António Freitas Cruz, in Jornal de Notícias
Pertence à sabedoria de bolso a certeza de que a saúde de uma sociedade assenta em dois pilares fundamentais: a Educação e a Justiça. Acontece que, em Portugal, estes pilares só raramente, e por pouco tempo, obtiveram o estatuto de objectivos primordiais. Dos governantes e da comunidade.
Não apenas nos nossos dias, mas desde sempre: a missão de construir uma base cultural não paga "juros imediatos" e, por isso, também não atrai. Pelo contrário, cidadãos bem formados tendem a pensar pelas suas cabeças -- e nem todos os governantes gostam disso…
Hoje em dia, estes pilares estão muito doentes: do lado da Educação há uma atitude completamente enganosa, mesmo a atirar para a especulação grosseira; do lado da Justiça, um ror de preconceitos recheados de segundos sentidos. Estas teimosas posições ameaçam atrasar por muitos anos quaisquer esforços de regeneração.
Não é preciso ser especialista para assim pensar. E para assim temer. A euforia desmesurada com os resultados escolares, só compreensível em termos de propaganda, seria caso para rir se não fosse antes motivo de choro. Saber-se de alunos que passam de ano com seis e até sete notas negativas e ver a festança pública da ministra (e, até, do primeiro-ministro!) é um triste espectáculo: afinal, as más notas deveriam ser para eles. E não é despejando computadores em cima dos estudantes (mesmo que eles, os computadores, fossem portugueses…) que se mascara o facilitismo. Este estilo só conta para a ambição estatística que a realidade se encarregará de esvaziar. E já nem refiro o doce engano das novas oportunidades…
De Justiça nem vale a pena falar quando se fazem reformas que cada vez mais a têm impedido. Poupa-se nas prisões… prendendo menos. Julga-se tarde e a más horas. Deixam-se suspeitos em liberdade, o que instala o sentimento da impunidade. Todos os dias os jornais se enchem de notícias que só podem ser motivo de escândalo para o cidadão comum. E os julgamentos passaram para a praça pública, com total desprezo pelas regras, a começar na presunção de inocência.