23.6.08

Peso dos combustíveis no orçamento dos portugueses é o segundo maior da UE

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

Só os italianos gastam mais dinheiro em combustíveis. Em contrapartida, a despesa com transportes públicos em Portugal é inferior à média europeia


A Portugal é o segundo país da União Europeia (UE) onde as famílias consomem uma maior parte do seu rendimento com combustíveis para o automóvel, o que as torna ainda mais vulneráveis à recente subida de preços registada nos mercados internacionais de energia.

De acordo com os dados publicados na semana passada pelo gabinete estatístico da União Europeia, Eurostat, os portugueses deixaram, em média, durante o ano de 2005, 5,2 por cento do seu orçamento familiar para abastecer o depósito do automóvel. Este é um valor que fica muito acima da média da União Europeia, que não vai além dos 3,3 por cento. De resto, neste capítulo, os portugueses apenas são superados pelos italianos, que no mesmo ano (2005) reservaram 5,7 por cento do seu rendimento para gastos com gasóleo e gasolina.

Na vizinha Espanha, o gasto médio com combustíveis é de 3,8 por cento, enquanto na Bulgária, o Estado-membro onde as famílias gastam uma menor parte do seu rendimento com este bem, o valor não vai além de 2,1 por cento.

Os dados recolhidos pelo Eurostat junto dos vários institutos nacionais de estatísticas apenas são referentes a 2005. Tendo em conta a escalada dos preços dos combustíveis que se tem verificado em todos os países nos últimos dois anos, é natural que actualmente, mesmo havendo uma redução do consumo, o peso das despesas com estes produtos nos orçamentos dos europeus tenha aumentado substancialmente.

O hábito de usar carro

Com ou sem aumento de preços, a verdade é que, em Portugal, o agravamento da factura destes bens energéticos no orçamento familiar já se vem fazendo sentir de forma regular, pelo menos, desde 1988. Nesse ano, revela o Eurostat, o peso dos combustíveis na despesa era, em média, de 3,2 por cento, subindo depois para 3,5 por cento em 1994 e 3,7 por cento em 1999. Durante todo este período, Portugal acompanhou de perto a média europeia, sem nunca a ultrapassar. Contudo, a partir de 1999, este indicador disparou em Portugal, em contra-ciclo com a diminuição que se verificou na Europa.

São várias as explicações possíveis para esta evolução e uma das hipóteses está relacionada com o preço dos combustíveis praticado no país. Comparando com a totalidade da União Europeia, os valores cobrados em Portugal na gasolina e no gasóleo estão muito próximos da média, mas, uma vez que o rendimento das famílias portuguesas é substancialmente inferior, é natural que, utilizando as mesmas quantidades de combustível, o seu peso no orçamento seja maior. Ainda assim, em vários países do alargamento, que têm um nível de rendimento mais baixo do que Portugal, as famílias adaptaram os hábitos de consumo por forma a que o peso dos combustíveis na estrutura do seu orçamento não fosse demasiado elevado.

E, de facto, outra explicação para o resultado português pode ser uma excessiva utilização do automóvel particular como meio de transporte, quando comparado com o que acontece noutros países da Europa. Quando se verifica qual o peso no orçamento familiar das despesas com transportes públicos (a principal alternativa para diminuir a factura dos combustíveis), Portugal, com 1,3 por cento, não só não tem registado qualquer tipo de subida face aos anos anteriores, como fica atrás de países como a França ou o Reino Unido. Quanto à média europeia, está situada em 1,4 por cento.

O entusiasmo vivido pelos portugueses na sequência da entrada na moeda única europeia e da descida das taxas de juro, que permitiu a muitas famílias a aquisição de automóveis através de crédito (tornando-se vulgar a existência de mais do que um veículo por agregado), deverá ter contribuído para que, entre 1999 e 2005, se tenha verificado um comportamento tão diferente em Portugal face ao resto da Europa na evolução do peso da despesa com combustíveis. Aliás, no ano de 1999, Portugal destacou-se de muitos dos seus congéneres europeus, figurando como o terceiro país da Europa em que as famílias consumiram uma maior parte do seu orçamento na aquisição de automóveis.