Helena Teixeira da Silva, in Jornal de Notícias
Rendimento de Inserção pode ser acumulado com abono e subsídio de desemprego parcial
Mais de um terço (125.197) dos 329.569 beneficiários do Rendimento Social de Inserção é menor de idade. A mesma faixa etária representa dois terços do universo cujo abono de família teve esta terça-feira um aumento de 25%.
Embora as crianças e jovens com menos de 18 anos não possam requerer directamente o RSI - salvo excepções -, elas são igualmente contabilizadas como beneficiárias da Segurança Social, uma vez que uma das variáveis de atribuição do RSI depende justamente do número de filhos ou dependentes.
Como o abono de família não interfere no cálculo de atribuição do RSI, isso significa que, em Portugal, há uma percentagem significativa de jovens a ser duplamente apoiada pelo Estado. No entanto, há ainda agregados que podem receber um terceiro subsídio: o de desemprego parcial. Basta que um dos membros - desempregado - desempenhe qualquer função em part-time. Esse trabalho, por não ser exercido a tempo inteiro, não retira o direito de acesso ao RSI. Ou seja, um jovem pode receber, simultaneamente, RSI, abono e subsídio de desemprego parcial.
O JN tentou saber junto do Ministério do Trabalho, qual é o montante máximo processado do RSI, e quantas famílias beneficiam de um apoio mensal superior a 700 euros, mas até ao fecho desta edição não foi possível obter a informação.
Independentemente do valor, Bagão Félix, ministro da Segurança Social e do Trabalho, no Governo de Durão Barroso - responsável pela mudança na designação de Rendimento Mínimo Garantido para RSI - questiona este instrumento que, diz, "pode ter um efeito perverso: o de 'viciar' os jovens nos subsídios e não no esforço". Daí que, quando tutelou a pasta, entre 2002 e 2004, tenha tentado encurtar a faixa etária das pessoas abrangidas pelo RSI.
"À semelhança do que acontece noutros países, tentei que houvesse beneficiários só a partir dos 25 anos". A proposta acabaria por ser chumabada por Jorge Sampaio, presidente da República.
Agostinho Jardim, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza, também tem dúvidas relativamente ao real impacto que o RSI possa ter nos indivíduos que vivem no limar da pobreza. "É uma medida assistencialista, que não serve para que os pobres deixem de o ser", defende. "Serve para responder às tabelas europeias, mas não funciona, porque o RSI não está a ser aplicado de acordo com o seu espírito inicial, que era o de qualificar e inserir. Ao contrário, mantém as pessoas dependentes", critica.
Bagão Félix traduz o perigo desta medida com uma metáfora bíblica: "Dá-se o peixe aos jovens e não a cana de pesca". O ex-ministro defende que "a mesma verba poderia ser investida nos menores, mas com outra utilidade social, apostando na sua qualificação e inserção profissional".
Em relação à possibilidade de acumular simultaneamente três subsídios, Bagão Félix, que foi também ministro das Finanças, é claro: "Quem recebe subsídio dedesemprego parcial não deve ter acesso ao RSI, a não ser que o conjunto de rendimentos continue a ser mais baixo do que o próprio RSI - mas aí, só deve receber a diferença", defende. Ao contrário, já concorda com a acumulação do RSI com o abono de família.
A sua crítica é mais incisiva em relação à avaliação da candidatura dos agregados, cujo rendimento provém de trabalho independente. "Deveria ser avaliada a média do último ano e não apenas os últimos dois meses. Este método potencia a fraude".