26.10.08

Esgotou-se o filão do trabalho na construção em Espanha

Hugo Silva, in Jornal de Notícias

Trabalhadores da construção ameaçam parar por um dia, exigindo melhores salários


O filão de Espanha esgotou-se. Milhares de trabalhadores da construção civil rumam a outras paragens ou regressam a Portugal, onde se continua a ganhar pouco. Tão pouco que já se perspectiva um dia de paralisação geral nas obras.

É preciso lutar pela dignificação do trabalho, sublinha Albano Ribeiro. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção do Norte e Viseu recorda que um operário qualificado, em Portugal, ganha 530 euros. "Os trabalhadores são forçados a sair do país e, muitas vezes, a morrer nas estradas", acrescenta. A luta dos operários deverá centrar-se no estabelecimento de um salário mínimo de 800 euros.

"Há casas de luxo construídas com salários de 530 euros. Os trabalhadores são obrigados a fazer muitas horas. Morrem a trabalhar", denuncia Albano Ribeiro. Factos: em 2006, 11 operários morreram em obras ao fim-de-semana. O cansaço potencia acidentes.

"Os salários são negociados em sede de contratação colectiva de trabalho", explica Reis Campos, presidente da AICCOPN - Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas, lembrando que desde 1979 houve sempre acordo com pelo menos uma frente sindical, à excepção de 2004. O dirigente admite, ainda assim, que o sector "vive a mais profunda crise de que há memória" e alerta que será preciso um "novo ciclo de investimento" para impedir o aumento do desemprego, com o regresso de muitos operários que estavam em Espanha.

"Dificilmente regressam a Portugal", diz, contudo, Albano Ribeiro. Dos 90 mil operários que rumaram a Espanha, restam 60 mil. O êxodo intensificou-se nos últimos meses, com a saída de mais 20 mil. A maioria dos trabalhadores portugueses que se viram forçados a deixar Espanha por falta de obras rumou a outros países, como França, Inglaterra Suíça ou Noruega.

Albano Ribeiro teme mesmo que a falta de mão-de-obra qualificada se faça sentir nas grandes empreitadas que se avizinham, como o TGV ou o novo aeroporto.

O sindicalista estima que, a prazo, serão precisos cerca de 80 mil trabalhadores . "Não temos essa gente", admite. Aliás, Albano Ribeiro indica que nas obras nacionais já se recorre ao trabalho de emigrantes sem qualificação e em regime precário. "Há milhares a pagar para trabalhar. Recebem 400 ou 500 euros e são obrigados a pagar os meios de protecção pessoal, como botas, capacetes e auriculares", denuncia.

"Não é pelo simples facto de alguns trabalhadores serem oriundos de outros países que nos permite concluir pela sua maior ou menor preparação. No nosso sector, como em qualquer outro, é do interesse das empresas assegurar a formação necessária e adequada" contrapõe Reis Campos.