5.10.08

Cada país tem de segurar os seus bancos

António Perez Metelo, in Diário de Notícias

Crise financeira. Sarkozy convidou a Paris os líderes dos outros três países do G7. Da reunião de três horas saíram as linhas gerais do que será a intervenção da Europa, a ser concretizada pelos ministros das Finanças no início da próxima semana

Minicimeira de Paris enuncia resposta à crise

A minicimeira financeira de Paris decidiu um conjunto de seis princípios orientadores para uma resposta europeia concertada à crise financeira.

Os quatro países presentes (Alemanha, França, Itália e Reino Unido), membros europeus do G7, comprometeram-se solenemente a apoiar as instituições financeiras da Europa, que se encontrem em dificuldades. Não foi considerada a possibilidade de um fundo comum de resgate, antes se apela a que cada país assuma as suas responsabilidades a nível nacional, sem prejudicar os interesses dos outros Estados membros.

Cada um dos membros deste G4 compromete-se, na eventualidade de apoiar um banco em dificuldade, a sancionar os dirigentes responsáveis pelo descalabro.

Por iniciativa do primeiro-ministro britânico a cimeira decidiu solicitar ao Banco Europeu de Investimento (BEI) a libertação de 31,5 mil milhões de euros para reforçar as PME, "pois a crise financeira já está a contaminar outros sectores económicos", afirmou Gordon Brown. A minicimeira apelou ainda à Comissão Europeia que desse provas de flexibilidade na aplicação das regras das ajudas de Estado às empresas, bem como nos princípios do Mercado Único.

Na apresentação das conclusões, Nicolas Sarkozy, Presidente da República Francesa, referiu que a aplicação do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) na Zona Euro deve reflectir as circunstâncias excepcionais do momento que todos estão a viver.

Finalmente, os líderes das quatro maiores economias europeias apelaram à realização de uma cimeira mundial, o mais cedo possível, para rever as regras do capitalismo financeiro. Essas novas regras devem aplicar-se não só à banca comercial, mas também às agências de notação financeira, aos bancos de investimentos e aos fundos especulativos. Os princípios normalizados de contabilidade deverão igualmente ser reanalisados.

À cimeira assistiram o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, o presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, e o presidente do Eurogrupo, o primeiro-ministro luxemburguês Jean-Claude Juncker. Este último alertou para que se aplique o PEC integralmente, opondo-se à violação das regras que o enformam.

A chanceler alemã, Angela Merckel, congratulou-se com os resultados do encontro, que "envia uma mensagem forte destinada a garantir a poupança dos cidadãos e a preservar a sua confiança no sistema financeiro". Mas afirmou não estar satisfeita com a garantia unilateral dada pelo governo irlandês aos seus bancos.

Garantias aos depósitos deverão aumentar

Manuel Esteves

UE. Concorrência desleal preocupa Bruxelas que está a preparar mexidas na legislação


O nível de garantia dos depósitos, que em Portugal é de 25 mil euros, pode vir a aumentar em breve. Esta é uma das medidas que está a ser ponderada pela Comissão Europeia, visando transmitir maior segurança aos depositantes e garantindo aquele que é o pilar de qualquer sistema bancário: a confiança. A este respeito, o presidente da Comissão, Durão Barroso, disse, na passada quarta-feira, que "temos de aumentar a consistência dos sistemas de garantia dos depósitos". Este assunto foi igualmente debatido na reunião de quinta-feira que juntou Barroso e o mais influente lobby banqueiro da Europa - a European Financial Round Table.

A preocupação é fácil de entender. Actualmente, a União Europeia apenas exige aos 27 Estados membros que cubram 90% dos depósitos até um máximo de 20 mil euros. Porém, estes são livres de definirem valores mais elevados e é isso que explica que o nível de protecção dos depositantes seja muito díspar consoante os países.

Por outro lado, a crise financeira mundial está a levar muitos países europeus a reverem, unilateralmente, as regras de protecção das contas bancárias, agravando ainda mais as discrepâncias entre Estados membros e gerando mesmo situações de concorrência desleal entre as várias instituições financeiras, sedeadas em diferentes países. A Irlanda - o caso mais mediatizado -, tal como a Grécia, tornou o plafond de cobertura ilimitado, provocando a ira dos bancos ingleses, que temem ver os seus clientes a transferir as suas poupanças para aquele país.

Em reacção, o governo britânico anunciou oficialmente na sexta-feira o alargamento do limite de garantia dos depósitos, das actuais 35 mil libras para as 50 mil libras (63,8 mil euros). Outros países estão a equacionar medidas semelhantes - é o caso de Espanha, onde o ministro das Finanças, Pedro Solbes já mostrou abertura para uma decisão deste género.

Em Portugal, o Ministério das Finanças remete para as negociações nas instâncias comunitárias. "É uma questão que vem sendo negociada desde a Presidência Portuguesa da União Europeia. Portugal está a discutir o assunto no plano europeu", disse ao DN fonte oficial das Finanças.

Crise financeira empurra clientes para a Caixa Geral de Depósitos

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) está a beneficiar, indirectamente, com a actual crise financeira e os crescentes receios dos clientes dos bancos face à sua solvabilidade. O DN apurou junto de diversas fontes da rede comercial da CGD que, nas últimas semanas, tem aumentado, de forma considerável, o número de pessoas que coloca ali as suas poupanças.

Sejam clientes que dispunham de contas e aplicações noutros bancos (para beneficiar de rentabilidades mais aliciantes do que as oferecidas pelo banco público) e que, perante a crise preferiram concentrar o seu dinheiro na Caixa; sejam clientes que mudaram mesmo de banco, o certo é que os balcões da CGD estão a receber mais visitas do que o habitual. A Caixa beneficia do estatuto de banco público que, nesta fase de particular instabilidade nos sistemas financeiros e bancários, transmite maior confiança aos aforradores.

Sinal da importância de ter o Estado como accionista é o facto da Caixa ter conseguido reforçar os seus capitais, recebendo, em dois meses, quase 800 milhões de euros, primeiro através de um aumento de capital e, mais recentemente, da venda de participações a uma empresa pública.

Confrontada com aquela informação, fonte oficial preferiu não comentar o assunto. A CGD desvaloriza esta questão e prefere sublinhar a solidez do sistema financeiro nacional. "O sistema financeiro português, como tem vindo a ser afirmado pelas autoridades nacionais e internacionais, e pelos próprios bancos, permanece estável. Desde o princípio do ano que os depósitos na Caixa têm vindo a crescer a um ritmo muito semelhante", disse ao DN fonte próxima da administração.

O Governo e as autoridades supervisoras (tal como acontece noutros países) têm insistido na robustez do sistema português, lembrando que a banca nacional cumpre todos os rácios prudenciais. Porém, o Fundo Monetário Internacional (FMI), no seu relatório anual sobre a economia portuguesa, divulgado ontem, mostra-se mais cauteloso, alertando para a possibilidade do crédito malparado das empresas vir a "quase triplicar" em virtude da crise financeira e do forte abrandamento económico. com PAULA CORDEIRO