João Ramos de Almeida, in Jornal Público
Técnicos convidados para debate da CGTP alertam para o facto de ainda se desconhecer como se fará a revisão do quadro legal
A proposta de alteração da legislação laboral, que o Parlamento começa a discutir amanhã, facilita os despedimentos individuais e dificulta a reintegração dos despedidos irregularmente, sem que se conheça ainda os meios processuais de impugnação do despedimento, frisaram ontem juristas num debate organizado pela Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP).
O encontro realizou-se numa das salas do Parlamento que, de acordo com a intenção oficial criticada pela CGTP, deverá aprovar a nova lei antes da entrada do Orçamento do Estado de 2009, a 15 de Outubro próximo, de forma a vigorar no primeiro dia de 2009.
Um dos aspectos mais frisados pelos intervenientes foi a alteração à lei sobre despedimentos. À semelhança do Código do Trabalho aprovado pelo Governo PSD/PP, em 2003, a nova proposta manteve a impossibilidade de despedimento sem justa causa e não alterou o conceito de justa causa. Mas alterou o procedimento de despedimento, que, na opinião dos juristas, aumentou o risco de despedimento ilícito, sem justa causa e sem posterior reintegração dos trabalhadores visados.
Basicamente, o novo Código do Trabalho visa acabar com o fundamental do processo disciplinar prévio à decisão de despedimento. Deixaria de haver a obrigatoriedade das diligências instrutórias pedidas pelo trabalhador, cabendo apenas ao empregador decidir se há essa instrução. A prova passaria para o tribunal e o empregador teria o ónus da prova da sua justa causa. A intenção oficial foi desburocratizar, já que a prova sobre as razões do despedimento é feita sempre pelo Tribunal do Trabalho.
Mas para o advogado Fausto Leite o novo processo "é excessivamente rápido". Na sua opinião, o processo disciplinar não é um "ritual farisaico" - é o direito ao contraditório -, pelo que não deveria ser desvalorizado. Fausto Leite lembrou ainda que a suspensão do despedimento apenas pode ocorrer por iniciativa do empregador, o que "inviabiliza na prática a possibilidade de suspensão".
Depois, o trabalhador deixou de ter um ano para requerer a impugnação do despedimento, passando para 60 dias, o que foi considerado por todos os juristas como curto. Primeiro, como lembrou Júlio Gomes da Universidade Católica do Porto, há um tempo de "nojo", de recuperação do sofrimento de quem é despedido, de receio até que o trabalhador fale com um advogado. Em segundo lugar, frisou Fausto Leite, há que quantificar créditos, subsídios, direitos. E depois, frisou o jurista da CGTP Joaquim Dionísio, os 60 dias incluem já o período de mediação laboral que a lei impõe caso o trabalhador pretenda ficar isento de custas judiciais. Finalmente, desconhece-se ainda como se fará essa impugnação porque não é conhecida a revisão do Código do Processo do Trabalho, o que, como foi frisado por Júlio Gomes e Fausto Leite, impede a lei de vigorar.
Depois da morosidade esperada pelo julgamento (há processos que duram há anos), um despedimento ilícito poderá não resultar na reintegração do trabalhador lesado. Ao arrepio do sublinhado pelo PS sobre o Código de 2003, que já previra a não reintegração do trabalhador, a nova proposta de lei permite ao empregador opor-se à reintegração, pagando o dobro da indemnização devida. Como frisou João Leal Amado, da Universidade de Coimbra, este aspecto dividiu a meio o Tribunal Constitucional quando apreciou o Código de 2003. "Causa estranheza" que não se tivesse alterado "a figura emblemática de quem decide sobre o destino de um trabalhador despedido ilicitamente".
Em resumo, Júlio Gomes considera que passa a ser mais fácil despedir com a nova lei, mas que "alguns empregadores vão estatelar-se".
60
Segundo a proposta que vai ser apreciada no Parlamento, a impugnação do despedimento tem que ser feita em 60 dias