Secundino Cunha, in Correio da Manhã
A Igreja Católica está preocupada com o impacto que a escalada de preços dos combustíveis e dos alimentos está a ter nas famílias portuguesas, sobretudo nas mais pobres.
O assunto foi ontem debatido no Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e os bispos alertaram para o facto de o drama da pobreza e da fome ser 'cada vez mais evidente'.
'Ninguém ignora que há em várias regiões do nosso país um número cada vez maior de famílias com grave carência de alimentos de primeira necessidade', disse o presidente da CEP, D. Jorge Ortiga, referindo que, 'sem alarmismos, cabe à Igreja alertar para este problema, de modo a que se possa combater com celeridade e eficácia'.
O arcebispo de Braga diz que 'dói a alma quando se tem conhecimento de casos de crianças que vão para a escola sem pequeno-almoço, porque os pais não têm o que lhes dar de comer' e alerta as autoridades governamentais para o facto de ser necessário 'apostar numa cada vez melhor distribuição da riqueza'.
De resto, a CEP manifestou 'inteiro apoio' à Caritas, que decidiu utilizar o seu observatório social, criado em 2006, para a monitorização de casos de carência mais grave.
Para além disso, os bispos pedem aos párocos maior 'atenção e acção' em relação aos casos de pobreza extrema que detectem nas suas paróquias, promovendo uma 'partilha de proximidade'.
Entretanto, em algumas dioceses, a Caritas vai abrir sucursais nos concelhos mais populosos.
AJUDA ALIMENTAR CONTA COM MENOS DINHEIRO
O programa de ajuda alimentar conta, este ano, com menos um milhão e meio de euros do que em 2007. No ano passado foram distribuídas 11 mil toneladas de alimentos, no valor de 15,5 milhões de euros, e para este ano a verba prevista é de 14 milhões, menos mil toneladas de alimentos. Segundo o ministro da Agricultura, Jaime Silva, estão programados oito concursos de distribuição de produtos alimentares às organizações não governamentais, cinco já este mês, para massas, cereais, bolachas, farinha e açúcar, e três no mês que vem, para leite e derivados. Apesar da diminuição da verba, o governante assegura que, 'se a rede de apoio for eficaz, não há risco de fome no País'. As organizações creditadas para distribuir alimentos são o Banco Alimentar, a AMI, a Caritas, a Cruz Vermelha, os bombeiros e as Misericórdias. Em 2007, foram ajudadas cem mil famílias, num total de 513 mil pessoas.
DISCURSO DIRECTO
'CLASSE MÉDIA/BAIXA FRAGILIZADA', D. Carlos Azevedo, porta-voz interino da Conferência Episcopal
Correio da Manhã – Que análise faz desta escalada de preços dos combustíveis e dos alimentos?
D. Carlos Azevedo – Trata-se de uma questão muito preocupante que, em nosso entender, vai provocar o empobrecimento dos mais pobres e fragilizar a classe média/baixa, que facilmente resvalará para uma situação de pobreza.
– A Igreja Católica vai fazer algo mais do que alertar para o problema?
– A Igreja está no terreno, conhece os problemas e este em concreto há muito tempo que o combate. O alerta serve para suscitar a reflexão sobre medidas que possam ser tomadas para atenuar os efeitos da crise.
– Para além do trabalho da Caritas, há outros organismos da Igreja a ajudar no combate à pobreza?
– Muitos. As paróquias, por exemplo, e todas as associações que lhes pertencem conhecem os problemas em concreto e realizam um trabalho notável e de grande eficácia.
INDICADORES DE POBREZA
- Está a aumentar o número de crianças que chegam às escolas sem terem tomado o pequeno-almoço e sem nada na mochila para o lanche.
- ACaritas nunca recebeu tantos pedidos de ajuda como agora. Em Braga, por exemplo, vão abrir sucursais nos arciprestados da diocese.
- O aumento da taxa de desemprego e o fecho contínuo de empresas estão a contribuir decisivamente para o agravar da pobreza em Portugal.
- Alguns centros distritais da Segurança Social dizem que tem crescido o número de pessoas a solicitar o rendimento social de inserção.


