in Jornal Público
Agora há um apelo, por parte de várias entidades, para a aplicação de políticas orçamentais mais expansionistas. Como é que países como Portugal, que não têm ainda uma situação orçamental confortável, devem ler esta mensagem?
A mensagem que tem sido dada é a de usar um espaço de manobra, sempre respeitando o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Alguns países ganharam espaço de manobra ao serem mais disciplinados no passado, outros não o fizeram. Tal como acontece na política monetária, a política orçamental também deve evitar resolver os problemas de hoje criando novos problemas para o futuro. Se houver intervenções específicas, por exemplo, para ajudar a parte da população mais pobre, isto tem de ser feito dentro do enquadramento orçamental existente e não começando a endividar-se outra vez e a criar problemas na dívida pública. Isto levaria a que daqui a dois anos os problemas fossem novamente maiores.
Mas não é provável que isso é o que irá acontecer em muitos países, uma deterioração significativa da situação orçamental devido à crise?
Não é uma questão de probabilidades, é uma questão de decisões. Os países têm de ter em conta as suas limitações. Uns têm menos, outros mais.
O BCE continua a pedir moderação salarial. Portugal, por exemplo, vem de alguns anos de aumentos salariais reduzidos...
Sim, mas isso aconteceu depois de vários anos de aumentos salariais muito elevados. E isso só mostra que, quando se comete um erro, demora muito tempo a corrigir. Por isso é preciso muito cuidado para não o cometer outra vez.
Mas já são vários anos de aumentos reduzidos e a inflação no ano passado foi elevada. O que é que um Governo pode fazer?
Mas se se levar em conta os últimos dez anos, as contas podem ser diferentes. Os últimos anos de contenção em Portugal deveram-se aos erros do passado e tem de se ter muito cuidado. Pode-se ter um ano ou dois de aumentos salariais mais elevados e toda a gente fica satisfeita, mas criam-se problemas para o futuro. A experiência de Portugal claramente mostra que não se deve enganar as pessoas: os aumentos salariais têm de estar em linha com o aumento da produtividade.
Mas politicamente é difícil manter períodos longos de aumentos salariais baixos...
Claro que é mais fácil dar bons aumentos e deixar os problemas para os seus sucessores a tarefa de ser mais moderado. Mas acho que a experiência em todo o lado mostra que os políticos que apostaram em aumentos salariais excessivos acabaram por não ficar no poder por muito tempo.
Em Portugal discute-se também a utilização do investimento público para reanimar a economia. Acha que pode ser um caminho?
Temos muita investigação que mostra que o investimento público não é necessariamente muito produtivo e não estimula a economia. Na minha opinião, a melhor forma de o fazer é através de parcerias público-privadas, em que a selecção dos melhores projectos fica garantida. Porque senão faz-se como o Japão durante a crise dos anos 90. O Governo apostou muito no investimento público, com projectos que não eram úteis, lucrativos e que não estimulavam a economia. E o único efeito, no fim, foi aumentar a dívida. Por isso, é preciso saber seleccionar os melhores projectos e a melhor forma de o fazer é não deixar a decisão aos políticos, mas sim numa parceria com o sector privado.
Nas parcerias público-privadas não tem havido uma verdadeira transferência do risco para os privados. A ideia tem sido mais adiar as despesas públicas. Não é disso que está a falar...
Não. Não é isso. O que é importante é encontrar a melhor forma de a sociedade decidir quais os investimentos úteis e aqueles que podem verdadeiramente ter um efeito multiplicador na economia.
"É preciso saber seleccionar os melhores projectos e a melhor forma de o fazer é não deixar a decisão aos políticos"