Ricardo Garcia, in Jornal Público
Residentes mobilizam-se por melhorias no bairro, depois do tiroteio de há cerca de duas semanas
Moradores da Quinta da Fonte uniram-se ontem para "dar uma pincelada nisso tudo" e esquecer as cenas de violência de há duas semanas, quando as imagens de um tiroteio colocaram aquele bairro social de Loures no centro da actualidade do país. Primeiro, foram as pinceladas nas paredes dos edifícios, nos pontos onde antes estavam frases grafitadas - como "a bófia aqui não entra" -, que se viam por todo o bairro.
Depois, os pincéis deram lugar aos sprays. Em algumas horas, no topo da Avenida José Afonso estava desenhado um mural, em grafitto, com duas grandes faces a simbolizar um negro e um cigano, ao lado de uma frase: "Todos juntos". Muitos jovens atenderam ao convite para participar de mais uma acção da operação Juntos Construímos Mais, que associações locais lançaram na sequência dos confrontos do princípio do mês. Mas não havia ninguém da comunidade cigana. "Foram convidados e os jovens fizeram um apelo na sexta-feira. Se não vieram, foi porque não quiseram", lamenta Paulino Zola, de 24 anos, membro da Associação de Jovens da Apelação e de duas outras organizações locais.
O trabalho começou às dez e meia da manhã e pouco depois das quatro da tarde estava concluído. O seu efeito prático é incerto. Mas o que pretendem jovens como Paulino Zola - que há muito se dedica a actividades comunitárias no bairro - é que a Quinta da Fonte esqueça os episódios mostrados na televisão, que não são inéditos no bairro. "Uma imagem de cinco minutos estragou-nos o trabalho de anos", afirma.
A mediatização daquele tiroteio acabou por inspirar novas acções para a melhoria das condições da Quinta da Fonte. Já há uma comissão de trabalho - germe de uma eventual associação de moradores -, que envolve representantes de diferentes grupos de residentes, embora, novamente, a comunidade cigana não tenha aderido. "Continuamos abertos", afirma Luís Cardoso, membro da comissão.
Cardoso vê uma nova dinâmica na Quinta da Fonte. Muitos moradores antes não circulavam pelas ruas. Ontem, uniram-se no topo da Avenida José Afonso, para ver o mural. "Pela primeira vez, as pessoas começam a subir esta avenida", diz Cardoso.