Ana Cristina Pereira, in Jornal Público
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras desmente. Desde a entrada em vigor da nova lei,
em Novembro de 2007, foram emitidas cerca de 15 mil autorizações de residência
Ronaldo não queria acreditar. Levou o antigo e o actual contrato de trabalho e a funcionária do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) notificou-o para abandonar o país no prazo de 20 dias. A notificação diz que ele não fez prova de possuir um contrato de trabalho e tem carimbada a assinatura do director nacional do SEF, Manuel Jarmela Palos. Este é apenas um dos exemplos que Manuel Solla, da Comissão Nacional para a Legalização de Imigrantes (CNLI), quis ontem mostrar para denunciar uma suposta "prática do SEF": o estrangeiro requer um visto de residência para o exercício de uma actividade profissional, "é chamado para a entrevista; o funcionário diz-lhe que espere e vai buscar a notificação" de abandono voluntário do território nacional.
"Às vezes nem há entrevista!", acusa Solla, alegando ter lidado nos últimos meses com "centenas e centenas" de casos baseados no argumento de que os candidatos não tinham contrato de trabalho ou meios de subsistência. "Isto é uma perfeita ilegalidade, fere o espírito da alteração legislativa" de Julho de 2007.
Timótio Macedo, da Associação Solidariedade Imigrante, que lida "com milhares de casos", corrobora: "Há poder discricionário de quem atende e má-fé em relação a quem é atendido. Se a pessoa se dirige à administração pública para se legalizar e falta alguma coisa deve ser notificada, mas o que está a acontecer é que o SEF está de imediato a notificar para abandonar o país."
Há casos caricatos. Como o de Ronaldo, em Portugal há um ano e três meses. Quem fez a candidatura pela Internet foi a contabilista da empresa de construção onde ele trabalhava. Quando mudou para um restaurante, o brasileiro tentou alterar a informação. A contabilista esquecera a senha. Ronaldo ligou ao SEF: "Disseram-me para não me preocupar, para levar os dois contratos, que não haveria problema." E afinal, a 26 de Setembro, no balcão da Loja do Cidadão, no Porto, recebeu aquela ordem. Ficou tão nervoso que assinou sem ler.
O inspector César Inácio, porta-voz do SEF, recusa acusações feitas de forma generalizada. Pede às associações para apresentarem situações concretas para as quais será encontrada "uma explicação lógica". Havendo casos estranhos, como lhe parece ser o de Ronaldo, haverá correcções.
"Gravíssimo", na opinião de Solla, "é as pessoas seres notificadas com uma cópia de assinatura do director nacional". "Isto não é inocente", enfatiza, acusando o SEF de barrar um processo de legalização decidido pelos políticos. O inspector decide e o estrangeiro não pode recorrer ao director distrital ou nacional.
Sobre o carimbo com a assinatura do director nacional, César Inácio salienta que "o SEF tem interesse em que os processos não se arrastem". Com a assinatura de Jarmela Palos, "a notificação produz efeitos imediatos". Certo que "não é passível de recurso hierárquico, mas a pessoa pode recorrer ao titular [o secretário de Estado adjunto da Administração Interna] ou ao Tribunal Administrativo". Ronaldo já reclamou.
Desde que a nova lei entrou em vigor, em Novembro de 2007, foram emitidas cerca de 15 mil autorizações de residência. Desde 30 de Julho até ontem, o SEF emitiu 3836 pareceres negativos e 3675 pareceres positivos. Remeteu à Casa Nacional da Moeda 4484 pedidos de emissão e foram emitidos 3301. Estes números, no entender do inspector, constituem um sinal de que o processo está a correr bem. Gustavo Behr, presidente da Casa do Brasil, aconselha os interessados a recorrerem aos centros de apoio ao imigrante e às associações. Nessas estruturas encontrarão quem analise o seu processo no sentido de verificar se a pessoa preenche ou não todos os requisitos legais.