8.7.08

Países ricos recusam garantir a duplicação da ajuda a África até 2010

Jorge Almeida Fernandes, in Jornal Público

O novo Presidente russo reafirmou a continuidade da política de Putin: criticou o escudo antimísseis americano e tem pressa num acordo com a UE

Um encontro entre os dirigentes dos países ricos e os sete países africanos convidados abriu ontem a cimeira do G8, em Toyako, na ilha de Hokkaido, Japão. Acabou num impasse, pois os africanos não conseguiram convencer os países mais industrializados a confirmar a promessa da duplicação das ajudas financeiras até 2010. O dia de ontem, com uma agenda limitada, foi marcado pelos encontros bilaterais do novo Presidente russo, Dmitri Medvedev, com George W. Bush, Gordon Brown e Nicolas Sarkozy. É a primeira e última cimeira entre Bush e Medvedev, o russo que se estreia e o americano de partida. Medvedev reafirmou a continuidade fundamental da política de Vladimir Putin, com um novo estilo. Repetiu a Bush as "sérias inquietações" de Moscovo quanto à instalação de dispositivos do escudo antimísseis americano na Europa Central e, com mais veemência, sobre a hipótese da Lituânia. Mas prometeu cooperar com Washington na resolução da crise do nuclear iraniano.

No fim do encontro, o seu conselheiro diplomático, Serguei Prokhodko, resumiu a discussão aos jornalistas. Para lá da crítica do "escudo", que Moscovo encara como uma desvalorização da sua dissuasão nuclear, lançou uma advertência quanto à instalação na Lituânia: "Isto é absolutamente inaceitável".Perante a resistência negocial de Varsóvia, que exige aos EUA mais compensações, designadamente militares, Washington iniciou há semanas contactos com Vilnius, o que, dada a sua situação geográfica e o seu antigo estatuto de república soviética, ainda mais exaspera Moscovo. Um "tipo inteligente"Inversamente, Medvedev manifestou vontade em cooperar na crise iraniana. "A Rússia vai estimular por todos os meios o diálogo com Teerão, mas espera sinais correspondentes da direcção deste país", resumiu Prokhodko.

Numa brevíssima conferência de imprensa, ambos os dirigentes fizeram gala em se mostrar descontraídos. Bush, que outrora disse ver "a alma" de Vladimir Putin olhando-o nos olhos, não fugiu a qualificar Medvedev como um "tipo inteligente". Acrescentou: "Não vou fazer a sua psicanálise, mas posso dizer-vos que ele está muito à vontade e confiante, e pensa aquilo que diz". Na sua estreia na grande cena internacional, o novo ocupante do Kremlin encontrou-se também com o francês Nicolas Sarkozy e com o britânico Gordon Brown. Depois de conferenciar com o pri-meiro, manifestou a vontade de po-der concluir um novo acordo de parceria com a UE ainda durante a presidência francesa, vontade que Sarkozy corroborou. Ao primeiro-ministro britânico propôs a normalização das relações entre os dois países, afectadas pela crise decorrente do envenenamento com plutónio, em Londres, de um antigo agente russo, Alexandre Litvinenko.

Biocombustíveis
Os chefes de Estado e Governo do G8 (Alemanha, Canadá, EUA, França, Grã-Bretanha, Itália, Japão e Rússia) começaram o debate sobre a assistência ao desenvolvimento de África com os sete países africanos convidados (África do Sul, Argélia, Etiópia, Gana, Nigéria, Senegal e Tanzânia). Os africanos não obtiveram a garantia do cumprimento da promessa feita em 2005 de duplicação da ajuda até 2010. Franceses e alemães criticaram a falta de cumprimento dos compromissos e a fraqueza das medidas contra a corrupção, propondo uma verificação anual dos compromissos. Se não houver acordo até amanhã, os africanos correm o risco de sair de mãos vazias. De resto, a discussão foi marcada por um afrontamento sobre a situação no Zimbabwe (ver caixa).

Falando numa reunião à margem da cimeira, o americano Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, lançou um dramático apelo à revisão das políticas dos biocombustíveis que, disse, "desviam a comida das mesas de milhões de pessoas". Solicitou também que os Estados Unidos e a Europa reduzam os subsídios aos seus agricultores e as suas políticas proteccionistas.

A chanceler alemã, Angela Merkel, anunciou que Berlim destinará 600 milhões de euros para a ajuda aos sectores agrícolas dos países pobres. Centrando-se na alta do petróleo, apelou aos seus colegas do G8 que incluam as grandes economias emergentes, designadamente a China e a Índia, convidados para cimeira, em "conversações abertas" para afrontar o vertiginoso aumento dos preços. O grande debate começa hoje com uma agenda centrada nos problemas económicos mundiais, devendo amanhã ser abordado o tema "quente" das alterações climáticas.