4.7.08

Promessas fiscais de José Sócrates para as famílias terão efeitos marginais

Rosa Soares, Luísa Pinto, Catarina Gomes, Vítor Costa, in Jornal Público

Primeiro-ministro prometeu apoiar os mais carenciados

As promessas do primeiro-ministro de aumentar as deduções fiscais relativas a despesas com habitação e de reduzir as taxas de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) deverão ter um resultado nulo ou pouco significativo nos bolsos dos contribuintes.

Na entrevista à RTP, José Sócrates fez declarações vagas sobre as medidas e ontem o seu gabinete insistia que os detalhes só seriam apresentados no próximo dia 10, durante o debate do Estado da Nação. Sócrates insistiu ainda que quer que estas medidas se façam sentir em 2008, algo que só é possível se a legislação for alterada de forma a entrar em vigor ainda este ano, e acentuou que pretende beneficiar os "escalões mais baixos" e "as famílias mais carenciadas".

As estatísticas de IRS de 2006 e a própria lei permitem verificar, no entanto, que o aumento não terá resultados significativos, uma vez que, em média, as famílias com rendimentos mais baixos já não pagam IRS.

Os dados deste imposto referentes a 2006 (os últimos disponíveis) mostram que uma família com rendimento bruto até 5000 euros (pouco mais de 357 euros mensais considerando 14 salários) pagou cerca de 15 euros de imposto. Ou seja, mesmo que venham a sentir o aumento das deduções, a poupança não ultrapassa este valor anual. No escalão seguinte (entre 5000 e 10.000 euros) a poupança seria de apenas 49 euros por ano. E mesmo no terceiro escalão, que vai até aos 13.500 euros (cerca de 964 euros mensais de salário) a poupança seria 176,34 euros anuais, cerca de 14 euros por mês.

Nestes três escalões encontram-se 2,5 milhões de famílias, de um total de 4,3 milhões que entregaram declaração em 2006. Segundo essas estatísticas, apenas pouco mais de um milhão utilizou a dedução dos encargos com compra de habitação em 2006, tendo deduzido 447 milhões de euros. Ou seja, mesmo que este milhão de famílias estivesse dentro dos três escalões mais baixos, a poupança nunca ultrapassaria 14 euros mensais.

A forma como a lei está feita é outro entrave à promessa de Sócrates, uma vez que permite que sejam as famílias de maiores rendimentos a deduzir mais despesas. A lógica é a de que o contribuinte vá deduzindo despesas por uma determinada ordem e apenas até ao momento em que já não há imposto a pagar. Acontece que no Código do IRS estão previstas nove categorias de despesa e as despesas com a habitação são a quinta categoria a deduzir, ficando atrás de despesas como a saúde ou a educação.

Alguém ganha com o IMI?

Actualmente existem duas bandas de taxas de IMI. Uma entre 0,2 e 0,5 por cento e aplica-se aos prédios novos ou transaccionados a partir de 2003; e outra entre 0,4 e 0,8 por cento para os restantes prédios. Dentro destas bandas cada município define a taxa.

A promessa do primeiro-ministro é de que irá reduzir estas taxas, mas a medida pode não ter grandes efeitos. Primeiro, porque a lei já isenta de IMI as famílias que preencham duas condições: que tenham um rendimento anual inferior a cerca de 10 mil euros e cuja casa não tenha um valor patrimonial superior a cerca de 50 mil euros. Ou seja, estes contribuintes não irão sentir qualquer diferença.

A lei permite ainda outra isenção. As casas cujo valor patrimonial seja inferior a 157.500 euros estão isentas por seis anos e as casas entre 157.500 e 236.250 euros estão isentas por três anos. Como por lógica os contribuintes de rendimentos mais baixos compram casas de valor mais reduzido, a grande maioria goza de isenção, logo, enquanto a mantiverem, não sentirão a redução de taxas.

Assim, apenas beneficiarão os contribuintes que já perderam a isenção e todos os que compraram casas de valor mais elevado. Refira-se que, segundo números publicados pelo Jornal de Negócios, 70 por cento das casas transaccionados entre 2004 e Janeiro de 2006 estavam isentas de IMI.

Mas mesmo os contribuintes sem qualquer isenção poderão não sentir a redução de taxas uma vez que são as câmaras a fixá-las e muitas delas já aplicam valores abaixo do limite máximo. Analisando os 10 concelhos mais populosos do país, verifica-se que apenas três aplicam as duas taxas máximas (0,8 e 0,5 por cento). Lisboa, por exemplo, aplica uma taxa de 0,7 e 0,4 por cento. Logo, se o Governo vier a descer os limites máximos para 0,7 e 0,4 por cento, os munícipes de Lisboa não notarão qualquer alteração.