31.7.08

Crise económica mundial afunda confiança dos europeus

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

A actual queda das expectativas das famílias e empresas da zona euro só tem paralelo com o que aconteceu a seguir aos atentados de 2001

Preços a subir - A taxa de inflação, por causa dos preços dos combustíveis e alimentos, está ao nível mais alto desde que foi criado o euro e retira poder de compra aos consumidores.

Euro mais alto - A apreciação do euro face ao dólar dificulta a vida às exportadoras europeias.

Taxas de juro elevadas - O BCE subiu taxas no início do mês, agravando a factura com juros das famílias europeias e limitando o acesso ao crédito às empresas.

Imobiliário em crise - Em alguns países, como a Espanha e a Irlanda, o mercado imobiliário regista uma quebra abrupta de vendas e preços. As empresas do sector saem penalizadas, o desemprego aumenta e os proprietários das casas sentem-se mais pobres.

Crise financeira persistente - aumentam os sinais de que os problemas no sector financeiro mundial estão ainda longe de ficar resolvidos. mundial a Foi um mês de más notícias para os europeus. O banco central (BCE) subiu as taxas de juro, a inflação continuou a bater recordes e a economia deu sinais de ter registado, no segundo trimestre do ano, a primeira variação do PIB negativa desde que o euro foi criado. Perante este cenário, acaba por não surpreender que a confiança dos consumidores e das empresas europeias tenha caído em Julho ao ritmo mais forte desde os atentados do 11 de Setembro, há quase sete anos.

Os dados foram ontem revelados pela Comissão Europeia. O índice de sentimento económico da zona euro - que mede a avaliação e expectativas das famílias e empresas em relação à situação económica particular e geral - diminuiu de forma brusca de 94,8 pontos em Junho para 89,5 pontos em Julho. É necessário recuar para Outubro de 2001, o mês seguinte aos atentados terroristas em Nova Iorque, para encontrar uma variação negativa mais acentuada. E o valor registado é também o mais baixo desde Março de 2003. A maior parte dos analistas foi surpreendida pela dimensão da descida neste indicador, já que a previsão que era feita, em termos médios, era, segundo a agência Reuters, de um resultado de 93 pontos.

A quebra na confiança foi generalizada. Foi sentida, não só entre os consumidores, mas também pelos empresários dos quatro sectores de actividade analisados: comércio a retalho, indústria, construção e serviços. As famílias e empresas mostraram mais preocupação em relação ao que se irá passar nos próximos 12 meses, mas fizeram também uma avaliação mais negativa daquilo que aconteceu durante os últimos 12 meses. Quase todos os países foram afectados.

Curiosamente, um dos poucos países em que o índice de sentimento económico não caiu em Julho é aquele em que o valor actual é mais baixo. Em Espanha, este indicador subiu ligeiramente para 74,2 pontos, um resultado que espelha o pessimismo que se vive no país vizinho em relação à evolução da economia. Portugal está entre os países que registaram uma descida - de 95,1 para 93,2 pontos -, sendo esta especialmente sentida ao nível da confiança dos consumidores e das expectativas dos empresários do comércio a retalho.

Economia em travagem

A quebra de confiança registada na Europa e, em particular, na zona euro é, como explica Paula Carvalho, economista do BPI, "o reflexo de uma conjuntura particularmente difícil". Os últimos indicadores económicos têm revelado que a economia europeia, depois de um primeiro trimestre em que resistiu bem à crise financeira internacional, entrou numa fase bastante mais negativa no segundo trimestre do ano.

De tal forma que, actualmente, a maior parte das estimativas apontam para que nesse período se tenha registado a primeira variação em cadeia do PIB negativa desde que o euro foi criado em 1999.

Contribuem para este resultado alguns dos países que mais cresceram durante os últimos anos, mas que agora se vêem a braços com uma crise profunda no seu mercado imobiliário. Está neste caso a Espanha, onde o banco central já prevê um crescimento de 0,1 por cento no segundo trimestre e o ministro das Finanças admite uma estagnação até ao final do ano.

Mas não é só o abrandamento económico que provoca a crise de confiança. A inflação, que actualmente já se encontra num máximo histórico de quatro por cento na zona euro, está a penalizar os consumidores. No inquérito realizado pela Comissão Europeia também é possível verificar que as expectativas para a evolução da inflação nos próximos 12 meses são de acentuado pessimismo, com a maior parte dos europeus à espera de uma aceleração da variação dos preços.

Não se podem ainda esquecer os problemas relacionados com a subida das taxas de juro e a crise financeira internacional, que penalizam ainda mais o recurso ao crédito feito pelas famílias e empresas europeias. E neste capítulo, como demonstram as últimas notícias provenientes dos EUA - com a Reserva Federal a ver-se obrigada a prolongar até Janeiro os seus programas de financiamento de emergência -, o pior pode ainda não ter passado.