Mundo, para compreender que as profundas desigualdades sociais são uma ameaça à paz global. Porque enquanto nós - europeus - andamos aflitos com o aumento da gasolina, para grande parte da humanidade, a verdadeira preocupação é conseguir um prato de comida e um copo de água potável.