24.11.08

Novos pobres usam e-mail para pedir ajuda

Isabel Teixeira da Mota, in Jornal de Notícias

Cavaco Silva participa amanhã na inauguração da nova sede social da União das Miserircórdias Portuguesas


Chamam-lhes "novos pobres". Vivem nos subúrbios das duas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. E recorrem cada vez mais à acção social para receber refeições. O presidente das misericórdias nota uma "degradação da situação social".

Há mais portugueses a pedirem ajuda alimentar às misericórdias, fazendo-o por e-mail. Perguntam o que fazer para receberem refeições que já não podem pagar.

Também há mais pais a dirigirem às misericórdias pedidos de isenção no pagamento das creches e jardins de infância dos seus filhos por já não poderem comportar os diversos encargos.

Quer num caso, quer noutro, trata-se de "pessoas jovens, casadas, de classe média, que com os encargos com a casa, com o carro, com várias prestações, acabam por nos pedir auxílio", contou ao JN o presidente da União das Misericórdias Portuguesas.

Segundo Manuel Lemos, trata-se de situações a "acontecer com alguma regularidade". "É um fenómeno evidente nos últimos meses", realça, falando já de "tendências" que revelam "algum degradar da situação social".

"A partir do Verão eu comecei a receber pedidos de auxílio de alimentação por e-mail. E quando pedem apoio por e-mail quer dizer que são pessoas com outra cultura". A crise económica poderá ditar o empobrecimento de muitos "remediados", assinala.

Embora com menor expressão, há também cada vez mais casos de familiares a irem buscar os seus velhinhos aos lares para ficarem com as suas pensões de reforma. "Encontramos isso nas zonas suburbanas das gandes áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, onde se vai sentir primeiro o desemprego, onde a linha de pobreza é mais ténue, onde a mudança de situação é mais rápida", refere Manuel Lemos.

Também aqui não são casos isolados. Vários provedores, em todo o país, começaram, desde há um ano, a notar que algo de anormal se passava. "Até há um ano nunca tinha ouvido falar disso. Se havia casos ou não, não sei, mas pelo menos não eram conhecidos", diz o presidente da UMP.

"Se eu somar os casos que há no país já é importante começarmos a pensar", sustenta, dizendo que irá pôr o problema ao Governo, a quem mantém informado.

Quanto a números é que não há nada em concreto. "Não posso quantificar, não fiz nenhum trabalho de recolha de dados", confessa Manuel Lemos. Até porque, diz, "a nossa vocação não são os números, são as pessoas".

Questionado pelo JN sobre a nova realidade da pobreza em Portugal, Manuel Lemos defende que "temos que nos preparar para o que aí vem, mas sem alarmismos", porque, diz, "estamos perante questões sérias".

Daí que, no que é da responsabilidade da UMP, a palavra de ordem tem sido "reorganizar-se". Exemplo: em vários locais do país, as misericórdias estão a estudar a possibilidade de terem "cozinhas sociais" - local para dar refeições aos que não têm recursos - de grande capacidade. é o cao da misercórdia do Barreiro, cujo provedor anunciou há dias que mandou aumentar o número de refeições porque os pedidos aumentaram.

O papel das misericórdias deverá ter maior visibilidade nos próximos tempos, acredita Manuel Lemos, pela simles razão de que a tendência é para mais gente contactar aqueles serviços.

Uma das áreas onde o aumento poderá ser maior é o do acompanhamento da velhice. "Estamos cheios de pessoas a precisar todos os dias de cuidados continuados", aponta Manuel Lemos, referindo que "em média 50% das pessoas estão acamadas e muitas delas a precisar de cuidados continuados". No final deste ano, acrescenta, "teremos 70 misericórdias com unidade de cuidados continuados instalada".

Em todo o país, a Uniao das Misericórdias emprega cerca de 50 mil pessoas em empregos directos e outras tantas em empregos indirectos.