26.7.08

Portugal condenado por violar direitos humanos

Inês David Bastos, in Diário de Notícias

Julgamento. Estado terá de pagar três mil euros a um ucraniano


O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem acaba de condenar o Estado português a pagar 3000 euros a um cidadão ucraniano por entender que os direitos humanos do arguido foram violados num processo judicial. O ucraniano, de nome M. Oleksandr Panasenko, fora acusado da co-autoria do homicídio e roubo de um taxista e condenado no Tribunal Judicial de Braga a 21 anos de prisão. Alegando não terem sido cumpridos alguns dos direitos que assistiam ao ucraniano enquanto arguido, a advogada Ana Costa Almeida recorreu para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e este veio dar razão à causídica, concluindo que foram violados os números 1 e 3 do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Ou seja, que não foram garantidos os princípios da equidade e imparcialidade em processo penal, nem assegurados ao arguido o direito a ser informado em língua que entendesse e a assistência efectiva de um advogado. "É uma das minhas maiores satisfações pessoais até hoje", reagiu à Lusa a advogada, reiterando que a actuação judicial foi "desconforme a tudo o que são os princípios do Estado de Direito". "Pode acontecer a qualquer um de nós", avisou.

"É uma decisão inédita, não me recordo de existir um caso como este", disse ao DN António Francisco Martins, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses.

Falta de tradução

Antes de recurso para o Tribunal Europeu, Ana Costa Almeida tinha recorrido, sem sucesso, ao Supremo Tribunal de Justiça e ao Tribunal Constitucional. Da análise do processo (que é de 2002, mas a advogada só o patrocinou a partir de 2004), Ana Costa Almeida concluiu "que não houve assistência jurídica efectiva" das duas advogadas que a precederam (estão a correr, aliás, dois processos disciplinares na Ordem dos Advogados) e que o arguido não pôde defender-se devidamente no julgamento por desconhecer a língua portuguesa e não existir intérprete.

Quando o caso chegou ao conhecimento de Ana Costa Almeida, o ucraniano estava preso em Coimbra, segundo alegava, sem saber porquê. Isto porque, argumentava, a notificação tinha sido feita para a sua advogada de Braga e esta não aparecia. Mais. A notificação estava escrita apenas em português. "A tradução devia ter sido acautelada", comenta António Martins, explicando que, no que respeita a intérprete, o juiz só indica se perceber que o arguido desconhece ou não domina a língua portuguesa.

Contudo, entende que os magistrados deviam acautelar também a tradução. Sobre a possibilidade de o Ministério da Justiça exercer direito de regresso contra o magistrado deste caso por 'erro' no julgamento, ao abrigo da nova lei da responsabilidade civil extracontratual, António Martins defende que teria de se fazer prova de que o intérprete era mesmo necessário.