in RTP
O presidente da Solidariedade Imigrante criticou hoje o "encaixotamento" das pessoas com fracos recursos em "autênticos guetos", opinião partilhada por um investigador da Universidade Nova de Lisboa que também defende o fim dos bairros sociais.
"É preciso coragem política para efectivamente ocupar a cidade de Lisboa que está deserta, em vez de optar pela construção e pelo encaixotamento de pessoas em bairros sociais na periferia das cidades", disse à Agência Lusa o presidente da associação Solidariedade Imigrante - Solim, Timóteo Macedo.
O responsável defendeu "políticas inteligentes de habitação e de integração" como solução para se evitar conflitos entre pessoas pobres de diferentes etnias que habitam em bairros sociais, lembrando que estas situações de conflituosidade são "impostos pelas condições em que essas pessoas vivem", sobretudo pela falta de "infra-estruturas e apoios sociais".
Na semana passada o bairro da Quinta da Fonte, em Loures - "um bairro bastante heterogéneo, composto por pessoas de etnia cigana e africanos, na sua maioria provenientes de países africanos de língua oficial portuguesa como São Tomé, Guiné, Angola e Moçambique" - foi palco de confrontos com armas de fogo entre as duas comunidades.
Timóteo Macedo lembra que já em 1999 - quando o bairro foi edificado para acolher os desalojados pela construção dos acessos viários à Expo 98 - a "situação de conflituosidade era latente entre as várias comunidades que ali habitavam".
"São situações que vêm de há muito tempo e que na altura não foram devidamente tratadas. Não houve quaisquer critérios no processo de realojamento. As pessoas foram simplesmente aí encaixotadas e deixadas ao seu destino", criticou, salientando que se devia "ter optado por outras forma de realojamento na cidade" e não em "autênticos guetos situados nas periferias de Lisboa, onde existe "uma exclusão social e económica constante".
Também o presidente da Câmara Municipal de Loures, Carlos Teixeira, admitiu hoje que foi um erro colocar 2.500 pessoas no bairro Quinta da Fonte, apesar de reconhecer que na altura não havia muitas soluções devido à Expo 98.
Por outro lado, Timóteo Macedo lembrou que "o conflito na Quinta da Fonte não é só entre duas partes".
"Há ali várias partes envolvidas em situações de risco. Hoje foi entre essas duas comunidades. Amanhã pode ser entre outras quaisquer se não se tomarem medidas no domínio da habitação, que continua a ser a aréa prevista no Plano para a Integração dos Imigrantes que mais esforços e investimentos precisa", frisou.
"Em Lisboa há tanta casa sem gente e, por outro lado, existe tanta gente sem casa. As pessoas de fracos recursos também têm direito a uma habitação condigna e a interagir com a sociedade. Não se percebe como é que não se lhes da a possibilidade de viverem na cidade", acrescentou.
Opinião idêntica tem José Gabriel Pereira Bastos, coordenador do Centro de Estudos de Migrações e Minorias Étnicas da Universidade Nova de Lisboa, que, por sua vez, classificou os bairros sociais como "caixotes de lixo municipais", onde "não" há esquadras da polícia, autoridades e mediadores culturais.
O antropólogo, que já fez vários estudos sobre a comunidade cigana em Portugal, defendeu o fim deste tipo de realojamento, considerando que as pessoas com fracos recursos deveriam ser "disseminadas pela malha urbana" e não colocados em "guetos".
Pereira Bastos manifestou-se contra as casas que são dadas pelas autarquias, sublinhando que cada pessoa deveria pagar segundos os seus rendimentos.
Segundo o investigador, a "rivalidade identitária" entre a comunidade cigana e africana "é violentíssima", uma vez que são ambos os grupos mais excluídos da sociedade e disputam o "penúltimo lugar" na hierarquia da exclusão.
SK/CMP.