31.7.08

29 mortes por violência doméstica desde o início do ano

Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

A filha de seis anos viu tudo. A mãe foi alvejada com dois tiros de caçadeira às 18h40 de anteontem, mesmo à porta do café-restaurante Mirario, na Maia. A Polícia Judiciária deteve o ex-companheiro, um serralheiro de 39 anos.O Observatório de Mulheres Assassinadas, projecto da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), já contabilizou 29 mortes desde o início deste ano. Ao longo de todo o ano de 2007, contou 21 mulheres assassinadas por homens com quem mantinham ou tinham mantido uma relação íntima e três vítimas associadas. Já em Abril, a UMAR lançara o alerta. "Há que garantir um atendimento eficaz às vítimas que englobe uma atenção completa ao problema vivido pelas mulheres e pelas suas famílias e o apoio necessário para que reorganizem as suas vidas", salientava Maria José Magalhães. O número peca por defeito. Estes são os homicídios noticiados pelos jornais nacionais. Ora, nem todos os homicídios são objecto de notícia. E alguns dos noticiados como homicídios tentados podem acabar por se tornar consumados.

Não é por acaso que a organização não governamental recorre a este género de fonte. A estatística oficial não atende às relações existentes entre a vítima e o agressor. A estatística oficial acompanha o sistema legal, que tipifica o homicídio em função da gravidade e do dolo (simples, qualificado, privilegiado, negligente e tentado).

O ano passado houve menos mortes do que em 2005 ou em 2006, mas houve mais tentativas de homicídio, nota Elisabete Brasil, também dirigente da UMAR. Uma coisa compensou a outra. Por isso mesmo, aquela organização feminista optou por não fazer um grande alarido com a quebra. Até domingo, a associada a quem cabe fazer a revista de imprensa já tinha coligido 27 mortes - 25 mulheres e duas vítimas associadas. Esta semana, mesmo de férias, já coligiu outras duas. A última foi a de Raquel, a rapariga da Nogueira, Maia.

Raquel tinha 29 anos. À revelia do ex-companheiro, ia pegar na filha resultante de outro relacionamento e recomeçar a vida na Suíça. No alerta de Abril, Maria José Magalhães explicou que um dos motivos que se escondem atrás destes números "preocupantes" está patente numa frase muitas vezes repetida: "Se não és minha, não és de ninguém." "Concebem a mulher como propriedade", esclareceu.