Luís Filipe Santos, in Agência Ecclesia
Presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social pede «atenção permanente» aos fenómenos de pobreza e exclusão
D. Carlos Azevedo explica à Agência ECCLESIA quais são as prioridades que brotam do I Congresso da Pastoral Social, que decorreu em Fátima. Muitos são os problemas que exigem uma atenção imediata da Igreja.
Agência ECCLESIA (AE) – Depois do Congresso da Pastoral Social, tempo de reflexões sobre esta área da pastoral, chegou a hora da práxis?
D. Carlos Azevedo (CA) – A Pastoral social é feita no terreno, no concreto de cada diocese. É aí que se dará seguimento àquilo que foi a reflexão do congresso. O conhecimento mútuo das respostas aos problemas sociais é fundamental. É necessário que nós cresçamos em Igreja nesse conhecimento das diferentes respostas. Os congressos permitem fazer uma reflexão séria sobre vários problemas e alguns destes foram estudados: cuidados continuados, voluntariado, trabalho em rede, protecção das crianças, novas pobrezas e pastoral das prisões. Problemas que exigem uma atenção permanente. Felizmente que este congresso deu pouco espaço a lamentos (condições, situações, tempo em que vivemos), mas olhou-se a realidade com um olhar novo para descobrir os caminhos de uma vida mais evangélica que nos permita transformar as instituições e os grupos que respondem a todos os problemas sociais, de modo mais evangélico.
AE - Há uma falta de reflexão na área da Teologia Política em Portugal?
CA - Não é por acaso que as livrarias de Fátima não têm o Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Esta situação traduz muita coisa. Andamos muito atentos a uma piedade isolada e divorciada da vivência e atenção à realidade social. Nesta perspectiva, podemos dizer que a Moral Social ou a Teologia Política são dimensões que necessitam de incremento. A concepção que temos do mundo e do Ser Humano implica, necessariamente, um modo de agir social. O imediato e o certo imediatismo que os problemas exigem acaba por não despertar nas pessoas o cuidado pela formação cristã e espiritual que marque um certo estilo de agir.
AE - A criação de um Observatório de Acção Social da Igreja e uma Provedoria dos Direitos dos Pobres foram duas propostas lançadas no Congresso. Poderão ser uma resposta a esta debilidade de reflexão na área da Teologia Política?
CA - Somos muito férteis em lançar sugestões nos congressos e pouco eficazes em dar-lhes seguimento. Se lermos as conclusões de congressos de anos anteriores nos diferentes campos da vida da Igreja ficamos frustrados ao reparar que tanta coisa bonita foi sugerida e quase nada foi posto em prática.
Acho que são sugestões interessantes, mas é fundamental levar até ao fim o que está em campo. O levantamento que está a ser feito da realidade social do país terá de ser feito até ao fim e com rigor. As dioceses têm que se aplicar nisso porque é um projecto da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP). Só quando esse levantamento estiver feito é que se pode perceber a utilidade de um observatório que continue e actualize permanentemente os dados estatísticos.
AE – A CEP irá publicar, brevemente, um documento sobre a questão das crianças. É uma forma de mostrar que a Igreja está atenta às novas formas de pobreza
CA – É um documento que dará algumas orientações às instituições que acompanham as crianças que são entregues, de vários modos, às instituições. Trata-se de uma orientação pastoral. Sabemos que não há nenhuma instituição que substitua a família. Ajudar as instituições a renovarem os seus critérios, mas também enquadrar esta temática na sua relação com o Estado e com as Autarquias. Hoje, há uma sensibilidade muito grande da sociedade portuguesa na protecção às crianças. É neste clima que queremos contribuir com uma palavra de orientação e estímulo às instituições que fazem um trabalho de compaixão e de ternura para com seres tão débeis como as crianças.
AE – No congresso sublinhou-se que existe uma grande dependência das Instituições da Igreja em relação ao Estado. Como eliminar ou atenuar este modelo de funcionamento?
CA – Este é um mal da sociedade portuguesa. No entanto, sublinho que as comunidades cristãs são as responsáveis pelas instituições que elas próprias possuem. Muitas paróquias têm um centro social, mas esta não está implicada no Centro Social. Como o Estado não tinha capacidade de responder às situações sociais apoiou todos aqueles que tomavam iniciativa. E neste caso quem mais tomou a iniciativa foi a Igreja porque está próxima das populações e está presente em todo o território nacional. Na situação actual parece que há uma concorrência no bem. É uma ameaça para algumas instituições da Igreja. Se o Estado retira o apoio, as comunidades cristãs não têm capacidade para aguentar e suportar essa instituição.
AE – Então seria conveniente que os políticos lessem o compêndio da Doutrina Social da Igreja?
CA - Poderia fazer-lhes bem, tal como as mensagens que o Papa e os bispos fazem a favor do Bem Comum. A visão da Doutrina Social da Igreja está acima dos interesses. Corremos o risco de termos um Estado que seja uma mera máquina de resposta e gestão dos interesses. A crise de fé no futuro está a implicar uma ausência de esperança nas pessoas.
AE – Um «Eclipse de Deus»?
CA - Há um fazer de conta que Deus não existe, mas a dimensão transcendente está no Ser Humano.
Pobreza
AE - A Pastoral Social da Igreja está atenta à chamada pobreza tradicional. Não faltará uma reflexão sobre as novas formas de pobreza.
CA - Não há ninguém em Portugal que esteja tão atento às novas formas de pobreza como a Igreja. Praticamente, as respostas que existem aos sem abrigo, situações de desemprego, debilidades familiares, endividamento e solidão dos idosos têm pessoas da Igreja implicadas nas respostas a estas situações. No entanto, achamos que há uma mentalidade assistencialista que precisa de se renovar. É fundamental um novo olhar sobre as situações. É preciso conjugar uma pastoral social que seja de resposta mais imediata e outra que seja mais de reflexão.