30.11.08

Saldos antecipados são o sinal de um Natal em crise

Ana Rita Faria, in Jornal Público

Das cerca de 60 lojas na Rua Augusta, na Baixa lisboeta, quase metade está com promoções ou reduções de preços. No Porto, o cenário repete-se pelas lojas do centro da cidade. Depois de olharmos para o calendário e nos certificarmos que não estamos em Janeiro, basta fazer as contas: faltam ainda 25 dias para o Natal.O que se passa? Não há mistério nenhum. "É a crise", diz Eduardo Marques, dono da loja de roupa Vitrine, na Baixa da capital. "As pessoas não têm dinheiro", replica Ângelo Midão, da MyGod, na Rua de Santa Catarina no Porto. Na montra, os artigos de moda anunciam descontos de 60 por cento.

A maioria das promoções começou no início deste mês e algumas ainda em Outubro, numa bola de neve que percorreu os principais espaços comerciais. Na Vitrine a palavra de ordem é uma só: atrair clientela. As decorações de Natal disputam espaço na montra com apelos como "Antecipe as suas compras: desconto de 15 por cento em grandes marcas" e "Esticámos o horário".

A consciência imposta pelos tempos de crise propaga-se ao resto do país. "Todas as empresas, em geral, estão a ser afectadas e não podem fazer mais nada a não ser acções promocionais que estimulem o consumo", disse ao PÚBLICO José António Rousseau, director-geral da associação das empresas de distribuição.

A febre das promoções está também nas lojas de brinquedos. A Toys'R'Us, por exemplo, está a apostar "mais este ano em descontos e preços especiais", diz Márcia Cardoso, do departamento de marketing. Na loja do Centro Comercial Colombo, em Lisboa, praticamente todos os corredores têm brinquedos em desconto, como o computador Ruca (passou de 39,99 euros a 19,99) ou o lança-teias do Homem-Aranha (custava 29,99 e está agora a 14,99). Também no Continente do Colombo há mais de 25 brinquedos com 50 por cento de desconto, graças a uma campanha que permite aos clientes com o cartão da marca acumular metade do valor gasto em brinquedos e usá-lo em compras em qualquer parte do hipermercado. Sinal de que nem os campeões de vendas do Natal estão a passar ao lado da crise.

As próprias perfumarias tiveram de entrar na corrida dos descontos para atrair o cliente. Em troca de compras, a Marionnaud está a oferecer aos clientes vários prémios, como cheques-oferta nas lojas, presentes da Smartbox ou viagens.

Um Natal poupado

Com o movimento das lojas a cair e as vendas a encolher, os comerciantes não esperam por dias melhores. De acordo com dados divulgados na quinta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a confiança do comércio sobre as vendas está ao nível mais baixo dos últimos 19 anos. Para os próximos meses, o comércio, tradicional e de grande distribuição, prevê uma queda nas vendas, nos preços e nas encomendas aos fornecedores.

A fraca confiança do sector encontra eco nos na maioria dos consumidores. Elsa, funcionária de uma loja de roupa na Rua Augusta, é um deles. "Acha que este ano há Natal?", lança em jeito de desafio. Na sua casa não há de certeza, garante Elsa, ou pelo menos não como nos outros anos. A começar pelos presentes, que vão ficar "reduzidos ao mínimo". A tendência é geral.

De acordo com o Xmas Survey 2008, elaborado pela consultora Deloitte, metade dos portugueses vai gastar menos 4,8 por cento este Natal do que no ano passado. O esforço de contenção levou, aliás, já metade dos inquiridos a comprar os presentes de Natal nos saldos de Verão. Ao invés, cerca de 14 por cento afirma que irá esperar por Janeiro.

Com expectativas deterioradas sobre a evolução da economia e do seu poder de compra no próximo ano, os consumidores vão estar mais atentos às promoções. Um terço dos inquiridos no Xmas Survey admitiu que iria usar mais tempo a fazer comparações de preços e 70 por cento disse que vai aproveitar ao máximo as promoções. Nada mais simples. Afinal, desde o início do mês que elas estão aí. com Cláudia Lomba, Luísa Pinto e Raquel Almeida Correia