Luísa Botinas, in Diário de Notícias
Confrontos. O tiroteio no bairro da Quinta da Fonte, Loures, suscitou a velha discussão sobre as fragilidades do realojamento social. Urbanistas e sociólogos dizem ser preciso investir na qualidade da arquitectura e ouvir os habitantes. A polícia realizou ontem mais uma rusga e irá manter-se no terreno
Realojamento não é a única causa das tensões sociais
Atribuir às operações de realojamento a causa de conflitos e explosões sociais como as que vimos nas imagens televisivas do que se passou no bairro da Quinta da Fonte, em Loures, "pode ser muito redutor", pois, no entender da socióloga Maria João Freitas, "há certamente outros factores a contribuir para estas situações, nomeadamente, as dificuldades que as pessoas enfrentam na sua afirmação em sociedade". É claro que viver num bairro onde as casas são facilmente identificáveis como de "habitação social", onde o espaço público está degradado, onde faltam equipamentos, onde não há emprego e actividades para jovens e crianças, não ajuda nada". De acordo com esta especialista, os realojamentos que correm bem, normalmente são aqueles com operações de "pequena escala, integradas na malha urbana e onde há uma boa monitorização e acompanhamento, tanto da população que vai ser realojada como da que a vai acolher".
Por outro lado, um realojamento que corre mal, em que podem ser identificadas fragilidades é aquele em que as entidades que os promovem optam por "grandes concentrações de edifícios, pela verticalização (fogos agrupados em grandes torres habitacionais), afastadas dos centros". Todos estes factores, segundo Maria João Freitas "contribuem para que as pessoas se fechem em si próprias ou nas suas comunidades e que criem uma cultura própria", também ela fechada ao exterior. As soluções para estes problemas podem passar pela reabilitação destes bairros, não só nível do edificado mas também do quotidiano de quem lá vive, "introduzindo-se dinâmicas de apoio" às comunidades, através duma rede social.
Fonseca Ferreira, presidente da CCDRLVT, considera que aos velhos problemas associados às operações de realojamento - o acompanhamento (ou a falta dele) aos realojados e as opções em matéria de arquitectura e urbanismo - vieram juntar-se outros como o da insegurança, da agudização dos problemas económicos e a heterogeneidade cultural e étnica cada vez maior. "Se andarmos pela Área Metropolitana de Lisboa é muito fácil identificar pelo aspecto dos edifícios o que é bairro social. É esse tipo de problemas que é preciso resolver", sublinha. Soluções? "Aconselharia as autoridades a desviarem os dinheiros das auto-estradas para aplicar nos "alojamentos, no agrupamento das famílias e na integração dos imigrantes", acrescenta. Para a urbanista Teresa Craveiro, as entidades promotoras dos realojamentos devem "fazer o acompanhamento destas populações antes, durante e depois da operação, monitorizando as situações, auscultando as necessidades das populações (a tipologia que mais se adequa ao agregado e à sua etnia), combatendo o seu desenraizamento, promovendo a auto-estima". Mas será que só o Governo tem a chave para responder a este desafio? Para aquela especialista, "é necessária uma estratégia metropolitana, articulada com a intervenção central". O Programa Especial de Realojamento (PER) foi, no seu entender, uma oportunidade perdida . "Podia ter-se resolvido a questão dos bairros clandestinos (AUGI) compatibilizando a sua reconversão com as operações de realojamento, evitando-se, os males da densificação e da guetização. Favorecendo a integração", refere. Em vez disso, há hoje bairros clandestinos, com novos moradores, e, também estes núcleos se estão a transformar em barris de pólvora".