10.5.08

Algumas casas recuperadas pela SRU ficam aquém das expectativas dos moradores

Patrícia Carvalho, in Jornal Público

Administrador da Porto Vivo admite que algumas casas poderão ficar sem cozinha
e casa de banho privativa, por causa da fraca capacidade de investimento do proprietário


A Quando a Porto Vivo - Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) exigiu à proprietária do n.º 72, na Praça de Carlos Alberto que fizesse obras de conservação do prédio, os inquilinos abandonaram as suas casas, com a expectativa de regressarem, mais tarde, a um espaço completamente renovado. Agora que as obras se aproximam do fim, Ana Pinto, que arrenda o 2.º piso, sente-se desalentada. "Vou ficar a pagar uma renda tão grande e a casa nem banheira tem. Pensei que ia ficar com uma casa de banho em condições, mas continua lá um cubículo", diz.

Na SRU, Rui Quelhas, do conselho de administração, admite que uma intervenção ideal nem sempre se consegue, face a diversos constrangimentos e avisa que no centro histórico a situação pode ser pior. "Há por aí muitas situações deste género: imagine um prédio com cinco inquilinos que partilham apenas uma cozinha e uma casa de banho. O ideal seria que cada um tivesse acesso a estas facilidades individualmente, mas, se calhar, só poderemos fazer duas cozinhas e duas casas de banho para partilhar por todos", admite.

A culpa, explica Rui Quelhas, é da (pouca) capacidade de investimento dos proprietários, assim como das rendas que os inquilinos poderão ficar a pagar depois das obras - e que reflectirão necessariamente a intervenção feita. "Há por aí muitas situações parecidas com este exemplo que lhe dei. É óbvio que aquela não é a melhor solução, mas também é preciso haver algum bom senso. A alternativa seria manter as coisas como estão, e isso não é possível. Ou então fazer uma intervenção profunda, mas onde, no final, já não cabem cinco famílias, mas só duas. As outras três iriam para o meio da rua", diz.

No caso do prédio onde habita Ana Pinto, não está em causa a falta de espaço, mas a própria estrutura do prédio. A proprietária foi intimada pela SRU a fazer obras de conservação, tendo conseguido, para tal, um apoio do programa RECRIA, no valor de 40 por cento do total do investimento. E, por serem obras de conservação ("onde temos que nos cingir à situação existente e à vontade da proprietária", explica Quelhas), a casa de banho minúscula de Ana Pinto, onde apenas cabe uma sanita e um lavatório, "cumpre todos os requisitos legais", garante o responsável da SRU. Mesmo que não tenha banheira ou polibain e que a alternativa apresentada aos moradores do 2.º e 3.º pisos seja a colocação de um chuveiro, de onde a água escorrerá para o chão. Confrontado com esta situação, Rui Quelhas garante que talvez seja ainda possível proceder a alguma alteração. Mas qualquer mudança terá que ser negociada com a proprietária, que poderá ou não aceitar a sugestão da SRU. "De qualquer maneira, penso que seria muito mau resumirmos a reabilitação de um quarteirão a uma casa de banho", desabafa.

Nos casos mais graves do centro histórico, onde as ilhas privadas continuam a ser um problema e onde "há pessoas a viver em vãos de escada", como descreve Ricardo Ferreira, responsável pelas obras da SRU, tudo se complica. Rui Quelhas repete que soluções em que diferentes inquilinos terão que partilhar cozinhas e casas de banho "poderão acontecer algumas vezes", apesar de ainda não ter sido tomada uma decisão "sobre muitos casos".

O problema, diz, "é ter que decidir sobre uma coisa em que tudo está mal". "Pelo menos garantimos condições mínimas de segurança e salubridade", conclui.
Na Carlos Alberto, as previsões são para que as obras estejam concluídas até ao fim do Verão. Ana poderá regressar, deixando o lar provisório num bairro camarário. À porta de casa, não se conforma: "Se pudesse, embargava a obra, mas é tão caro."