Ricardo Garcia, in Jornal Público
Ano de 2008 está a registar aumentos no número de passageiros na maioria dos principais operadores de Lisboa e do Porto
A Pelo sétimo ano consecutivo, Portugal vai concentrar em sete dias um dos debates mais importantes para a sustentabilidade do país: o dos transportes. E o clima geral para mais uma Semana Europeia da Mobilidade, que agora começa, não poderia ser mais propício: os portugueses estão lentamente a regressar aos transportes públicos, depois de se terem rendido em massa ao carro particular durante os anos 1990.
Quase todos os principais operadores de transportes públicos estão a registar aumentos no número de passageiros este ano, em que o preço dos combustíveis dispararam. Sem contar com o metropolitano de Lisboa - que não enviou dados ao PÚBLICO - as maiores empresas transportaram 2,7 milhões de utentes a mais no primeiro semestre de 2008, em relação ao mesmo período de 2007. O valor total será ainda maior, dado que no metro de Lisboa, pelo menos nos primeiros meses do ano, também houve aumentos.
Quem ganhou mais passageiros foi o metro do Porto. No total, foram transportados 25,5 milhões de pessoas, quase dois milhões a mais do que nos primeiros seis meses do ano passado. Em termos relativos, o aumento foi de 8,7 por cento - uma subida que a empresa considera real, dado que desde Maio de 2006 que a rede está estabilizada em cinco linhas, com 60 quilómetros de extensão.
Os portuenses também estão a andar mais de autocarro. A STCP conquistou 710 mil utentes, ou 1,3 por cento a mais do que até Junho de 2007.
Ainda é pouco, se comparado com a quebra de 21 por cento no movimento, desde que começou a funcionar o metro no Porto. Mas, ainda assim, a STCP considera que os números deste ano representam um marco histórico. "É inédito para uma geração de pessoas que aqui trabalham", afirma Paulo Sá, administrador da empresa. "Nos últimos 20 anos, estivemos a perder procura".
Em Lisboa, duas empresas estão em contraciclo com as demais. A Carris perdeu quase 1,5 milhões de passageiros este ano, possivelmente em favor do metro. A Transtejo também ficou sem 200 mil passageiros.
Em contrapartida, ha 400 mil novos utentes nos barcos da Soflusa, 260 mil nos comboios da Fertagus e 500 mil nas linhas urbanas da CP em Lisboa. Nos comboios urbanos do Porto, a CP também transportou 500 mil pessoas a mais no primeiro semestre de 2008.
Ninguém ousa dizer que o aumento nos combustíveis não acelerou a corrida aos transportes públicos. O preço médio da gasolina sem chumbo 95 este ano, até princípio de Setembro, é 8,7 por cento superior ao valor médio do ano passado. O gasóleo subiu em flecha: 21 por cento.
As vendas caíram. No caso da gasolina, houve uma quebra de 6,9 por cento no primeiro semestre de 2008, em relação ao mesmo período do ano passado. O consumo de gasóleo regrediu 1,1 por cento.
Há alguns sinais que indicam menos carros em algumas das entradas em Lisboa. Dados das Estradas de Portugal revelam, por exemplo, quebras no IC19 e na marginal entre Lisboa e Cascais. Na Ponte Vasco da Gama, passaram 1,6 por cento menos carros até Junho, e na Ponte 25 de Abril, menos 0,8 por cento.
O país ainda está longe de ter gente suficiente a andar de transportes públicos de modo a conseguir, por exemplo, cumprir o Protocolo de Quioto. Mas os operadores apontam mudanças permanentes capazes de cativar clientes. A CP explica o aumento dos passageiros nas linhas urbanas do Porto em parte com as melhorias no serviço, como a renovação completa da frota. Algumas linhas de barcos que fazem a travessia do Tejo, por sua vez, beneficiaram com a abertura da estação do metro de Lisboa no Terreiro do Paço. Isto "pode ter influenciado o aumento do número de passageiros", diz a Soflusa, numa nota escrita enviada ao PÚBLICO.
Melhores títulos de transportes intermodais também são apontados como um factor importante. "Nunca nada acontece devido a uma única causa", afirma Bernardo Alves, gestor de projectos em transportes na empresa de consultoria E-Value. "Mas a transferência [entre modos de transporte] é tanto maior quanto melhor for a qualidade".
Resta saber o que vai ocorrer se os combustíveis baixarem e se a economia voltar a aquecer. Mas a crise está a dar uma oportunidade para muitos experimentarem os transportes públicos. "Pode ter sido um catalisador de mudança", diz Paulo Sá, da STCP. "Mas a minha convicção é a de que parte dessas pessoas não vai voltar a utilizar o carro, pelo menos nos dias de semana".