João Ramos de Almeida, in Jornal Público
Debate no Parlamento do novo Código do Trabalho ficou marcado pela crítica violenta da esquerda e pelos elogios e chamadas de atenção por parte do PSD
A opção de alargar o período experimental de 90 para 120 dias para um trabalhador contratado para os quadros de uma empresa foi a de "normalizar esse período", dado haver já na lei distintos períodos de tempo, afirmou ontem o ministro do Trabalho, José António Vieira da Silva, à saída da sessão parlamentar de apresentação da proposta de lei de revisão da legislação laboral.
O aumento do período experimental, que representa uma das alterações introduzidas no Código do Trabalho (CT) de 2003, foi suscitado por deputados das diversas bancadas para demonstrar a fragilidade, a "demagogia" e a "hipocrisia" das medidas de combate à precariedade do trabalho, um dos tópicos da proposta de lei. O argumento desses deputados, partilhado por juristas, é o de que um período experimental tão grande substituirá os contratos a prazo, já que o empregador beneficia de contribuições sociais mais baixas e de menores limitações no despedimento, processuais e financeiras. O Governo não nega, mas frisa que a proposta impede a aplicação do período experimental, no caso em que já se tenha verificado algum vínculo laboral anterior à contratação sem termo. "O mecanismo utilizado como período experimental é o contrato a termo. Ora, esta não é a melhor solução. Queremos que o contrato a termo tenha o seu próprio papel", disse o ministro.
O debate foi marcado por fortes ataques das bancadas à esquerda do PS e do dirigente dos Trabalhadores Social-Democratas Arménio Santos à proposta de lei. O Governo foi criticado por promover o embaratecimento do trabalho (por reduzir as horas consideradas extraordinárias), pelo fim de uma lei que fixe condições laborais mínimas, pela fragilidade das medidas de combate à precariedade (nada faz contra os abusos no trabalho temporário, legitima os falsos recibos verdes ao impor uma taxa social e alarga o período experimental).
O PSD e o CDS-PP criticaram aspectos pontuais da proposta. O PSD, através do ex-secretário de Estado do Trabalho do Governo PSD/PP Pais Antunes, questionou o ministro se "deixou de ser de esquerda", mas elogiou-o pelo regresso à linha do Código do Governo PSD/PP. Na sua intervenção final, frisou que as alterações nos horários de trabalho podem ser "um factor de conflitualidade acrescida" e reduzem "o espaço da contratação colectiva".
Mas toda a oposição frisou a discrepância entre o discurso do ministro durante o debate do Código de 2003, das propostas eleitorais do PS em 2005 e do programa do Governo. Designadamente, de se ter prometido que a revisão do Código se faria com base nas propostas apresentadas pelo PS.
Por seu lado, o ministro do Trabalho sublinhou os pontos essenciais da proposta, em linha com o acordo tripartido (confederações patronais, Governo e União Geral dos Trabalhadores). Um combate à precariedade (sobretudo pela presunção do contrato de trabalho e redução da duração dos contratos a prazo), flexibilização na gestão das empresas e a dinamização da contratação colectiva. Rebateu que as alterações nos horários de trabalho impliquem um aumento da jornada de trabalho e a falta do seu pagamento. Por diversas vezes, o ministro lembrou convenções colectivas assinadas por sindicatos filiados na Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) com cláusulas semelhantes. E quanto à alegada discrepância com as promessas, o ministro pediu que lessem o programa: "Bater-nos-emos por uma mudança que favoreça a flexibilidade e a segurança", com "base nas propostas e na análise da avaliação do mercado de trabalho que fizermos na altura dessas mudanças".
A proposta será votada na generalidade e baixará à comissão parlamentar, sendo intenção do Governo que o Parlamento a aprove até 15 de Outubro próximo.