22.7.08

Abrandamento económico trava impostos e ameaça défice

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

Meio ano de orçamento mostra menos impostos e mais despesa corrente. A Segurança Social e as receitas extraordinárias ajudam

O abrandamento da economia portuguesa, que forçou o Governo e o Banco de Portugal a reverem as suas estimativas de crescimento, já está também a afectar o ritmo de cobrança de impostos, colocando em causa os objectivos definidos no Orçamento do Estado (OE) para 2008.

De acordo com o boletim de execução orçamental publicado ontem pela Direcção-Geral do Orçamento (DGO), a receita fiscal cresceu 2,4 por cento durante a primeira metade deste ano, um valor que fica abaixo dos 3,8 por cento previstos no OE.

Em especial, nota-se um ritmo de cobrança bastante lento ao nível dos impostos sobre o consumo, aqueles que sofrem de forma imediata com o abrandamento da economia. Até Junho, o IVA cresceu 5,5 por cento face a igual período do ano anterior, tornando muito difícil de alcançar o objectivo de aumento da receita de 8 por cento traçado inicialmente pelo Governo. Até porque, como refere o próprio boletim da DGO, a receita do IVA "deverá desacelerar no segundo semestre" devido à redução da taxa máxima de 21 para 20 por cento a partir de Julho.

Deste modo, optando pelo optimismo e assumindo que o IVA mantém um crescimento de 5,5 por cento no final do ano, já se pode estar perante uma perda de receita face ao previsto próxima de 320 milhões de euros, ou seja, cerca de 0,2 por cento do PIB.

No imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP), os resultados também preocupam. O consumo de combustíveis tem vindo a diminuir, devido à subida do preço, e isso faz com que, mesmo incluindo a Contribuição de Serviço Rodoviário (que é receita das Estradas de Portugal), a receita registe uma quebra de dois por cento. O Governo estava a contar com um aumento de seis por cento.

No imposto sobre veículos e no imposto sobre o tabaco, as quebras face ao previsto são ainda mais fortes, com reduções da receita superiores a 20 por cento. No que diz respeito ao tabaco, no entanto, parte da descida está relacionada com o comportamento excepcional do imposto no primeiro mês de 2007.

A quebra nos impostos sobre o consumo acaba por não ser surpreendente. O indicador coincidente do consumo privado calculado pelo Banco de Portugal tem vindo a cair sem interrupção desde a segunda metade do ano passado. O IRS e o IRC, que, por serem referentes aos rendimentos do ano passado, dependem menos da evolução da conjuntura, têm conseguido compensar apenas em parte as perdas nos outros impostos, superando os objectivos do Governo. No entanto, é esperado um abrandamento do IRC na segunda metade do ano.

Despesa corrente não ajudaPerante as dificuldades ao nível da receita, o Governo conta com outras ajudas, que servem para minimizar o impacto no défice. Em primeiro lugar, uma receita extraordinária: a EDP pagou ao Estado cerca de 400 milhões de euros pela transmissão de direitos de utilização do domínio hídrico. Depois, o aumento dos dividendos pagos pelas entidades com participação estatal. De igual modo, a execução na Segurança Social continua a surpreender pela positiva, como aconteceu em anos anteriores, com as contribuições a superar as expectativas. Por fim, a redução da despesa de capital do subsector Estado em quase um quarto, mostrando que pode ser mais uma vez pela via do corte no investimento que chegam as poupanças.

O problema é que, do lado da despesa corrente do subsector Estado, os resultados também não são brilhantes. A despesa corrente primária, o indicador mais utilizado para medir a capacidade de contenção orçamental, registou uma subida na primeira metade do ano de 3,6 por cento, ultrapassando os 2,6 por cento previstos no OE. Contribuiu para este resultado a subida de 1,1 por cento da despesa com pessoal (0,1 por cento no OE) e o aumento da despesa com aquisição de bens e serviços de 13,1 por cento, quando era esperada uma redução de 2,2 por cento.

Os resultados ontem divulgados são todos na óptica da contabilidade pública e não da contabilidade nacional, o método utilizado para calcular o défice apresentado a Bruxelas.