in Jornal Público
A SEDES diz que há três áreas específicas em que a inversão de rumo das reformas terá inevitavelmente grandes custos económicos e sociais: saúde, educação e regulação do mercado laboral. A propósito do debate do Estado da Nação, dedica-lhes uma atenção especial. Eis alguns excertos do documento:
Saúde
Nos últimos quatro anos, houve alterações substantivas no sistema de saúde português. Assinalam-se as transformações em curso no Serviço Nacional de Saúde (nos cuidados de saúde primários, na gestão hospitalar, na reorganização da rede prestadora, nos cuidados continuados) e o crescimento do sector privado, seja na componente de financiamento (seguros e subsistemas) seja na de prestação de serviços.
O processo técnico de apoio à reorganização do Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi considerado de elevada qualidade. Contudo, um período de forte contestação pública levou a um aparente repensar deste percurso. As transformações em curso no SNS correm o risco de não serem concluídas, ou mesmo de sofrerem um retrocesso, nomeadamente, na reorganização da rede prestadora. (...) Por outro lado, não sendo claras as implicações orçamentais de algumas destas medidas, o seu desenvolvimento deverá realizar-se dentro de um rigoroso planeamento a este nível.
A componente de cuidados continuados (e paliativos), após um impulso adicional, não dá ainda resposta cabal às necessidades das populações. Já o percurso iniciado pelo sector privado no desenvolvimento da sua rede de prestação, em particular de equipamentos hospitalares, será provavelmente finalizado. Mas, também nesta matéria, pode estar em revisão a relação ideológica entre o Estado e o sector privado da saúde, sem que as respectivas consequências sejam claras.
O sector público manifesta uma crónica incapacidade de concluir as transformações que inicia. A relevância das reformas em curso exige, para o desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde e o bom funcionamento do sistema, que sejam completadas, sem cedências nem eventuais recuos por força da fase pré-eleitoral.
Educação
Há um espectro que paira sobre sucessivas gerações de portugueses, um claro problema de eficácia. O país gasta em educação não-universitária mais que os seus parceiros europeus mas os resultados são paupérrimos. A recente polémica sobre os exames é mais um contributo para a descredibilização do sistema. A forma de organização e elaboração dos exames, desde há muito, não segue padrões técnicos internacionalmente aceites e a polémica repete-se todos os anos.
Este Governo iniciou um conjunto de reformas difíceis e urgentes. (...) Embora a titular da pasta se tenha mantido, nota-se uma perda de fôlego relativamente aos primeiros tempos, com as últimas reformas a aparentar não terem passado de intenções. A confirmar-se, o espectro continuará presente e o fosso agravar-se-á. (...) As atitudes de complacência e de rebaixamento dos padrões de exigência que têm dominado, nas últimas décadas, o nosso sistema de ensino são, no fundo, os melhores meios para tornar os pobres mais pobres e para perpetuar a sua situação de dependência.
Leis laborais
Há muito que a alteração das leis laborais é referida como uma das reformas mais necessárias, num contexto de grande concorrência internacional (...) Contudo, várias vezes foram iniciados processos de reforma, outras tantas eles ficaram aquém das expectativas mais pessimistas. Na revisão em curso, registe-se a maior certeza jurídica e rapidez processual, importantes para as empresas e para os trabalhadores. (...)
O agravamento das contribuições sociais para todos os contratos a termo pode ter efeitos adversos, pois destes depende uma parte significativa do ajustamento no mercado de trabalho. Assim sendo, seria preferível um sistema que penalizasse a excessiva rotação de trabalhadores pelos custos que impõe à segurança social e aos trabalhadores. Além disso, o subsídio de desemprego deveria ser analisado neste contexto as leis laborais: protecção ao desempregado e a protecção ao empregado são duas faces de uma mesma moeda. (...) O âmbito e a profundidade das reformas ficaram, mais uma vez, aquém do esperado e do necessário. Além disso, uma parte da rigidez, mais do que das leis, advém da sua regulamentação e da sua interpretação pelos tribunais.
Por último, o mercado continua dual: excessivamente flexível nos contratos a termo e excessivamente rígido nos permanentes. Seria desejável uma aproximação das regras existentes para estes dois tipos de contratos ou, em alternativa, a introdução de um novo tipo de contrato de flexibilidade intermédia. A reforma das leis laborais peca, pois, por ser tímida e pouco relevante no contexto dos problemas nacionais, apesar de apontar no rumo certo.