24.11.08

Centros alimentares representam ajuda preciosa em tempo de crise

in Diário de Coimbra

Chamam-se centros alimentares contra a pobreza, mas dão muito mais do que arroz ou leite. Com a crise instalada, são uma ajuda preciosa em Carregal do Sal e Santa Comba Dão para famílias com necessidades a vários níveis.

Pertencentes à Associação Mãos Unidas Padre Damião (Lisboa), os centros situados nos dois concelhos vizinhos do distrito de Viseu vivem do trabalho de voluntários, que têm como missão aproveitar o que sobra a uns para dar a outros.

O centro de Carregal do Sal foi o primeiro do país, tendo completado no início deste mês um ano de funcionamento. Seguiu-se o de Santa Comba Dão, em Janeiro deste ano, estando para breve a inauguração do de Leiria e, em preparação, a criação de outros no Porto, Bragança e Setúbal.

A coordenadora do centro de Carregal do Sal, Anabela Abrantes, está convencida de que a tendência será a proliferação destes espaços pelo país, onde há muita pobreza, por vezes escondida.

«Só quando abrimos este centro e vimos o número de pessoas que vieram ao nosso encontro é que nos apercebemos dos baixos rendimentos com que algumas famílias vivem, inclusivamente com filhos em idades escolar, idosos que têm reformas baixas e despesas mensais de farmácia», frisou.

O centro já apoiou mais de cem famílias. Apesar de os processos estarem todos organizados em pastas de cartão, o que impossibilita sustentar a sua afirmação com gráficos e estatísticas, Anabela não tem dúvidas: «o número de apoios tem vindo a crescer».

Os seus voluntários são procurados por vários tipos de famílias, umas mais jovens, cujos elementos «perderam o emprego ou tiveram de deixar de trabalhar por doença», outras oriundas de países de Leste ou desagregadas pelo divórcio. «Procuram de tudo, desde alimentos, vestuário, mobiliário a electrodomésticos. Também costumamos dar livros, brinquedos, de tudo um pouco», explicou, contando que muitas vezes os voluntários apenas oferecerem os seus ouvidos, porque há pessoas cuja única necessidade é serem escutadas.

Há também a preocupação de ensinar a viver dignamente, porque muitas vezes a pobreza «não é só material». Recordou o caso de um pai que vive sozinho com os filhos, a quem levaram alimentos e roupa de cama. «Passado algum tempo voltámos lá e verificámos que a roupa de cama ainda estava dobrada onde a tínhamos deixado e continuavam a dormir sobre os colchões, sem cobertores», lamentou.

Novo alento à vida

Mas há também casos, como o de Susana Oliveira, de 34 anos, mãe de três filhos, em que a ajuda prestada deu um novo alento à vida. Obrigada a separar-se do marido na sequência de maus-tratos, Susana saiu de casa com os filhos menores e a roupa no corpo, mas as rendas de casas mobiladas eram insuportáveis para quem vive de cerca de 300 euros do Rendimento Social de Inserção.

«Eu para ter uma casa tinha de ter mobílias, camas para deitar os meus filhos», sublinhou a mulher, que desde Julho vive numa casa totalmente mobilada com ofertas, conseguidas sobretudo devido ao esforço do padre José António Almeida, pároco em S. João de Areias (Santa Comba Dão) e Carregal do Sal, que é o responsável pelos dois centros alimentares.

No centro de Santa Comba Dão, instalado no edifício da escola primária do Rojão Grande, a prioridade é dada «aos casos de pobreza envergonhada», frisou a sua coordenadora, Eduarda Mota. «Aqueles que nada pedem são os que nos comovem mais. Acabamos por saber pelos outros que eles têm necessidades», contou, explicando que a grande preocupação é dar-lhes o que precisam sem que se sintam humilhados. Desde Janeiro, o centro apoiou 99 famílias, tendo mesmo conseguido, com 750 euros conseguidos através da venda de rifas, comprar uma prótese ocular para um homem cuja mulher está acamada e que tem um neto à sua responsabilidade.

Actualmente, um dos casos que mais preocupa os seus responsáveis é o de um jovem ucraniano de 19 anos que em Janeiro perdeu um braço numa fábrica e que, devido a problemas com a companhia de seguros, ainda não recebeu qualquer dinheiro.
«Temos tentado ajudá-lo. Já conseguimos arranjar-lhe uma advogada, mas gostávamos de poder fazer mais», disse Eduarda Mota.