Agência Ecclesia
Assembleia da Repúblia vota hoje Petição da CNJP. Grupos parlamentares saudam proposta que consagra a pobreza como violação de direitos humanos
A Assembleia da República apreciou esta Quinta-feira a Petição da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) pela erradicação da pobreza.
21 268 assinaturas foram entregues ao Parlamento, em Outubro de 2007, solicitando que aquele órgão de soberania reconheça que a pobreza é uma violação de direitos humanos, estabeleça um limiar oficial e crie um mecanismo parlamentar de observação, acompanhamento e avaliação das políticas públicas para a sua erradicação.
Os promotores da iniciativa entendem que a pobreza "constitui uma grave negação dos direitos humanos fundamentais e das condições necessárias ao exercício da cidadania, situação que reputam eticamente condenável, politicamente inaceitável e cientificamente injustificável".
A petição foi já analisada pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que a encaminhou em Maio passado para o Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
O parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a petição entregue pela CNJP indica que a distribuição de alimentos “continua a caracterizar-se por uma acentuada desigualdade”.
Apesar de o Instituto Nacional de Estatística apontar uma quebra ligeira da taxa de risco de pobreza - em 2006, a taxa indicava que 18% dos indivíduos residentes em Portugal se encontravam em risco de pobreza – vive-se um “quadro de pobreza estrutural e de desigualdade, confirmada por diversos relatórios nacionais e internacionais.
A Comissão relembra que o limiar da pobreza foi convencionado pela Comissão Europeia como sendo o correspondente a 60% da mediana do rendimento por adulto equivalente de cada país, que corresponde, em Portugal, a 366 euros por mês.
As taxas de risco de pobreza são superiores para as mulheres (19%) e os idosos e as pessoas com menos de 18 anos registaram as maiores taxas de risco – 26% e 21% respectivamente.
Indica a Comissão que a petição assume “particular importância, quer no plano simbólico, quer no plano concreto da definição de objectivos para a erradicação da pobreza”. A declaração da Pobreza como uma violação dos Direitos Humanos significa assumir um compromisso no acompanhamento das políticas públicas de combate à pobreza no pleno exercício das suas competências legislativas e de fiscalização da acção governativa.
A Comissão pede, assim, a criação de um grupo de trabalho, no âmbito da mesma comissão, para acompanhamento da problemática da pobreza, dando cumprimento ao estipulado na resolução aprovada na Assembleia da República a 7 de Março de 2008, que declarava a pobreza como uma violação dos Direitos Humanos.
A Comissão apresenta um Projecto de resolução onde pede que se declare a Pobreza como uma violação dos Direitos Humanos, que se defina limiar de pobreza em função do nível de rendimento nacional e das condições de vida padrão da sociedade portuguesa e que o mesmo limite estabelecido sirva de referência obrigatória à definição e à avaliação das políticas públicas de erradicação da pobreza. O projecto de Resolução pede também objectivos precisos para o combate à pobreza e uma avaliação regular das políticas públicas de erradicação da pobreza.
Limiar de pobreza
Hoje ainda, juntamente com o relatório final da petição, o Parlamento debateu o Projecto de Resolução n.º 348/X, que recomenda a definição de um limiar de pobreza e a avaliação das políticas públicas destinadas à sua erradicação. A votação decorre Sexta-feira, 4 de Junho.
A Comissão de Assuntos Constitucionais concluiu que a declaração solene de que a pobreza conduz à violação dos Direitos Humanos “deve ser concretizada através da definição de objectivos precisos para o combate à pobreza, para além das medidas ali previstas”.
Considerando que, nos termos do n.º 5 do artigo 24.º da Lei de Exercício do Direito de Petição (aprovada pela Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto e alterada pelas Leis n.ºs 6/93, de 1 de Março, 15/2003, de 4 de Junho e 45/2007, de 24 de Agosto), a Comissão competente pode apresentar, um projecto de resolução a debater e votar quando da apreciação da petição pelo Plenário;
A Assembleia da República declarou, através da identificada Resolução n.º 10/2008, de 19 de Março, que “a pobreza expressa e conduz à violação dos Direitos Humanos” e, em consequência, se propôs assumir o acompanhamento da situação da pobreza em Portugal como sua missão específica, para a prossecução da qual se baseará designadamente no relatório anual sobre a execução do Plano Nacional de Acção para a Inclusão, a apresentar pelo Governo à Assembleia da República.
O Projecto de Resolução 348/X, é da autoria de Osvaldo de Castro (PS) , Fernando Negrão (PSD) , António Filipe (PCP) , Sónia Sanfona (PS) , António Montalvão Machado (PSD) , Helena Terra (PS) , Vítor Pereira (PS) , Helena Pinto (BE) , Nuno Magalhães (CDS-PP) , Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) , Cláudia Couto Vieira (PS) , Vasco Franco (PS) e Ana Maria Rocha (PS).
Nele se recomenda “a definição de um limiar de pobreza em função do nível de rendimento nacional e das condições de vida padrão na nossa sociedade”, “a avaliação regular das políticas públicas de erradicação da pobreza” e que o limiar de pobreza estabelecido “sirva de referência obrigatória à definição e à avaliação das políticas públicas de erradicação da pobreza”.
Audição
Ainda em volta deste tema, a CNJP promoverá no próximo dia 8 de Novembro uma audição pública intitulada “Dar voz aos pobres para erradicar a pobreza”.
A Comissão, órgão laical da Igreja Católica em Portugal, sustenta que “existe cada vez mais a convicção de que a pobreza deve ser tida como uma violação de direitos humanos fundamentais, designadamente o direito à vida ou o direito à liberdade”.
“Nas actuais condições de desenvolvimento económico, conhecimento científico e progresso tecnológico, é intolerável, do ponto de vista ético e de critérios de cidadania e vida democrática, que continue a verificar-se a persistência de elevado número de cidadãos e cidadãs do nosso País a viver em situação de pobreza severa ou sofrendo privações graves em relação ao estilo de vida corrente”, refere a CNJP.
Para este organismo, é necessário “inscrever a erradicação da pobreza em todas as políticas públicas, a começar pela política macroeconómica, as políticas de emprego e de formação profissional, transportes e demais serviços de utilidade social, habitação e urbanismo, saúde, educação ou cultura”.
Ao promover esta audição pública, a CNJP pretende convocar pobres e não-pobres para uma reflexão conjunta com vista à desconstrução dos preconceitos acerca da pobreza e, por essa via, contribuir para fomentar uma cultura de justiça, de solidariedade e de coesão social.
“É nossa intenção reunir na mesma mesa as pessoas que vivem ou viveram situações de pobreza e os responsáveis pelas políticas públicas e pelas organizações de solidariedade social, investigadores, e gente da cultura e da comunicação social”, indica a Comissão.