Ana Cristina Pereira, in Jornal Público
São cada vez menos os que estão em situação de acolhimento familiar ou institucional. Negligência ainda é o principal motivo da retirada às famílias
O número de crianças e jovens em acolhimento familiar e institucional tem vindo a diminuir de forma progressiva: 13.833 em 2005, 12.245 em 2006, 11.362 em 2007. Mas o tempo de permanência continua elevado. Metade das crianças e jovens vive assim há mais de quatro anos.
Ao longo de 2007, pelo menos 14.381 crianças e jovens até aos 21 anos viveram em centros de acolhimento temporário, lares de infância e juventude, unidades de emergência, apartamentos de autonomização, centros de apoio à vida, lares residenciais ou famílias de acolhimento. Saíram 3017. Os números não são totais, porque três centros distritais do Instituto de Segurança Social só enviaram 90 por cento dos dados pedidos para o Plano de Intervenção Imediata (PII) - Relatório de Caracterização das Crianças e Jovens em Situação de Acolhimento em 2007.
A secretária de Estado da Reabilitação, Idália Moniz, prefere apontar o caminho já percorrido: há cinco anos tanto se falava em 15 mil, como em 20 mil crianças e jovens em acolhimento. "Cheguei a ouvir falar em 50 mil!", diz. "Era preciso saber quantos são, onde estão e quem são para intervir."
O relatório não é um filme, é uma espécie de fotografia. E a fotografia mostra 11.362 crianças e jovens - 6812 com mais de 12 anos.
A negligência continua a comandar a lista de perigos que culminaram na retirada à família. E aí pesam, sobretudo, a falta de supervisão (6137), o descuido ao nível da educação (5388) e da saúde (4730), a exposição a modelos parentais desviantes (4995). E há o mau trato físico (1758), a mendicidade (365), o abandono (1744), a orfandade (531), a ausência temporária de suporte familiar (1503), o comportamento desviante (873)...
O agregado a que pertence cada uma destas crianças e jovens postos em perigo prima por algum grau de disfunção. O relatório enumera problemas graves, alguns muito persistentes, como a carência socioeconómica (3419), o alcoolismo (1834) e a ruptura familiar (1249).
Só 20 por cento das crianças e jovens fora retirada à família há menos de um ano. Metade fora acolhida há mais de quatro anos (26,6 por cento há mais de seis anos). A partir de um ano de permanência, o contacto com a família reduz-se de forma significativa, refere o relatório. Quarenta e dois por cento não visita a família, apesar de apenas 12 por cento estar impedida de fazê-lo. E 43 por cento não recebe visitas da família, apesar de apenas seis por cento estar impedida de o fazer.
Embora o tempo de permanência em centro de acolhimento temporário não deva ser superior a seis meses, 35 por cento dos miúdos estavam lá há um a três anos. Havia até seis por cento há mais de quatro. Apenas um em cada cinco estava há seis meses ou menos.
"Não se muda o paradigma do acolhimento de um momento para o outro", justifica Idália Moniz. Recorda que o PII já originou o Plano DOM - Desafios, Oportunidades e Mudanças, que visa a qualificação da intervenção técnica. E que há cada vez mais crianças a cessarem o acolhimento no ano em que o iniciam.