Hugo Silva, in Jornal de Notícias
Manuel Correia Fernandes, professor catedrático da Faculdade de Arquitectura do Porto, não tem dúvidas: mais do que as questões urbanísticas, são as questões sociais que estão na origem dos problemas nos bairros municipais.
Os problemas nos bairros de Lisboa e o anúncio da demolição do Aleixo, no Porto, voltaram a colocar na ribalta a habitação social. Correia Fernandes lembra a importância do diálogo com os moradores.
Ainda assim, Manuel Correia Fernandes entende que os empreendimentos devem estar abertos à cidade e sublinha a importância dos equipamentos de apoio às populações. Que não devem ser confrontadas com "soluções autocráticas", sem qualquer tipo de diálogo. Correia Fernandes considera ainda que juntar comunidades inteiras de hábitos muito diferentes não é, definitivamente, uma boa estratégia. Poderá ser sinal, até, de uma grande "insensibilidade".
As construções em altura, para habitação social, são potenciadoras de problemas?
À partida sim. Mas, no caso do Aleixo, é preciso termos atenção ao momento particular em que as torres foram construídas. Eram habitações volantes, temporárias, para as pessoas desalojadas da zona da Ribeira/Barredo. As torres são edifícios muito exigentes do ponto de vista dos serviços e de segurança.
Há bairros com blocos baixos, mas também com problemas.
É preciso distinguir duas épocas. Os bairros construídos nas décadas de 50 e 60 são de uma arquitectura pouco durável e de uma construção frágil. Os espaços são exíguos, os serviços reduzidos ao mínimo e as paredes muito fininhas. Depois do 25 de Abril foram feitas algumas correcções. Nos bairros anteriores, só se entrava por um lado e só se saía por outro. Os próprios transportes públicos não circulavam no bairro.
Mas como se pode resolver a situação dos bairros mais problemáticos?
Há bairros que não têm grandes problemas. Mas mesmo naqueles que são mais problemáticos, as situações estão sobretudo ligadas a questões sociais. Questões sociais muito importantes, como desemprego, que depois arrasta uma data de coisas. O que resulta, nestes casos, é a negociação, o diálogo, a organização em torno das associações de moradores, que vão tomando em mãos a missão de resolver alguns problemas. No entanto, há casos de associações que sem o apoio municipal ou da junta de freguesia têm que fechar os seus 'cafézitos' e locais de convívio. Há bairros com condições, mas sem equipamentos. E outros em que se vão fechando alguns os existem. Os moradores não podem ser confrontados com soluções autocráticas.
Mais do que uma questão urbanística, trata-se, então, de uma questão social?
Sim. É claro que os bairros construídos nas décadas de 50 e de 60 precisam de muitos melhoramentos nos edifícios. Mas não chega. Vão parar aos bairros comunidades inteiras com hábitos completamente diferentes. Só quem nunca andou na rua é que não sabe que uma comunidade cigana não tem nada a ver com uma comunidade africana.
Como é tantas vezes dito, será preciso abrir os bairros à cidade, para que deixem de ser guetos, por onde só passam mesmo os moradores...
A cidade tem camadas - horizontal e vertical -, que muitas vezes não se tocam. É preciso criar pontes entre quem está em baixo e em cima, à esquerda e à direita, no meio e no centro. É muito complicado, mas é um trabalho que tem de ser feito. É um processo longo, demorado, não tem resultados imediatos.